Latinoware 2015 #semUbuntu, mas com pouco GNU

Então mais um Latinoware passou, e segundo soube foi lindo! A presença massiva 
dos nerds de plantação da tríplice fronteira garantiu o sucesso de um dos 
maiores eventos de tecnologia do Brasil. E como não podia deixar de ser, muita 
coisa aconteceu para o público e também nos bastidores. Entretanto o que mais 
preocupa é descaracterização do evento como um dos estandartes da liberdade 
tecnológica: o Latinoware nasceu cultuando o Software Livre e hoje vira as 
costas para a FSF e os defensores da liberdade do software.

Faz alguns anos que o evento vem, gradativamente, flexibilizando sua grade de 
palestras e oficinas incluindo mais e mais tecnologias não livres. Apenas para 
exemplificar, no ano passado houve a apresentação de um programa que auxilia na 
linguagem de Libras que é 100% privativo. Eles foram convidados oficiais da 
organização do evento, ou seja, não foi um erro de escolha da comunidade ou de 
avaliação.

Quem se deu ao trabalho de dar uma pesquisada na grade de palestras do 
Latinoware 2015 pôde perceber alguns sinais muito interessantes: só havia uma 
única palestra com “GNU” no nome, ao menos 3 atividades explicitas de software 
não livre e a ausência absoluta da discussão filosófica do Software Livre. A 
maioria das atividades estavam relacionadas ao desenvolvimento de programas e 
métodos de produção otimizados pelo compartilhamento dos códigos. Apenas para 
deixar claro: o Latinoware nunca foi um evento “filosófico” e sim muito mais 
pragmático e técnico, mas sempre houve um espaço de destaque para a 
conceituação ideológica do Software Livre, pois os organizadores sabiam bem que 
esse é o alicerce do movimento que pretende mudar as estruturas da forma como 
se dissemina tecnologia nos dias atuais.

fedora_latinowareÉ fato que o Latinoware se preocupou em remover o Ubuntu de 
suas maquinas principais – em especial as que ficam nas salas das palestras – 
substituindo-as pela distribuição comunitária Fedora. Esse é um passo que 
merece um elogio contundente por conta do simbolismo que traz consigo. Não é 
perfeito, pois o Fedora ainda disponibiliza um kernel Linux recheado de drivers 
e softwares não livres, mas é um primeiro passo importante. Agradeço 
publicamente ao amigo Marcos Siríaco por ter cumprido a palavra empenhada no 
FISL16 quando me disse pessoalmente que essa mudança seria feita.

Entretanto a troca do Ubuntu por Fedora não foi completa, pois algumas 
atividades ainda usaram e abusaram do Ubuntu, em especial para a realização de 
um campeonato de Urban Terror que é um jogo absolutamente não livre. Aliás, por 
que o Latinoware promoveria o campeonato de um jogo não livre em vez de 
estimular jogos livres? Esse parece ser o sinal claro de que a complacência que 
permite a convivência pacífica com o software não livre faz com que a presença 
de software não livre cresça, portanto ela não é benéfica ao Software Livre e 
sim ao software não livre, certo?

É claro que o Latinoware é um evento importantíssimo – se não fosse não me 
daria ao trabalho de escrever estas linhas – mas me parece que a mudança 
gradual de enfoque é clara e não é sem querer. Nomes importantes da organização 
do evento como Alberto Azevedo e Sílvio Palimieri vem trabalhando de forma 
árdua para remover a discussão filosófica do Software Livre do evento, usando o 
discurso da Liberdade de Escolha como bandeira de liberdade, quando sabem 
perfeitamente que a defesa da liberdade do software não é flexível, não é 
mutável e não deve baixar a guarda para um argumento mercadológico. Portanto 
não se trata de uma ação inocente, mas de um esforço deliberado para demover o 
caráter vanguardista do Latinoware: menos Ubuntu e mlatinoware_inovacaoenos GNU.

Não sem querer, na capa do Caderno Inovação, do Jornal Iguaçu, está estampada 
uma matéria sobre o Latinoware – “o evento mais nerd da América Latina”, com 
foto do Jon “maddog” Hall e nenhuma, absolutamente nenhuma menção ao Software 
Livre. É a perda gradativa da discussão política e social das liberdades do 
software e seu caráter revolucionário. É a substituição do modelo que discute 
como devemos lidar com a transferência de conhecimento tecnológico, pela 
discussão dos melhores modelos de produção. Quando se aceita a inserção massiva 
de software não livre nas distribuições mais famosas e se continua dizendo que 
elas são Software Livre, quando se aceita que as empresas de Software Livre se 
comportem de forma anti ética e amoral como qualquer outra empresa e quando se 
aceita que um evento do porte da Latinoware, cuja importância foi cunhada sobre 
os conceito do Software Livre, seja descaracterizado, está se cometendo, no 
mínimo, omissão.

O futuro é o campo das especulações, e deve ser tratado com cautela, sob o 
risco de se ser injusto. Assim, com muito cuidado vou fazer a minha: se o 
Latinoware e outros, eventos de grande porte não promoverem um resgate dos 
valores ideológicos do Software Livre, se não criarem as devidas barreiras para 
evitar a presença de softwares não livres, se não expuserem claramente seu 
posicionamento pró Software Livre, então eles serão consumidos pelo discurso da 
mediação e da convivência pacífica com o software não livre, inclusive ajudando 
a disseminar essa ideia. E assim o Software Livre terá perdido seu último 
grande estandarte, uma vez que os eventos serão meramente técnicos, 
tecnológicos e nerds, mas não mais de Software Livre.

Saudações Livres!

Anahuac

http://www.anahuac.eu/latinoware-2015-semubuntu-mas-com-pouco-gnu/

-- 
Anahuac de Paula Gil

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