Caro Stolfi,

Também eu enfrentei a mesma resistência que voce encontrou com o Leo Pini, para conseguir apoio ao manifesto dos professores sobre o voto-e, da parte de alguns professores da Unicamp.

A alegação é que apesar de concordarem com a idéia geral do manifesto, eles se abstem de apoiar devido a restrições ao que é dito sobre o Relatório da Unicamp-TSE.

Lembro que na versão inicial do manifesto, antes de ser publicado, a referência ao Relatório Unicamp era bem mais dura e que o texto foi bem amenizado justamente por sua sugestão, resultando numa referência bastante leve, onde apenas se critica o fato do TSE estar fazendo uso tendencioso do relatório.

Por isto eu estranho a resistência de alguns professores em apoiar o manifesto. Me parece que eles têm colocado uma questão de "espírito de corpo" bem acima do argumento técnico, o que não me parece adequado ao "espírito acadêmico".

Mas temos que respeitar a posição de cada um sem deixar de lutar pelo esclarecimento dos fatos

Por isto, para apresentar a história do Relatório da Unicamp, procurando esclarecer por que ele acabou se tornando um relatório tão polêmico, eu escrevi um texto novo que está apresentado em:
http://www.brunazo.eng.br/voto-e/textos/relfuncamp1.htm


O Prof. Leo Pini, por exemplo, defendeu a qualidade do relatório mas demonstrou desconhecer a origem dele, imaginando que foi "feito a pedido do TSE". Mas não foi.

O pedido de uma PERÍCIA original foi feito pelo Senado à Unicamp por ofício, cujo fac-simile pode ser vista em:
http://www.brunazo.eng.br/voto-e/imagens/oficiosve1.jpg
http://www.brunazo.eng.br/voto-e/imagens/oficiosve2.jpg


Se apresentou uma lista de 13 quesitos e nomeou-se dois asistentes técnicos para acompanhá-la. Mas o resultado final foi, não uma perícia, apenas uma simples avaliação (como diz o próprio relatório) onde os quesitos foram ignorados e o acompanhamento pelos assistentes técnicos independentes, impedida.

Só este fato acabou por tornar suspeita a qualidade do relatório. De nada vale os próprios autores e seus colegas de corpo afirmarem sua qualidade se concordaram em evitar o acompanhamento do desenvolvimento dos trabalhos por observadores externos.

Na minha visão, este relatório acabou tendo sua qualidade posta em cheque por que seus autores e organizadores cederam a pressões políticas do TSE além do razoável, permitindo que o rigor técnico fosse substituido por conveniências políticas.

Além do Relatório das Unicamp sobre o voto-E do TSE, existem mais dois outros relatórios acadêmicos sobre o mesmo tema: o do COPPE/UFRJ e o da SBC.
Infelizmente estes dois relatórios técnicos estão indo para o mesmo caminho do Relatório da Unicamp. Acabarão sendo desmoralizados. Eles têm sido mantidos secretos justamente para atender a conveniências políticas do TSE, que procura evitar a qualquer custo que a comunidade acadêmica e a sociedade em geral tome conhecimento das falhas e erros do seu sistema.


Eu não entendo bem este comportamento de nossa comunidade acadêmica. Nos EUA, todos os especialistas em segurança de sistemas, até premiadíssimos como o Ronald Rivest (inventor do sistema de criptografia assimétrica, assinatura digital, etc), têm escrito relatórios e artigos e mais artigos sobre a baixa confiabilidade de sistemas eleitorais eletrônicos atuais, assinado abaixo-assinados e conseguido que posições políticas sejam corrigidas pelo argumento técnico. Aqui no Brasil, acontece o contrário. O argumento técnico é que está sendo adaptado às conveniências políticas.

Eu acho que toda esta polêmica sobre os três relatórios (Unicamp, COPPE e SBC) merecia um tratamento mais profissional e menos passional. Que alguma destas instituições faça um seminário para discutir esta questão, que procurem esclarecer a sociedade e não esconder dela suas conclusões...

... afinal, é do nosso voto que estamos falando!

[ ]s
  Amilcar Brunazo Filho

At 13:45 08/01/04, Jorge Stolfi wrote:
Caros, para sua curiosidade:

Enviei ontem a mensagem abaixo ao Léo Pini Magalhães, ex-diretor da
Fac. de Engenharia Elétrica da Unicamp, e membro do Conselho
Universitário (CONSU). A resposta vem em seguida.

