Fiquei pensando no porquê do abandono do latim na Filosofia da Idade
Moderna. O latim tinha muitas das vantagens citadas por Júlio e pelos
autores do texto. Era uma língua franca no Ocidente . Tinha uma tradição
literária: Cícero, Tácito, Suetônio, Salústio, Tito-Lívio, os poetas
Virgílio e Horácio etc. Além disso, a filosofia da Baixa Idade Média não
era muito diferente do que conhecemos hoje como filosofia analítica. A
teoria das propriedades dos termos estudava coisas como a referência e a
quantificação. Contrariamente ao que se diz não era uma língua morta
porque se usava nas universidades. Por que foi deixada de lado? Houve
razões sociais e políticas. Afinal o latim era a língua da Igreja católica
e com a Reforma a posição dessa instituição no Ocidente ficou contestada.
Mas houve também  outro tipo de razões. Em seu texto, Consultatio de
naturae cognitione, Leibniz disse que o uso do latim obrigava as pessoas
que não dominavam suficientemente essa língua a fazer grandes esforços para
se expressar e que isso as distraía do principal, a saber, a exposição do
assunto que tratavam. Mas Leibniz queria ser conhecido e reconhecido fora
da Alemanha e por isso escreveu em latim e em francês, mesmo que advogasse
pelo uso do alemão.  E assim foi na Alemanha até que um professor de um
canto da Alemanha escreveu , em alemão, e não em latim como era usual, a
obra filosófica mais importante do século XVIII: a crítica da razão pura.
Poderia Kant tê-la escrito em latim? O latim tinha problemas de
expressividade. Não têm artigos definidos, o que dificulta o reconhecimento
da função referencial da linguagem. No lugar do pronome pessoal de terceira
pessoa prefere usar um demonstrativo, às vezes, acompanhado de uma
descrição. É provável que o uso do latim se tornasse  uma camisa de força
para a expressão do pensamento, apesar da sutileza dos escolásticos. De
fato, gradativamente foi abandonado. Já, na Inglaterra, após Bacon, deixou
de ser usado como língua filosófica. Hobbes e Locke escreveram em inglês.
Na França, Descartes escreveu o Discurso do método em francês e Malebranche
todas as obras nessa língua.  Onde continuou-se usando o latim foi nas
ciências exatas e naturais, até bem entrado o século XIX. Agora vou ao
principal: qual é a vantagem para nós de usar o inglês como língua
filosófica?. Para a promoção pessoal, para nossa carreira nem se discute.
Mas se vamos além de nossos interesses imediatos, cabe perguntar se para
expressão do pensamento filosófico na América latina é uma boa ideia
adotar  uma língua que não é a nossa e que, como toda língua, vai a
enviesar nosso pensamento.  Haveria que pesquisar quantos desses problemas
discutidos nas teorias medievais da propriedade dos termos e que aos
contemporâneos pareciam abstrusos não decorriam do enviesamento dado pelo
uso do latim. São perguntas que faço para as quais não tenho resposta.
Finalmente, em passant, nós temos , na América Latina, no século XX, uma
literatura que não fica atrás de nenhuma das outras grandes literaturas
ocidentais. Isso aconteceu quando deixamos de imitar os modelos europeus e
resolver fazer outra coisa. Não sei porque não tentamos fazer o mesmo em
Filosofia,
Jorge Alberto Molina


Jorge Alberto Molina

Em sáb., 18 de set. de 2021 às 17:19, jean-yves beziau <
jyb.logic...@gmail.com> escreveu:

> Certo Cassiano, mas anota que toda filosofia escrita em inglês não é
> necessariamente analítica (Cf. Peirce, Thoreau, etc) e vice-versa: há
> filosofia analítica por exemplo em português ...
>
> On Sat, Sep 18, 2021 at 11:59 AM Cassiano Terra Rodrigues <
> cassiano.te...@gmail.com> wrote:
>
>> Camaradas, proposta interessante, vou divulgar.
>> Ainda está por ser feito um trabalho relacionando em q medida
>> neoliberalismo e filosofia analítica estão em profunda comunhão ideológica.
>> Não digo q não existam filósofos analíticos socialistas ou coisa q o
>> valha. Mas isso não basta, como já mostrou o velho Lukács.
>> Um abraço,
>> cass.
>> On Saturday, September 18, 2021 at 5:01:56 AM UTC-3 jmstern wrote:
>>
>>> Caros Redistas:
>>> O texto referido aborda uma questao (na minha opiniao) muito importante.
>>> Sempre advoquei pelo uso de Ingles como "lingua franca" de nossa era.
>>> Nao acreito na viabilidade ou conveniencia de linguas artificias, como
>>> Esperanto, Ido ou Novolat (que o Walter gosta).
>>> Acho importante o uso de uma lingua natural, com a existencia de um
>>> corpus literario de peso, que "ancore" o uso da lingua franca.
>>> Implicito, esta o fato que a lingua franca eh utilizada como "lingua
>>> operacional" por falantes nao-nativos.
>>> Este "uso operacional" presupoe corretude gramatical e adequacao
>>> semantica, de modo a produzir textos legiveis e fluidos.
>>> Todavia, este uso operacional da lingua Nao deveria impor padroes
>>> estilisticos e virtuosismos literarios mais alem do requerido para uma
>>> comunicacaco clara das ideias (Filosoficas, Logicas, Matematicas,
>>> Cientificas, etc.) subjacentes.
>>> Caso contrario, as vantagens de utilizar uma lingua franca ficam
>>> seriamente comprometidas, e vieses injustos sao introduzidos no processo.
>>> Achei muito boa esta declaracao.
>>> Eu nunca tinha visto este asunto tao claramente explicitado.
>>> Claro que eh preciso nao exagerar, demandando a aceitacao de textos em
>>> Ingles macarronico.
>>> Este eh um assunto que, na minha opiniao, merece atencao, principalmente
>>> na area de Filosofia.
>>> (em ciencias exatas, no eh habitual fazer exigencias estilisticas
>>> indevidas sobre um texto tecnico)
>>>  Abraco e tudo de bom,
>>> ---Julio Stern
>>>
>>>
>>>
>>> ------------------------------
>>> *From:* logi...@dimap.ufrn.br <logi...@dimap.ufrn.br> on behalf of
>>> jean-yves beziau <jyb.lo...@gmail.com>
>>> *Sent:* Friday, September 17, 2021 11:55 PM
>>> *To:* Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área
>>> de LOGICA <logi...@dimap.ufrn.br>
>>> *Subject:* [Logica-l] [OUF] BARCELONA PRINCIPLES FOR A GLOBALLY
>>> INCLUSIVE PHILOSOPHY
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