Desculpem pelos typos, escrevi *no corre*, como hoje se diz.

Aproveito esse P.S. para deixar aqui o link com a descrição de uma das
ações feministas que estão sendo levadas a cabo em meu departamento. A
postagem esclarece o que quero dizer com "hidra da misoginia" e "geração
pós-levante feminista no Brasil":
https://wordpress.com/view/didaticofilosoficas.wordpress.com

Há braços,
G.

Le mar. 22 oct. 2019 à 12:01, Gisele Secco <secco.gis...@gmail.com> a
écrit :

> Prezados colegas, prezada Luiza
>
> Permanecia em silêncio nesta trend semi-OFF-Topic até o momento, mas como
> agora pude ler o texto da Professora Barbosa, creio que posso dizer alguma
> coisa.
>
> Primeiro creio que boa pate da discussão aqui está pautada pelo julgamento
> (como adequado ou inadequado) de uma expressão utilizada no título do texto
> (de mau gosto para alguns), e significada ao longo do mesmo (tendo,
> portanto, algum potencial feminista - por forçada inversão semânticaetc.). 
> *Nota
> bene*: feminismo aqui sendo usado no sentido amplíssimo e
> intereseccional, de designador da advocacia por direitos iguais para todos,
> independentemente de sexo, gênero, cor da pele, etnia, classe social.
>
> Creio, ademais, que avaliações justas dos méritos do texto da Professora
> Barbosa devem atentar a uma miríade de fatores: para o meio no qual ele
> está publicado (McLuhan ainda nos serve "o meio é a mensagem"!), e por
> conseguinte ao público amplo ao qual se direciona; para as intenções que o
> texto, dado seu contexto de publicacão, possui; para seu conteúdo, as
> informações que veicula. Digo isso porque na sua avaliação, escrita desde
> uma perspectiva mais especializada em assuntos de feminismo, o texto faz
> "uma apropriação da opressão sofrida por Marie Curie para uma pauta
> superficial e rasteira do feminismo suave do nosso tempo."
>
> Ora, se considerarmos plausíveis os critérios que ofereci acima, não
> parece razoável avaliar o texto como rasteiro, pois a eventual
> superficialidade da abordagem tem relação direta com o contexto de
> publicação. De outra parte, talvez a autora não tenha optado por uma
> postura mais radical, e sim "suave", tendo em vista justamente o público
> que visava. Ou esse seja seu estilo, seu feminismo não-radical. Por fim,
> ela não veicula nenhuma falsidade sobre as opressões vividas por Curie.
>
> Desse modo - e desde minha perspectiva, a de alguém que não é especialista
> em teorias feministas, mas se considera uma feminista em form-ação
> (especialmente dentro da academia, na lida diária com e como intermediária
>  entre estudantes da geração pós-levante feminista e colegas pouco
> familiarizados com esta geração, dentro e fora do Brasil) - vejo que o
> texto não faz mau uso do caso da Curie, em especial usando o "lugar comum
> da vitimização e redução do discurso à uma ideologia particular." (Não
> entendo o que seria essa ideologia particular, a propósito. O feminismo
> soft?). Muitas vezes as pessoas (em geral homens) precisam mesmo dessas
> descrições, ouvir casos concretos de opressão (históricas, como o caso do
> texto, ou cotidianas, como as que escuto de minhas alunas diariamente),
> para começar a se dar conta da hidra da misoginia. E muitas vezes as
> pessoas (em geral mulheres) precisam saber que as opressões que sofrem
> cotidianamente jea foram sofridas mesmo pelas grandes figuras da ciência,
> da lógica, da filosofia, das artes, para inspirar-se nelas, entender-se com
> elas em suas histórias pessoais.
>
> Por fim, gostaria de observar que ações e discursos não são coisas
> desligadas umas das outras. Certamente se pode acusar pessoas de "só
> falarem e não fazerem", mas se lembrarmos do adágio austiniano de acordo
> com o qual em muitos casos (em todos?) dizer também é fazer, o texto que
> estamos há dias saudavelmente discutindo aqui é uma sorte de ato
> performativo que se soma aos movimentos feministas, e não o contrário. Que
> ele não seja tão radical quanto se pode desejar, desde perspectivas
