Terça-feira, 11 de junho de 2002
 Pág.  A 3
Urnas eletrônicas, Abin e Unicamp
ROBERTO ROMANO


TENDÊNCIAS/DEBATES
Grave preocupação da cidadania, no processo eleitoral que logo definirá os rumos da 
República, diz respeito às urnas eletrônicas.
Não se trata de simples problema técnico. Caso não seja garantido o controle dos 
procedimentos na apuração dos votos, podemos
enfrentar uma nova e desastrosa crise política.
Num país que viveu boa parte do século 20 sob ditaduras, as autoridades não têm o 
direito de abandonar as cautelas éticas. Se
ocorrer alguma irregularidade na apuração do pleito, a fé pública receberá um golpe 
pior do que os produzidos pelas tristes
experiências de corrupção, censuras, despotismos vários que geraram no povo brasileiro 
a descrença na democracia e no Estado de
Direito.
Quando a Unicamp aceitou analisar as urnas eletrônicas, eu presidia a sua Comissão de 
Perícias. Fui consultado pelo então reitor,
dr. Hermano Tavares, apenas pro forma, pois aquele trabalho não integrava as 
atribuições da comissão. Esta última foi instituída
para definir normas nas atividades ligadas ao extinto Departamento de Medicina Legal. 
Respeitosamente, lembrei ao reitor os riscos
do novo empreendimento. A Unicamp era chamada a fornecer um aval técnico, positivo ou 
negativo, em setor político explosivo, nas
próximas e tensas disputas majoritárias. Pedi uma nota advertindo que a comissão por 
mim dirigida nada tinha a ver com a peritagem
das urnas.
A solicitação foi feita diretamente ao reitor, na presença do chefe-de-gabinete. A 
proximidade de nomes e funções, argumentei,
traria equívocos indesejáveis entre o que fazia a Comissão de Perícias e os laudos 
sobre as urnas.
Após o dispêndio de muito tempo para equacionar gravíssimos problemas na sua área 
própria, a comissão finalizava os seus trabalhos,
tendo defendido a Unicamp, sobretudo no setor médico, caluniado por grupos que 
atribuíam ao todo acadêmico os erros cometidos por
ínfima parcela de professores.
A nota não foi publicada. Restou espaço para o equívoco temido por mim. A Unicamp 
realizou a sua perícia com a competência acadêmica
de sempre. E fez recomendações graves para o uso de códigos e chaves protetoras do 
sigilo eleitoral. Honrando o rigor ético e
científico, os nossos técnicos perceberam consequências que envolvem problemas 
axiológicos na condução do caso. E fizeram
recomendações cautelares, não acatadas pela Justiça Eleitoral.
Esse ponto já evidencia um perigo para a Unicamp: seu laudo é utilizado como garantia 
de fiabilidade das urnas eletrônicas, mas suas
recomendações sobre a segurança na manipulação das mesmas são ignoradas.
Devido ao meu trabalho de pesquisa em ética e filosofia política e às funções que 
exerci, mantenho intenso contato com magistrados,
promotores, procuradores federais e outros encarregados da aplicação da lei em nosso 
país. Muitos deles agora me procuram para
indagar sobre a minha responsabilidade e a da antiga Comissão de Perícias no trato 
estabelecido com a Justiça Eleitoral para a
peritagem das urnas.
A todos, por falta da nota que deveria ter sido publicada pela antiga reitoria, agora 
esclareço: nem a comissão nem eu respondemos
pelo convênio com a Justiça Eleitoral para a peritagem das urnas. Ele é de exclusiva 
responsabilidade da reitoria mencionada.
Pessoalmente, tenho receios sobre o que pode ocorrer. Há pouco tempo, a Folha publicou 
documentos da Abin (Agência Brasileira de
Inteligência) em que os seus agentes confessam que podem "arranhar direitos" da 
cidadania. A mesma agência tem exercido tarefas não
compatíveis com a intimidade e os direitos constitucionais dos indivíduos. Por 
enquanto, a integralidade de seus quadros não goza da
confiança irrestrita do mundo político, tanto entre eleitores quanto entre lideranças.
Integro o número dos que defendem a existência da Abin, tendo em vista a inserção 
brasileira nas lutas internacionais, do comércio à
produção científica e tecnológica. Mas considero que semelhante organismo ainda não 
provou isenção política, reconhecida por todos
os setores do país. A imprudência do seu uso para manter o sigilo das urnas é 
manifesta.
A imprensa cumpre seu papel e noticia os fatos. A população precisa se manifestar. As 
autoridades democráticas, que respeitam o
Estado de Direito, devem explicações à nação.




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