--stolfi

----------------------------------------------------------------------
Date: Wed, 7 Jan 2004 17:17:31 -0200
To: Leo Pini de Magalhaes <[EMAIL PROTECTED]>
Subject: CONSU 30/set/2003 - urna eletronica

Caro Léo,

Há poucos dias, surfando pela rede, encontrei por acaso a ata da
reunião do Conselho Universitário de 30/set/2003. Nessa reunião, você
mencionou o manifesto sobre a urna eletrônica, do qual fui um dos
signatários iniciais:

  > O Conselheiro LÉO PINI MAGALHÃES com a palavra, informa ... E o
  > último assunto diz respeito a uma carta aberta divulgada por sete
  > colegas da área de Computação, sendo um deles da UNICAMP, na lista
  > da Sociedade Brasileira de Computação, brilhantemente presidida
  > pela Professora Cláudia Bauzer do Instituto de Computação. Essa
  > carta tem como título "Alerta contra a insegurança do sistema
  > eleitoral informatizado". Esse alerta é uma preocupação de toda a
  > comunidade, então quanto a isso não há o que colocar nenhum
  > reparo. O que lhe causou estranheza e que fez essa carta perder um
  > pouco da força, foram algumas observações que poderiam colocar
  > como injustas, a um estudo muito sério feito por oito professores
  > da UNICAMP, do Instituto de Computação e da Faculdade de
  > Engenharia Elétrica e de Computação sobre a questão da urna
  > eletrônica. Esse estudo foi feito a pedido do TSE, foi assinado
  > por esses oito professores e consta da página do TSE sob o ícone
  > "Eleições 2002".

Entendo sua posição delicada, como representante da FEEC no CONSU e
amigo pessoal dos autores do relatório.  Dadas essas circunstâncias,
reconheço que sua intervenção acima foi bastante equilibrada.

Mas é minha vez de estranhar sua menção a suspostas "observações
injustas" no nosso manifesto, que diz apenas

  > O estudo de um grupo da Unicamp (pago pelo TSE), parcial e pleno
  > de ressalvas, recomendou vários procedimentos como condição para
  > garantir o nível de segurança necessário ao sistema. Essas
  > ressalvas, infelizmente, foram omitidas na propaganda sobre as
  > maravilhas da urna.

Não vejo nada que possa ser considerado "injusto" nessas frases. É o
próprio relatório que declara o estudo "parcial", e faz um monte de
ressalvas sobre a validade de suas próprias conclusões. Entre outros
pontos, os autores frisam que o estudo foi feito sobre o sistema usado
em 2000, que é diferente do usado em 2002 -- para não falar de 2004. O
relatório também informa que apenas uma parte do software chegou a ser
inspecionada, e que, devido ao volume de código, a inspeção não foi
detalhada o bastante para garantir sua corretude.

Se você leu o relatório, com certeza deve concordar que o parágrafo em
disputa -- a afirmação, nas Conclusões, de que a urna é totalmente
segura -- é contrário não apenas ao bom senso, mas a todo o resto do
relatório. Uma vez que o relatório "da Unicamp", reduzido a esse
parágrafo, tem sido usado e abusado pelo TSE como prova cabal da
segurança da urna, não vejo como poderíamos alertar a sociedade sobre
o risco de fraude sem criticar explicitamente o estudo.

Mas note, por favor, que nosso manifesto não questiona a seriedade ou
qualidade da perícia "da Unicamp", nem faz ou sugere qualquer crítica
sobre a competência, integridade ou motivações dos autores. Mesmo nas
mensagens que eu enviei em outubro/2002 (em resposta à "cobrança" do
José Figueiredo, que foi aliás a primeira notícia que tive da
existência desse estudo e do relatório), eu fiz questão de me ater
apenas aos aspectos técnicos e regimentais da questão, evitando
cuidadosamente levar a questão para o lado pessoal.

Por isso, sinto-me um pouco incomodado com a sua manifestação no
CONSU, acima, pois ela parece estar desviando o foco da questão -- que
deveria ser apenas os aspectos técnicos e suas implicações sociais --
para o plano pessoal.

Aliás, uma coisa que muito me incomodou nesse caso foi justamente o
fato de que, por "esprit de corps", muitos docentes da Unicamp se
sentem agora impedidos de criticar esse relatório, ou mesmo obrigados
a defendê-lo -- apesar do estudo ter sido elaborado inteiramente à
revelia do resto da Universidade, e contra o parecer da Comissão de
Perícias.

