Fonte: O Globo 26/01/2008 Campus Party atrai todas as tribos e Sir Tim Berners-Lee define o futuro da rede http://oglobo.globo.com/tecnologia/mat/2009/01/24/campus-party-atrai-todas-as-tribos-sir-tim-berners-lee-define-futuro-da-rede-754130628.asp
RIO - Mais de 6.600 aficionados da tecnologia encheram o ar de urros na abertura da Campus Party, em São Paulo, semana passada, ao ouvirem o secretário do Ministério da Cultura Célio Torino gritar "Viva o pinguim! Viva o software livre!" no palco principal, pouco antes da meia-noite do dia 20. O evento - o segundo do tipo realizado no Brasil - dobrou de tamanho este ano e misturou tudo quanto é tendência em tecnologia. A liberdade, porém, estava no ar o tempo todo: liberdade de expressão, de navegação, de software, de criação. Casemods (aqueles gabinetes modificados) coloriam o gigantesco campus, torneios de jogos se sucediam, robôs dançavam em meio às mesas e conferências sobre vídeo, blogs e fotografias animavam as discussões sobre a mídia. - O grande lance aqui é a troca de informações, o contato entre as diferentes tribos. Por exemplo, do contato da turma de robótica com a do software livre nasceu o TORP (The Open-Source Robot Project), primeiro projeto de um robô totalmente construído com a ajuda de software aberto, que está sendo apresentado aqui - contou Sergio Amadeu, diretor de conteúdo do evento. O presidente da Linux Internacional, John "Maddog" Hall, estava animado com esse tipo de contato. - Aqui há gente que usa todo tipo de sistema operacional, como Windows, Mac, etc. Para mim, é uma chance de apresentar os usuários de Windows ao software livre - disse Maddog. Ele desafiou o evento a o desenvolver um vídeo musical baseado totalmente em programas abertos, cujo prêmio era uma poderosa workstation de áudio igualmente open-source. Entretanto, o mais esperado dos conferencistas era Sir Tim Berners-Lee, o criador da World Wide Web e do primeiro website. Sir Tim disse no evento que o futuro da internet é retornar a suas origens e ser mais democrática. E que a Web 3.0 vai nos levar até lá. - A Web 2.0 pode ser extremamente frustrante para os usuários por causa das diferenças entre programas e sistemas e da falta de controle dos usuários sobre suas próprias informações. Elas não devem mais ficar somente na mão de uma empresa - disparou. Hoje, prosseguiu ele, por vezes temos nossa lista de contatos numa determinada rede social e não conseguimos acessá-la a partir de outra, diferente. " Na Web 3.0, isso tudo vai se tornar mais aberto " ________________________________________________________________________ - Na Web 3.0, isso tudo vai se tornar mais aberto. Você terá mais controle sobre suas informações pessoais e sobre como quer usá-las - disse Berners-Lee. - Hoje há um movimento para que as pessoas e instituições linkem seus dados e os abram em vários campos, de modo que você realmente possa acessá-los em todos os lugares. Uma das coisas que o pai da web declarou no evento começou a se tornar realidade, aparentemente, no mesmo dia. Indagado sobre o que aconselharia ao novo presidente americano, ele comentou que uma das coisas mais interessantes que Barack Obama disse nos últimos tempos foi que os dados governamentais seriam abertos. - Espero que isso signifique plataformas livres. Obama chega na hora certa para promover uma mudança na abertura dos dados do governo - afirmou. Logo após o presidente Obama tomar posse, o site da Casa Branca passou a funcionar sob licença Creative Commons, liberando o conteúdo de copyright. Berners-Lee também falou de inclusão digital, lembrando que 80% da humanidade ainda não está online, e apontou a mobilidade e os celulares como uma possível solução para conectar à rede áreas rurais e remotas. Entretanto, lembrou que a característica da internet é ser acessível de qualquer tipo de aparelho ou gadget. Tim Berners-Lee / foto: Edilson Dantas Berners-Lee foi incisivo sobre a questão da neutralidade na internet. Aludindo ao traffic shaping que operadoras e provedores costumam fazer, controlando o acesso à banda pelos usuários, ele disse que a rede não precisaria de regras se os provedores se comportassem direito. Também acha que governos não devem prover conexão à internet, sendo preferível a concorrência saudável, na qual o consumidor pode escolher seu tipo de serviço. Ele deixou claro que os problemas de segurança e crimes que acontecem na grande rede nada mais são, em sua opinião, que um reflexo da humanidade. - A internet é uma ferramenta poderosa, pode ser usada para coisas horríveis ou coisas maravilhosas, da mesma forma que qualquer outra ferramenta usada pela humanidade. Quando você me pergunta como sinto as ações na rede, está me perguntando, no fundo, o que acho da humanidade. E, quanto a ela, sou extremamente otimista. Acho que, quando as pessoas se reúnem para resolver alguma