DROGAS
Tudo começou quando eu tinha uns 14 anos e um amigo chegou com aquele papo de "experimenta, depois, quando você quiser, é só parar..." e eu fui na dele. Primeiro ele me ofereceu coisa leve, disse que era de "raiz da terra", que não fazia mal, e me deu um inofensivo disco do "Chitãozinho e Xororó" e em seguida um do "Leandro e Leonardo". Achei legal, coisa bem brasileira; mas a parada foi ficando mais pesada, o consumo cada vez mais freqüente, comecei a chamar todo mundo de "Amigo" e acabei comprando pela primeira vez. Lembro que cheguei na loja e pedi: - Me dá um CD do Zezé de Camargo e Luciano. Era o princípio de tudo! Logo resolvi experimentar algo diferente e ele me ofereceu um CD de Axé. Ele dizia que era para relaxar;
sabe, coisa leve... "Banda Eva", "Cheiro de Amor", "Netinho",
etc.
Com o tempo, meu amigo foi oferecendo coisas piores: "É o Tchan", "Companhia do Pagode", "Asa de Águia" e muito mais. Após o uso contínuo eu já não queria mais saber de coisas leves, eu queria algo mais pesado, mais desafiador, que me fizesse mexer a bunda como eu nunca havia mexido antes, então, meu "amigo" me deu o que eu queria, um Cd do "Harmonia do Samba", daquela bichinha que anda descalça e adora oferecer a bundinha para a plateia. Minha bunda passou a ser o centro da minha vida, minha razão de existir. Eu pensava por ela, respirava por ela, vivia por ela! Mas, depois de
muito tempo de consumo, a droga perde efeito, e você começa a querer cada vez
mais, mais, mais . . .
Comecei a
freqüentar o submundo e correr atrás das paradas.
Foi a partir daí que começou a minha decadência. Fui ao show de encontro dos
grupos "Karametade" e "Só pra
Contrariar", e até comprei a Revista Caras que tinha o "Rodriguinho" na capa.
Quando dei por mim, já estava com
o cabelo pintado de loiro, minha mão tinha crescido muito em função do pandeiro,
meus polegares já não se mexiam por eu passar o tempo todo fazendo sinais de
positivo.
Não deu outra: entrei para um
grupo de Pagode.
Enquanto vários outros viciados
cantavam uma "música" que não dizia nada, eu e mais 12 infelizes dançavamos
alguns passinhos ensaiados, sorriamos e fazíamos sinais combinados.
Lembro-me de um dia quando entrei
nas lojas Americanas e pedi a coletânea "As Melhores do
Molejão". Foi terrível!! Eu já não pensava
mais!!
Meu senso crítico havia sido dissolvido pelas rimas "miseráveis" e letras pouco arrojadas. Meu cérebro estava travado, não pensava em mais nada.
Mas a fase negra ainda estava por vir. Cheguei ao
fundo do poço, no limiar da condição humana, quando comecei a escutar "Popozudas", "Bondes", "Tigrões", "Motinhas" e "Tapinhas".
Comecei a ter delírios, a dizer coisas sem sentido.
Quando saia a noite para as festas pedia tapas na cara e fazia gestos
obscenos.
Fui cercado por outros drogados, usuários das drogas mais estranhas; uns nobres queriam me mostrar o "caminho das pedras", outros extremistas preferiam o "caminho dos templos". Minha fraqueza era tanta que estive próximo de
sucumbir aos radicais e ser dominado pela droga mais
poderosa do mercado: a droga limpa.
Hoje estou internado em uma
clínica.
Meus verdadeiros amigos fizeram a
única coisa que poderiam ter feito por mim.
Meu tratamento está sendo muito
duro: doses cavalares de Rock, MPB, Progressivo e Blues.
Mas o meu médico falou que é
possível que tenham que recorrer ao Jazz e até mesmo
a Mozart e Bach.
Queria aproveitar a oportunidade
e aconselhar as pessoas a não se entregarem a esse tipo de droga.
Os traficantes só pensam no
dinheiro.
Eles não se preocupam com a sua
saúde, por isso tapam sua visão para as coisas boas e te oferecem essas drogas.
Se você não reagir, vai
acabar drogado, alienado, inculto, manobrável, consumível, descartável e
distante;
Vai perder as referências e
definhar mentalmente.
Em vez de encher a cabeça com
porcaria, pratique esportes e, na dúvida, se não puder distinguir o que é droga
ou não, faça o seguinte:
- Não ligue a TV no Domingo a tarde; - Não escute nada que venha de Goiânia ou do Interior de São Paulo; - Não entre em carros com adesivos "Fui ... "
- Se te oferecerem um CD, procure saber se o suspeito foi ao programa da Hebe ou se apareceu no Sabadão do Gugu;
- Mulheres gritando histericamente é outro indício; - Não compre nenhum CD que tenha mais de 6 pessoas na capa; - Não vá a shows em que os suspeitos façam gestos ensaiados; - Não compre nenhum CD que a capa tenha nuvens ao fundo; - Não compre qualquer CD que tenha vendido mais de 1 milhão de cópias no Brasil; - Não escute nada que o autor não consiga uma concordância
verbal mínima.
Mas,
principalmente, duvide de tudo e de todos.
A vida é bela! Eu
sei que você consegue! Diga não às drogas !
Luiz Fernando Veríssimo
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