O Alexandre Oliva manifestou o desejo eu direcionasse esta mensagem
que mandei para ele em PVT para a lista para que ele respondesse e sua
resposta ficasse disponível para todos.

Eu tinha mandado em PVT porque achava que nesta discussão estava ele
de um lado e muitos do outro lado, e talvez ele achasse, por causa do
conteúdo da mensagem que eu estivesse dando alguma lição de alguma
coisa.

Até onde eu entendi a discussão estava presa em detalhes, conceitos de
palavras ou estender um bom costume para que valesse ou não como lei.

Eu mesmo não conheço o tema profundamente, então resolvi usar as
palavras de buda que até onde eu sei é a autoridade no assunto do que
causa e o que não causa sofrimento. Talvez citar buda na lista não
fosse entendido pela maioria, no mínimo seria uma argumentação
estranha para a essa maioria.

Como o Alexandre é um membro importante da comunidade, e a sua opinião
influencia bastante, achei que faria grande efeito que eu direcionasse
uma mensagem para ele, e não vi necessidade de aborrecer os outros com
alguns conceitos sobre a origem do sofrimento que levam anos para se
entender corretamente, então foi PVT mesmo.

Agora como o Alexandre manifestou o desejo que a sua resposta seja
pública (eu mesmo não esperava uma resposta) então entendo que ele tem
algo para a lista em sua resposta, então vamos esperar sua resposta.

Então lá vái.

---------- Forwarded message ----------
From: Glauber Machado Rodrigues (Ananda) <[EMAIL PROTECTED]>
Date: May 16, 2007 10:43 PM
Subject: Re: [PSL-Brasil] [OT] Funcionários do Google não podem dizer
nome da empresa em público
To: Alexandre Oliva <[EMAIL PROTECTED]>


Opa, que bom que você respondeu.

Olha só, quando escrevo para essa lista, assumo que:
- as pessoas vão perdoar meus erros de portugues - falta de revisão, etc
- as pessoas vão entender que não se trata de nenhum artigo completo
sobre o assunto - senão seria tratado em outro lugar, não aqui na
lista.
- as pessoas podem não entender exatamente o que eu quiz dizer - falta
de didática de uma conversa escrita.
- o assunto em questão pode ser muito maior do que é possível falar
sobre ele - é preciso deixar algumas coisas sem falar mesmo, e esperar
que os outros entendam aquilo.
- as pessoas vão ler enquanto estão fazendo outra coisa, acabaram de
abrir o e-mail para resolver um assunto e resolveram checar os outros
e-mais - então nem tudo será lido com tanta dedicação.

Eu mesmo acho difícil entender uma coisa que eu escrevi depois de um
tempo. Então vou tentar ser mais didático.

Sendo assim, vamos lá.

On 5/15/07, Alexandre Oliva <[EMAIL PROTECTED]> wrote:
On May 12, 2007, "Glauber Machado Rodrigues (Ananda)" <[EMAIL PROTECTED]> wrote:

> Levada por este entendimento, a pessoa entra numa corrente que a
> levará para fora da ignorância. Dessa maneira, é correto forçar uma
> pessoa a ser virtuosa.

Então, mas educar sobre a virtude e seus benefícios é forçar?

Não sei se vai ficar bem explicar assim, mas olha só: a pessoa erra
por ignorância, certo. Basicamente, uma pessoa que erra sofre algum
tipo de ignorância. Vamos chamar ignorância de "atribuir as causas
erradas aos efeitos". Por exemplo, uma pessoa acredita que se ela
pular três vezes vai achar um objeto perdido. Pular três vezes não é
causa para o efeito de achar objetos perdidos. Mas a pessoa acredita
que sim, logo, aí está a ignorância.

Ok. Onde há erro há ingorância, pois ignorância é causa de erros.
Educar é ensinar a livrar-se dos erros, podemos refinar essa definição
mas vamos ficar com essa. Livrar-se dos erros é ensinar as causas
corretas para os efeitos. O problema é que enquanto se tenta ensinar
as causas corretas para os efeitos, as pessoa que está sendo ensinada
ainda sofre de ignorância e ainda duvida que a causa apontada para ele
como correta realmente produza aquele efeito.