coisa, elas são capazes de fazer coisas fantásticas. Para o pai da web, as universidades aqui no Brasil deveriam criar cursos de ciência da web (Web Sciences) para discutir e entender melhor a grande rede, não só tecnicamente, mas socialmente também. - A democracia online é algo complexo. Em diferentes sites e comunidades, há diferentes formas de democracia e meritocracia. A maioria é ouvida, mas as minorias também têm voz. E o futuro da internet? Como será o amanhã? Sir Tim Berners-Lee não vacilou ao responder. - Será ainda mais interativo, com aplicações muito mais poderosas. Em algum ponto, será possível virtualizar coisas de tal forma que você será capaz de preencher parte de um cômodo com pixels, que estão ficando cada vez mais baratos - afirmou ele. - E, com o movimento dos dados abertos e linkados entre si, se governos, entidades e empresas fornecerem à comunidade online seus dados brutos, poderão contar com o valor dessa própria comunidade para difundi-los. Entretanto, é preciso se preocupar com a privacidade, sempre. - Temos que mexer na tecnologia para que as pessoas botem seus dados na rede, mas ao mesmo tempo tenham controle sobre eles, sobre a forma como são acessados. A nota cômica do papo de Sir Tim com a imprensa veio quando lhe perguntaram se ele removeria alguma coisa da web atual. - Eu removeria as duas barras (//) que vêm depois do "http:". Hoje sabemos que elas não são mais necessárias... Mas para isso seria preciso reescrever o sistema inteiro. Foto: Edilson Dantas A Campus Party trazia casemodders do Brasil inteiro, como o designer Maciel Barreto, 33 anos, de Itajuipe, Bahia, que transformou o gabinete de seu PC num robô alienígena batizado de Morphius (assim mesmo, com "i"). - Ele é todo artesanal, fiz em dois meses com fibra de vidro - disse. - A configuração é um Mobo com Core 2 Duo, placa Asus Strike Extreme e 2Gb de memória. O imaginativo Maciel criou até uma historinha para o casemod. Morphius seria um morador de outra galáxia que, ferido em combate, aportou na festa para se consertar e reunir informações sobre os campuseiros. Outro casemod divertido era o do analista de rede Carlos Alexandre Duarte, também conhecido como Carlos Xandelly, de Campinas. Ao lado do computador, Xandelly, com um visual de cientista maluco, tinha vários frascos coloridos com a água especial que refrigerava a máquina. - Essa água é o primeiro fluido 100% nacional feito para esse fim - afirmou Carlos. - Ela é desmineralizada e destilada duas vezes, de modo a não conduzir eletricidade nem propiciar o surgimento de fungos, mantendo o computador protegido e aumentando sua performance. Segundo o analista de redes, o fluido nacional será comercializado dentro de um mês. Até os corantes usados nele são nacionais. Marcelo Branco, diretor da Campus Party / Foto Divulgação Marcelo Branco, organizador da Campus Party, andava de um lado para o outro e parecia ter a capacidade de estar em todos os lugares ao mesmo tempo: entrevistas, apresentações, palestras... Para ele, o evento sempre teve tudo a ver com o Brasil, pois o brasileiro é o internauta que mais passa tempo navegando pela rede, além de ser a segunda nação do mundo em usuários de redes sociais. - A internet não seria o que é se seus idealizadores não escolhessem abrir todas as tecnologias, não decidissem torná-las de domínio público - disse ele à DIGITAL. - O evento recupera a essência da internet, que é a inovação, hoje dentro da rede, na mão das próprias comunidades. E as empresas e instituições que vêm aqui querem aprender com os jovens, ver como eles estão solucionando seus desafios tecnológicos. Indagado se havia chance de a Campus Party dar o ar de sua graça em outras cidades, Marcelo explicou que a festa tem parcerias importantes com o governo do estado e da cidade, além do federal. Não por acaso, o governador de São Paulo, José Serra, e o prefeito da capital, Gilberto Kassab, estavam na abertura. Serra fez a contagem regressiva junto com Sir Tim e definiu a feira como "a Fórmula-1 dos eventos de tecnologia". De fato, a Campus Party parece simbolizar uma ressurreição dos eventos de grande porte, só que de uma forma bem mais sábia. Badaladas nos anos 90, feiras como Fenasoft e Comdex deixaram de existir em Sampa. Sobraram no panorama nacional eventos focados como a Futurecom, da área de telecomunicações e bem comercial, ou como o Fórum Internacional Software Livre, de Porto Alegre, mais "cabeça" e filosófico. A Campus Party é uma combinação dessas duas tendências (havia uma área de exposições, embora ela tivesse ficado bem mais vazia que o campus) e tem a cara da multiplicidade da internet - tanto que havia uma dificuldade de saber onde terminava a fronteira de um setor (games, robôs, free software...) e começava a do outro. Estava tudo meio misturado, e parecia proposital. Usuários de diversas partes do mundo (até da