> feministas distintas, não desintegra seu valor e tampouco faz justica à
> comparação que você deixa sugeria entre ele e campanhas mercadológicas de
> absorção das peutas feministas para vender camisetas.
>
> Um abraço cordial,
> G.
>
> Le mar. 22 oct. 2019 à 11:16, Luiza Ramos <luizaspra...@gmail.com> a
> écrit :
>
>> Boa tarde,
>>
>> Acompanhei o debate sem me pronunciar pois de fato acho que parecia pouco
>> profícuo levantar a questão nesse ambiente, no entanto como muitos homens
>> se pronunciaram aqui sobre a questão da mulher e sobre o feminismo acredito
>> que posso contribuir um pouco nesse aspecto.
>>
>> Sobre a ressignificação dos termos vagabunda e vadia e sobre a marcha das
>> vadias, convém esclarecer que estas são propostas de grupos que se dizem
>> feminista mas que estão muito distante das teorias feministas. Como
>> apontado muitas vezes por estas, a marcha das vadias representa um tipo de
>> mulher que tem autonomia sobre seu corpo e isto não é o caso de grande
>> parte das mulheres que sofrem violência sexual e doméstica. Este tipo de
>> pauta pode acabar reforçando a opressão de grupos de mulheres não-brancas e
>> não-elitizadas uma que ao pregar  liberdade sexual acaba por contribuir
>> ainda mais para a sexualização do corpo feminino. Por exemplo, este tipo de
>> discurso raso pode contribuir para jovens meninas se submeterem a dominação
>> sexual masculina confundindo-a com liberdade. Ainda, tais palavras fazem
>> parte de um vocabulário colonialista e patriarcal que, na opinião de
>> feministas sérias como Grada Kilomba, deve sim ser condenado e esvaziado de
>> importância. Conservadorismo, nesse caso, me parece perpetuar tal
>> vocabulário.
>>
>> Finalmente, esse tipo de questão nada tem a ver com o problema de
>> desumanização sofrido pelas mulheres cientistas ao longo do tempo,
>> incluindo Marie Curie, que como disse o professor Walter não se interessou
>> em qualificar-se como vagabunda em nenhum momento mas sim ocupou-se de
>> contribuir para o avanço cientifico e se colocou como modelo para futuras
>> cientistas. Esse tipo de contribuição parece muito mais efetivo que
>> qualquer discurso panfletário e sensacionalista, assim, entrando no mérito
>> do texto, como pesquisadora e feminista que me considero, acredito que o
>> texto é ruim nesta perspectiva. O que há ali é uma apropriação da opressão
>> sofrida por Marie Curie para uma pauta superficial e rasteira do feminismo
>> suave do nosso tempo. Tal feminismo suave nada contribui para as discussões
>> relevantes que precisam ser tratadas e reforçam o tipo de discurso raso ( a
>> palavra machista aparece quatro vezes no texto) que vemos hoje explorado
>> pela grande mídia e marcas, quando encontramos camisetas de marcas que
>> exploram trabalho escravo utilizando esses chavões. O texto não funciona
>> como divulgação científica pois não aborda nada efetivo do trabalho de
>> Marie e também não funciona combatendo opressões, pois está no lugar comum
>> da vitimização e redução do discurso à uma ideologia particular. Conheci
>> pessoalmente a autora quando veio à Brasília dar uma palestra sobre
>> Mulheres na Ciência e já na época fiquei decepcionada com a
>> superficialidade da palestra e da falta de interesse da mesma em conversar
>> com as estudantes ali presente. Muitas mulheres tem contribuido para a
>> inclusão de outras mulheres no meio científico mas o fazem com mudanças
>> locais e ações ao invés de discursos.
>>
>> Atenciosamente,
>> Luiza Ramos
>>
>> Em seg, 21 de out de 2019 às 15:23, Abílio <abilio.rodrig...@gmail.com>
>> escreveu:
>>
>>> Colegas,
>>>
>>> Estou chegando atrasado na conversa.
>>> Entendo que o titulo possa ser desconfortavel para algumas pessoas.
>>> Pra mim nao é nem um pouco.
>>>
>>> Mas o txt é otimo e muitissimo oportuno nos tempos da burrice e
>>> cretinice que grassam no nosso pobre pais.
>>> Sim, hoje, no Brasil, vagabunda - assim como viado, esquerdopata,
>>> comunista etc. - tornaram-se elogios.
>>>