Então, através de um método habilidoso, geralmente baseado em uma
recompensa, você consegue convencer a pessoa a produzir a causa
correta para o efeito, e depois espera que ela comprove como aquela
causa correta produziu aquele efeito, e não o que ele imaginava.
Digamos que este método habilidoso é composto de duas etapas 1) forçar
e 2) apontar.

Por que isso? Porque só forçar não livra da ignorância, e só apontar
foi tentado antes sem efeito. Então a combinação dos dois é um método
expediente para educar, e ele usou a força da recompensa indireta, ou
castigo indireto, etc.

Assim, "educar sobre a virtude e seus benefícios é forçar?". Não,
assim como uma casa não é um telhado, mas tem um telhado; forçar pode
fazer parte de uma educação sobre a virtude e seus benefícios.
Combinar forçar e apontar é um método muito poderoso contra a
ignorância. A FSF usa os dois, então deve estar claro para você por
que este é um método hábil e correto.


Enquanto alguém está agindo dentro de sua própria liberdade (isto é,
onde não invade a liberdade dos outros), não vejo problema nenhum,
desde que a pessoa esteja ciente das conseqüências de seus atos.

Existe um problema sutil. Ter ciência das consequências de seus atos
não anulam as consequências negativas dos atos da pessoa. Sendo assim,
uma pessoa que saiba que irá se prejudicar se ela pronunciar a letra
"B", por exemplo não se livra dos efeitos negativos caso resolva
pronunciar a letra "B".

Uma pessoa que mesmo ciente do seu sofrimento futuro e suas causas,
não o evita, não tem um entendimento correto dos males que está
criando para sí mesmo. Logo se vê que esta pessoa continua ignorante.

A natureza da ignorância de alguém que não evita o seu próprio mal é
da mesma natureza da ignorância de quem prejudica os outros, que é um
tipo especial de apego-desejo, o qual a explicação completa
encontra-se aqui:

http://www.acessoaoinsight.net/sutta/SnpV.1.php

"Venerável Ajita: "Pelo que o mundo está encoberto? O que faz com que
o mundo seja tão difícil de ser visto? Com o que, você diz, ele é
poluído? Qual é a maior ameaça no mundo?"

O Buda: "O mundo está encoberto pela ignorância, Ajita. O desejo
direcionado na direção errada e a negligência faz com que o mundo seja
tão difícil de ser visto. Ele é poluído pelo desejo e a grande fonte
de medo é a dor do sofrimento.""


Então quando você diz "não vejo problema nenhum, desde que a pessoa
esteja ciente das conseqüências de seus atos." leva a entender que ou
a pessoa deseja o próprio mal, ou a pessoa subestima o potencial
negativo de tal ato. Estimar o que não deve ser estimado e valorizar o
que não deve ser valorizado é muito perigoso para o mundo.

Quando você diz que "agindo dentro de sua própria liberdade (isto é,
onde não invade a liberdade dos outros)"  você está criando um "isto,
onde" que não existe nesse mundo, não é verdadeiro, é falso. Por que
isso? Uma pessoa que pratica o erro apoia o erro, pois vivendo de
acordo com o erro ele defende a prática do erro. Ela cria um estilo de
vida alternativo e exemplar baseado no erro. Não existe outra forma
mais poderosa que defender a prática do erro do que ser um praticante.
O mal disso está explicado em:
http://www.acessoaoinsight.net/sutta/SNXX.7.php

Onde devo citar:

" Assim também, bhikkhus, o mesmo ocorrerá com os bhikkhus no futuro.
Quando aqueles discursos que são as palavras do Tathagata – profundos,
profundos no seu significado, transcendentes, que tratam do vazio –
forem recitados, eles não darão ouvidos, não empenharão as suas mentes
para compreendê-los, não pensarão que o entendimento e o conhecimento
a fundo desses ensinamentos valem a pena. Porém eles darão ouvidos
quando discursos, que são obras literárias – obras de poetas, que soam
com requinte, com retórica elegante, obras de forasteiros, ditas pelos
discípulos deles – forem recitadas, eles darão ouvidos, empenharão as
suas mentes no seu aprendizado, considerando que esses ensinamentos
valem a pena ser entendidos e conhecidos a fundo."

bhikkhus são os alunos, tathagata é aque que foi para o lado da apenas
virtude, de uma forma que não se pode esperar que ele volte de lá. Ou
seja a causa que levaria o tathagata a abandonar a virtude não pode
ser produzida, e ele não volta. Se o software livre fosse a virtude, o
Richard Stallman seria o tathagata, pois nada fará RMS voltar a usar
software proprietário. É claro que estou exagerando, RMS poderia usar
SP sem saber, mas só queria explicar o que significa tathagata. É
alguem que está realmente livre.