Bielorrússia) ocupavam as duas mil barracas do setor de acampamento, com banheiros e chuveiros coletivos. Houve quem achasse tudo confortável, como Maciel. Já Omar Majzoub, estudante de computação, considerou o acampamento bem mais apertado que na Campus Party do ano passado. - Dei sorte de pegar uma barraca só para mim. Outros não tiveram essa sorte. No ano passado o banheiro era maior, e agora os cubículos estão muito mais apertados. Também só há água fria nos chuveiros - contou. John Maddog Hall na Campus Party / Foto Divulgação Omar era outro dos casemodders, como o colombiano Diego Vallecilla, que transformou um modelo automobilístico em CPU, e o técnico em mecânica Cristian Acevedo, de Santiago do Chile, que estreou na Campus Party brasileira com um computador representando o ataque do Alien, o célebre monstro da série cinematográfica com Sigourney Weaver. - É um trabalho delicado, todo feito em resina epóxi - contou. - Primeiro se elabora um modelo, então se aplica a resina e depois é a hora da pintura. Levei dois anos para completar tudo. Já o estudante de biologia Hermann Ludwig Maier, de Jandira, Grande São Paulo, tinha um computador todo de madeira, lembrando um pouco uma escrivaninha antiga, só que com um visor redondo do lado, mostrando o interior inundado de luz azul. - Minha ideia era bolar uma coisa futurista, mas ficou assim, e todo mundo que vê acha que adaptei um móvel antigo... - comentou Hermann. - Como é de madeira e retém calor, a refrigeração [a ar] teve que ser mais bem pensada. O ar entra por baixo, passa pelos circuitos e sai por cima. John Maddog Hall, da Linux International, fez uma palestra dizendo que ninguém deve ser escravo de qualquer software e, indagado se o fiasco do Windows Vista levou mais usuários a se voltarem para o software livre, nem pestanejou: - Com certeza. Eu estava até comentando com um amigo que, antes do Vista, as pessoas ainda diziam "a Microsoft vai nos mostrar o caminho". Mas, de repente, veio o Vista, quando todo mundo estava perfeitamente confortável com o XP, e agora eles aparecem com o Windows 7... Agora, há gente que não acredita muito que a Microsoft saiba o que está fazendo - disse Maddog. - Por outro lado, conheço gente que não vê necessidade de reinstalar seu Debian Linux há anos. Eles simplesmente usam o mesmo sistema e vão baixando as atualizações. O Comitê Gestor também apareceu no evento, para discutir temas como IPv6 (a nova versão do protocolo de internet, que aos poucos está sendo implementada) e DNSSEC, extensão do sistema de nomes de domínio atual que prevê maior segurança. - O DNSSEC permite evitar fraudes como a transformação de nomes em números falsos no ambiente da internet. Essa característica antes acontecia mais em ambientes sem fio, mas no ano passado descobriram um grande furo que também permitia a fraude em redes cabeadas, daí a necessidade da extensão de segurança, que permite "assinar" domínios - explicou Demi Getschko, diretor-presidente do NIC.br. - Já o IPv6 é a chamada "internet das coisas", que permite dar endereços a nova aplicações e estender mais a rede. A versão 6 é tão grande que um pedacinho dela pode ser maior que toda a versão 4, de modo que até, digamos, sua roupa poderia ter um endereço web. Leia a cobertura completa da Campus Party: Apresentado na Campus Party primeiro robô livre do mundo http://oglobo.globo.com/tecnologia/mat/2009/01/25/apresentado-na-campus-party-primeiro-robo-livre-do-mundo-754136596.asp Para ver o projeto, acesse www.theopenrobotproject.org. Primeiro robô humanóide é criado na Campus Party 2009 http://www.new.divirta-se.uai.com.br/html/sessao_16/2009/01/26/ficha_drops_noticia/id_sessao=16&id_noticia=7085/ficha_drops_noticia.shtml Campus Party começa a levantar acampamento Futuro das Lan houses está no acesso gratuito Mais de 4,5 milhões acessaram a internet por celular nos últimos 3 meses Bruna Surfistinha fala sobre sexo e blogs Blogueiros famosos contam suas experiências Blogueiro de Caminhos da Índia entrega prêmio BestBlog 2008 Equipe quebra recorde nacional de overclocking Investidores buscam na Campus Party idéias para ganhar dinheiro com internet Batismo digital da Campus Party tem baixa adesão Maddog, da Linux, prega a liberdade na Campus Party Brasil Lixo eletrônico é contrapeso à evolução do acesso a informação Madrugada com os Nerds Campus Party tem confusão durante show Maioria dos participantes da Campus Party tem entre 18 e 24 anos Uma semana de Campus Party é pouco, dizem participantes Índios também participam da Campus Party Computadores disputam em forma e desempenho Campus Party quer conectar 6 mil numa superbanda de 10Gb Tim Berners-Lee aposta na mobilidade Campuseiros criam rede interna e uso da banda de internet alcança 4,8 gigas Fatec desenvolve sistema que cria 4 computadores
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