>>> Abraços
>>>
>>> Abilio
>>>
>>> On Sun, 20 Oct 2019 at 23:50, Joao Marcos <botoc...@gmail.com> wrote:
>>> >
>>> > Poderíamos talvez defender que o estudo da argumentação, e de certa
>>> > forma também a interpretação de textos, caem sob os tópicos de
>>> > interesse desta lista.
>>> >
>>> >
>>> > [[
>>> > Dou por aceito que não precisamos defender Marie Curie.  Albert
>>> > Einstein disse o que havia a dizer, em uma carta que enviou a ela em
>>> > 23 de novembro de 1911, logo depois de Curie retornar da Suécia com
>>> > seu segundo prêmio Nobel para encontrar seu nome denegrido pela
>>> > imprensa e sua casa apedrejada pela furiosa turba de conservadores de
>>> > extrema-direita:
>>> >
>>> > "If the rabble continues to occupy itself with you, then simply don’t
>>> > read that hogwash, but rather leave it to the reptile for whom it has
>>> > been fabricated."
>>> > https://einsteinpapers.press.princeton.edu/vol8-trans/34
>>> > ]]
>>> >
>>> >
>>> > O que eu observei até agora, no debate nesta lista sobre o texto da
>>> > física Marcia Barbosa, foi:
>>> >
>>> > (1) A menção a um texto de uma cientista relatando um bem conhecido
>>> > caso de misoginia na ciência.  O texto foi desqualificado antes mesmo
>>> > de ser lido devido ao uso do termo "vagabunda" no título.
>>> > Aparentemente o objetivo principal daquela menção foi o emprestar
>>> > força adicional à desqualificação de outro texto ---absolutamente
>>> > desastroso--- publicado no mesmo blog, escrito por outro autor, sobre
>>> > um tema completamente diverso.
>>> >
>>> > (2) O texto já citado, que diz respeito ao empoderamento feminino, foi
>>> > acusado, das formas mais variadas, de "MAU gosto".  Um dos motivos
>>> > principais, mais uma vez, parece ter sido o uso ---essencial--- da
>>> > palavra "vagabunda".  Os outros motivos apontados são um pouco mais
>>> > difusos, e mais ou menos "criativos".
>>> >
>>> > (3) Supostamente haveria no dito texto uma proposta de ressignificação
>>> > semântica pela qual "vagabunda" passaria a ser um elogio.
>>> >
>>> > Não tenho o que dizer sobre o ponto (1), e já disse o que tinha para
>>> > dizer sobre o ponto (2).  Eu próprio não teria hesitado em escrever um
>>> > texto com esta palavra no título, fosse ela essencial ao conteúdo.
>>> > Quanto ao ponto (3), se houvesse uma real tentativa de
>>> > *ressignificação* das expressões "vagabundas" e "vadias", como
>>> > aconteceu por exemplo com os termos "gay" e "queer", então seria de se
>>> > supor que as mulheres hoje _desejassem_ ser tratadas por "vagabundas"
>>> > ou "vadias".  Não me parece que seja o caso ---ou pelo menos não
>>> > ainda, pois a linguagem tem sua dinâmica.  Resta-me, assim, a opção da
>>> > *ironia* (ou, no mínimo, da estratégia de chamar a atenção pela via da
>>> > *polêmica*), que afinal me parece ter sido bem praticada pela autora
>>> > do texto.
>>> >
>>> >
>>> > [[
>>> > Sobre a apropriação por parte das mulheres dos termos opressores _para
>>> > tentar revalorizá-los_ (como no mote "se ser livre é ser vadia, então
>>> > somos todas vadias") encontrei um texto recente interessante, escrito
>>> > da perspectiva da Análise Dialógica do Discurso [Bakhtin]:
>>> >
>>> http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2019000200209
>>> > Como disse um colega, portanto, pode haver, também neste ponto,
>>> > "espaço interessante para reflexão".
>>> > ]]
>>> >
>>> >
>>> > Ainda sobre as mensagens anteriores dos colegas:
>>> >
>>> > > Talvez ela não saiba das histórias  das"jovens polacas". Se sabe, é
>>> pior ainda.
>>> > > É  de todo modo uma referência infeliz, que me faz não gostar da
>>> notinha.
>>> >
>>> > As "jovens polacas" jamais foram referidas no texto.  Parece de todo
>>> > modo irrelevante saber se a autora do texto conhece a expressão, ou
>>> > mesmo se Marie Curie teria sido assim chamada no Brasil, como sem
>>> > dúvida teriam feito naquela época os tabloides franceses.
>>> >
>>> >
>>> > [[
>>> > Um dos _menos_ virulentos ataques a Marie Curie foi publicado no Le