Voltando ao tema,

"agindo dentro de sua própria liberdade" se está promovendo uma falsa
solução para o fim do sofrimento, e estas práticas serão atraentes
justamente para aqueles que mais precisam se libertar da ignorância,
ou seja, os próprios ignorantes.

O software livre tem se tornado uma ferramenta cada vez mais efetiva
no combate à ingorância, ao mesmo tempo que justamente quem mais
precisa dela são os que mais sofrem de ignorância e atiram no próprio
pé. Aqueles com menos capacidade intelectual, aqueles que ao invés de
trabalhar a sí próprio, acham mais fácil comprar uma solução para os
seus problemas. É claro, esta solução não se compra, o software nunca
é bom o bastante, sempre tem erros, sempre precisa de um toque a mais.
A causa disso é o apego-desejo, a origem de todos os males e o
bloqueador da sabedoria.

Não recriminar isto faz com que a comunidade que decidiu seguir um
rumo reto diminua. Faz com que tudo seja uma batalha, que até a coisa
mais óbivia do mundo seja tão dificil de demostrar.


Tipo, "Entre quatro paredes, vale tudo!", desde que as crianças do
vizinho não escutem ;-)

O exemplo que eu tenho para dar vai fazer parecer que eu lhe
interpretei mal, então deixa para lá, eu entendi o que você quiz
dizer. Se as causas para que o potencial negativo a ação amadureça não
estivarem todas reunidas, por falta de ingredientes o mal não
acontece.

Mas no caso de código útil escondido combinado com a não recriminação
desta prática, estas causas maléficas já estão reunidas de modo sutil.


Mas não "Deixa o nenê brincar com o facão!"

Pode crer, é mais ou menos assim. Tomar o facão do nenê é algo contra
a vontade do nenê, e contra sua liberdade de se ferir. Porém tomar o
facão do nenê evitará um erro desisivo que afetaria a compreensão
futura a respeito do risco que está correndo. É um caso de forçar para
poder produzir uma situação futura onde as causas para o aprendisado
estarão finalmente reunidas.


> Pergunta: Mas de que forma o fato de alguém fazer uma modificação a um
> software e usá-la apenas internamente leva a sociedade, ou, que seja,
> apenas eu, pra baixo do zero?

> Resposta: Não compartilhar é uma ação egoísta e traz muitos maus
> resultados.

Tipo, posso ter uma cópia da sua chave GPG, sem passphrase? :-)

Tudo bem, eu posso estar criando uma definição nova para a calavra
compartilhar, e você pode me acusar de estar usando dialética
erística, pois reparei você diagnosticando falácias prematuramente,
mas aceito correr o risco porque acho que você vai entender.

Quando digo compartilhar, é importante que, ao compartilhar, isto não
inutilize o objeto sendo compatilhado. Para que ocorra a partilha,
além da multiplicação dos donos não deverá ocorrer perda de função do
objeto compartilhado.

Se eu divido um comprimido para dor de cabeça entre 45 pessoas com dor
de cabeça, aí está havendo divisão e não compartilhamento. O
comprimido não servirá a ninguém, então qual o benefício?

Agora se eu divido o meu almoço com alguém, ambos seremos saciados, e
isso é compartilhar.

Se eu te der a minha chave GPG ela perderá utilidade para mim e para
os outros, e isto não é compartilhar. Caso entremos num acordo de
forma que a mesma chave mantenha a utilidade para nós dois,  mesmo
assim as pessoas não saberiam se a chave foi mesma enviada por mim,
então, não vejo onde que o benefício possa ter sido estendido para nós
dois ao invés de somente a mim.


A senha de root da sua servidora?

s/chave GPG/senha de root/


A senha do seu Internet Banking?  :-)

s/de root/do meu Internet Banking/



Nem tudo faz sentido compartilhar.