Imagino que seja por este sentimento, em parte, que a Unicamp está tão
mal representada na lista de adesões do manifesto (13 docentes, sendo
7 do IC e nenhum da FEEC; contra 48 docentes na USP, sendo 36 da
Escola Politécnica e 4 da Computação). E espero que você entenda meu
desapontamento ao descobrir que a campanha por uma eleição segura --
um esforço considerável de muitas pessoas, no interesse do país --
foi citado no CONSU apenas de uma forma relativamente superficial e
negativa.

Se me permite dizer, acredito que os autores do relatório são grandes
o bastante para defendê-lo eles mesmos, caso eles acreditem que as
críticas são inválidas. Entretanto, até agora não vi nenhuma resposta
deles -- nem para minhas mensagens de 2002, nem para o manifesto em
questão. Aliás, até hoje não vi nenhuma contestação técnica, deles ou
de qualquer outra pessoa, da tese exposta no manifesto -- de que, sem
impressão do voto, a urna é totalmente insegura contra fraudes
internas. Na verdade, desconfio que até mesmo os autores do relatório
concordam com essa tese.

O objetivo imediato do nosso manifesto infelizmente não foi atingido,
pois a PL1503, que elimina a impressão do voto, acabou sendo aprovada
por pressão do TSE, sem avaliação técnica independente. (Mais detalhes
podem ser encontrados na página www.votoseguro.org). Por questões de
prazos legais, são agora infinitésimas as chances de reverter essa lei
e garantir um mínimo de segurança para as eleições de 2004. Os
problemas talvez sejam corrigidos nas eleições seguintes, mas somente
se houver pressão da opinião pública. Para isso, o apoio da comunidade
de cientistas da computação é muito importante: se nós não nos
preocuparmos com esse problema, quem vai se preocupar?

Mais uma vez, entendo sua posição delicada neste assunto. Mesmo assim,
peço-lhe que considere seriamente aderir ao manifesto:

http://www.brunazo.eng.br/voto-e/alertaprofessores/index.htm

Creio que a lista de nomes respeitáveis que já aderiram seria desculpa
suficiente para justificar tal decisão de sua parte, apesar de
eventuais ressalvas políticas e pessoais. E não preciso lhe dizer o
quão valiosa seria sua adesão.

Espero que você concorde que se trata de um assunto muito sério, que
deveria transcender brigas de política acadêmica. Na verdade, eu não
veria nenhuma incogruência se os autores do estudo resolvessem colocar
seu envolvimento pessoal de lado, e aderissem eles mesmos ao
manifesto.

Bom, Léo, desculpe-me por esta "lavada de alma", e obrigado pela sua
atenção.  Um abraço, e tenha um feliz 2004.

--stolfi
----------------------------------------------------------------------
Date: Thu, 08 Jan 2004 13:49:50 -0200
From: Leo Pini Magalhaes <[EMAIL PROTECTED]>
To: [EMAIL PROTECTED], [EMAIL PROTECTED]
Subject: urna + consu


Prezado Stolfi, 8/1/2004


A minha observação, e o motivo da falta de minha assinatura no
manifesto, foi o meu entendimento de que o documento também era uma
crítica ao grupo de estudos. O teor geral do documento tinha a minha
concordância, como você verificou ao início de minha fala.

A crítica, em nosso meio, é comum, no documento pareceu-me
inapropriada e desnecessária. No meu entendimento, desviou o foco do
documento e não pode contar com a minha assinatura, embora concorde
ser um absurdo a aprovação do projeto de lei sem uma discussão mais
longa e eliminando a impressão do voto.

Como esperava ter deixado claro, e estou certo foi o seu entendimento,
respeito os autores do documento.

Como membro do CONSU, tenho uma página e gostaria de colocar o seu
e-mail lá se voce não tiver restrição, Por favor veja a página em:

http://www.dca.fee.unicamp.br/~leopini/consu/consu.html

(há um icone para e-mail recebidos).

Até e um abraço que estou tirando 15 dias de férias,

Léo
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[ ]s
     Eng.  Amilcar Brunazo Filho - Santos, SP

      Em Defesa da Cidadania
          http://www.civilis.org
      Pelo Voto Seguro
          http://www.votoseguro.org

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