>>> > Figaro (o jornal diário mais antigo da França), em 26 de novembro de
>>> > 1910:
>>> > "Nous avons déjà plus de femmes de lettres qu’un pays civilisé ne peut
>>> > supporter. Que les dieux favorables nous épargnent une génération de
>>> > femmes de science!"
>>> > https://polonia.histegeo.org/Curie_Academie.swf (p.7)
>>> >
>>> > A propósito, esta é a realidade que aponta modernamente o mesmo jornal
>>> > (conservador e de direita):
>>> >
>>> http://madame.lefigaro.fr/societe/les-europeens-estiment-que-la-science-a-haut-niveau-nest-pas-faite-pour-les-femmes-160915
>>> > (curiosamente, enquanto o artigo de 1910 deplora a possibilidade de
>>> > prêmios científicos concedidos por "júris femininos", o artigo de 2015
>>> > diz respeito a uma sondagem promovida pela fundação L'Oréal, que hoje
>>> > patrocina tais prêmios)
>>> > ]]
>>> >
>>> >
>>> > > não tem essa de politicamente ressignificar o preconceito que fez
>>> uma vítima ilustre
>>> >
>>> > O _preconceito_ certamente não foi ressignificado pela autora do
>>> > texto.  Quando muito poderíamos dizer que a palavra que expressa esse
>>> > preconceito foi usada como uma provocação.  E, claramente, a
>>> > provocação funcionou.
>>> >
>>> > Abraçxs,
>>> > Joao Marcos
>>> >
>>> >
>>> > [[
>>> > Como disse o filósofo da linguagem Humpty Dumpty, citado também no
>>> > artigo feminista cujo link se encontra acima, e grande influência de
>>> > Ludwig Wittgenstein:
>>> >
>>> > 'When I use a word,' Humpty Dumpty said in rather a scornful tone, 'it
>>> > means just what I choose it to mean — neither more nor less.'
>>> > 'The question is,' said Alice, 'whether you can make words mean so
>>> > many different things.' '
>>> > The question is,' said Humpty Dumpty, 'which is to be master — that's
>>> all.'
>>> > ]]
>>> >
>>> >
>>> > PS: Walter, tendo em vista que você era amigo pessoal da Hilda Hilst,
>>> > surpreende-me sobremaneira que você agora assuma esta postura
>>> > "linguística" conservadora...
>>> >
>>> > --
>>> > Você está recebendo esta mensagem porque se inscreveu no grupo
>>> "LOGICA-L" dos Grupos do Google.
>>> > Para cancelar inscrição nesse grupo e parar de receber e-mails dele,
>>> envie um e-mail para logica-l+unsubscr...@dimap.ufrn.br.
>>> > Para ver esta discussão na web, acesse
>>> https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/CAO6j_LgcjMEs4GtbvpsratVtU88BFUv2or%3DX%3DCQzumyON1fVgw%40mail.gmail.com
>>> .
>>>
>>> --
>>> Você está recebendo esta mensagem porque se inscreveu no grupo
>>> "LOGICA-L" dos Grupos do Google.
>>> Para cancelar inscrição nesse grupo e parar de receber e-mails dele,
>>> envie um e-mail para logica-l+unsubscr...@dimap.ufrn.br.
>>> Para ver esta discussão na web, acesse
>>> https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/CALtFD21KGVO_PFhHZVB3ZgBxr6mY4uJheGcHuUm7Xt3OftqqAw%40mail.gmail.com
>>> .
>>>
>> --
>> Você recebeu essa mensagem porque está inscrito no grupo "LOGICA-L" dos
>> Grupos do Google.
>> Para cancelar inscrição nesse grupo e parar de receber e-mails dele,
>> envie um e-mail para logica-l+unsubscr...@dimap.ufrn.br.
>> Para ver essa discussão na Web, acesse
>> https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/CABp6FzLkvdEcdQizphGLJ7ybuKk4wh1w8Fy5O1hP70hd5on3hA%40mail.gmail.com
>> <https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/CABp6FzLkvdEcdQizphGLJ7ybuKk4wh1w8Fy5O1hP70hd5on3hA%40mail.gmail.com?utm_medium=email&utm_source=footer>
>> .
>>
>
>
> --
> Gisele Dalva Secco
> UFSM/Brasil
> +55 55 3220 8440
>


-- 
Gisele Dalva Secco
UFSM/Brasil
+55 55 3220 8440

-- 
Você está recebendo esta mensagem porque se inscreveu no grupo "LOGICA-L" dos 
Grupos do Google.
Para cancelar inscrição nesse grupo e parar de receber e-mails dele, envie um 
e-mail para logica-l+unsubscr...@dimap.ufrn.br.
Para ver esta discussão na web, acesse 
https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/CADjHNnoUwPzvWHp%3DQgXbR5qShn7U2vQ%3DvhJEd8qKrPned6iKLg%40mail.gmail.com.

Responder a