Nem tudo representa compartilhamento. Mas no caso da chave GPG, senha
de root e do banco são coisas que podem ser sim compartilhadas entre
pessoas.

Mas no caso do software isto é quase sem esforço, e amplamente
aplicável. É fácil dividir o valor de um software entre todas as
pessoas que o recebem.



Há casos em que alguém anseia pelo que o outro resiste a compartilhar.
Quem está sendo egoísta e daninho?  O que não quer compartilhar porque
vê ou teme comseqüências daninhas para si próprio, ou quem nada fez
além de pedir o fruto do trabalho do próximo?

Quando ou posso te dar um coisa sem que esta coisa perca sua utilidade
para mim e mantenha sua utilidade quando for transferida para você,
não fazer isso faz de mim uma pessoa má, egoísta, etc.


> Pergunta: Como é possível que eu ou a sociedade acabemos numa situação
> pior do que antes por não ter acesso a uma coisa que, se nunca
> houvesse sido criada, também não teríamos?

> Resposta: Se o advento desta coisa nova vem junto com a popularização
> do não compartilhar, a sociedade perde da seguinte forma: a sociedade
> ganha um cacareco qualquer que não tem muita importância, e perde o
> hábito de compartilhar, esse sim muito importante.

Tá esquisito isso.  O que é o "cacareco" em sua analogia?

Cacareco é uma coisa supérfula, uma coisa que a humanidade viveu
milênios sem. Por exemplo, todo software individual é um cacareco, do
ponto de vista que a humanidade chegou aqui sem softwares. Em
comparação com o compartilhamento é um cacareco, pois não enchergo
nossa evolução sem o compartilhamento. No mínimo não brigamos pelo
oxigênio, ainda.


No cenário que apresentei, a sociedade nem fica sabendo da existência
da modificação.  Ela não é distribuída, disponibilizada, anunciada,
nada.  É como se não existisse.

Bem diferente de uma modificação de fato disponibilizada, de uma
maneira que desrespeita as liberdades de seus usuários, isso sim um
problema social.

Menos mal.


> Uma sociedade pode viver sem um produto, mas não pode viver sem
> compartilhar. Não compartilhar torna tudo muito mais difícil do que
> já é. Uma sociedade que acha que não compartilhando estará
> contribuindo para o surgimento de coisas novas está sofrendo de
> muita ignorância.

+1

Mas a solução para isso não é a obrigação de compartilhar, é a
liberdade de compartilhar.

Isto. Se ninguém pousar de "não estou compartilhando e estou me dando
bem" isto não será praticado, então não há sentido em ser proibido.
Tipo, não existem placas de proibido estacionar em Júpiter. Quer
dizer, não da ultima vez que estive por lá =D


> Pergunta: O que podemos dizer sobre o endividamento e o compartilhamento?

> Resposta: Endividamento é dever algo para alguém.

Obrigação, legal ou moral.

isso.


Quando se diz "[estou] muito obrigado [a alguém]", significa "fico
devendo essa", é uma promessa de retribuição.  É uma dívida.

isso


> Dádiva é incompatível com dívida. Então o compartilhamento combate o
> endividamento, o endividamento combate o compartilhamento.

Desde que compartilhamento voluntário.  Porque se não for voluntário,
aí é dívida, não dádiva.  Daí minha oposição à obrigatoriedade do
compartilhar, mesmo que moral.

Ok - mais um "isso" e eu seria o chaves =D

E para promever o compartilhar devemos reprimir os maus exemplos, pois
é impossível exagerar os males de um mal exemplo.


--
Alexandre Oliva         http://www.lsd.ic.unicamp.br/~oliva/
FSF Latin America Board Member         http://www.fsfla.org/
Red Hat Compiler Engineer   [EMAIL PROTECTED], gcc.gnu.org}
Free Software Evangelist  [EMAIL PROTECTED], gnu.org}



--

A ignorância é um mecanismo que capacita um tomate a saber de tudo.


          "Que os fontes estejam com você..."

Glauber Machado Rodrigues
PSL-MA

jabber: [EMAIL PROTECTED]


--

A ignorância é um mecanismo que capacita um tomate a saber de tudo.


          "Que os fontes estejam com você..."

Glauber Machado Rodrigues
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