17/07/2006
Richard Stallman, 53 anos, um dos criadores do software livre
Cuidado. Seus programas podem ter aprisionado você e seu computador

ERNESTO RODRIGUES/AE

ARREBANHANDO FIÉIS - Stallman defende o software livre em palestra
realizada no fim de abril na Escola Politécnica da USP, em São Paulo

Para o programador que ajudou a desenvolver o sistema operacional
GNU/Linux, não existe liberdade no mundo da tecnologia para quem usa
aplicativos com restrições e com o código fechado, como o Windows e o
Microsoft Office

Maurício Moraes e Silva

Mac OS e usa programas para escrever textos, ler e-mails e navegar
pela internet, entre outras coisas. Para muita gente, isso se tornou
um dos exemplos de liberdade na vida contemporânea. Na visão do
programador norte-americano Richard Stallman, porém, essas pessoas não
sabem que vivem aprisionadas. Há pouco mais de 20 anos, ele decidiu
salvá-las.

Com uma barba densa e cabelos abaixo dos ombros, Stallman
transformou-se em um pregador da era hi-tech. Sua "religião" se chama
software livre, uma idéia que ajudou a criar e que rompeu as
fronteiras dos Estados Unidos, transformando-se em um movimento
mundial. De acordo com Stallman, um programa de computador só é
"livre" quando tiver quatro características: se puder ser executado
por qualquer pessoa para qualquer finalidade; se seu código puder ser
estudado e modificado; se o usuário puder fazer cópias e
distribuí-las; e, se for possível, distribuir versões alteradas.

Tudo isso está proibido para quem usa o Windows, o Mac OS, o Microsoft
Office ou o iTunes, por exemplo. Boa parte dos aplicativos produzidos
por grandes empresas tem seu conteúdo trancado a sete chaves: são
softwares proprietários. "Ao usar um programa que não é livre, você
corre o risco de sofrer abusos dos desenvolvedores", explica Stallman.
"Se você não quer ser vigiado pelo Windows Media Player, que informa
tudo o que você faz, pode tentar mudar para o RealPlayer. Mas o
RealPlayer espiona usuários do mesmo jeito."

Esse tipo de "delito" não ocorre no sistema operacional GNU/Linux –
que tem o norte-americano entre seus criadores –, na suíte de
aplicativos OpenOffice ou no navegador Firefox. Os três são softwares
livres porque possuem as características defendidas por Stallman. "Não
sei o que vai acontecer no futuro, mas posso dizer que nosso objetivo
é um mundo onde todo programa seja livre – o que significa que todos
os usuários serão livres", diz. Pode parecer utópico, mas ele já viveu
essa experiência.

Do fim dos anos 60 ao início da década de 80, o programador trabalhou
no Laboratório de Inteligência Artificial do Massachusetts Institute
of Technology (MIT). "Tive o que se pode chamar de um golpe de sorte.
Era o centro de uma maravilhosa comunidade de software livre", lembra.
Isso muito antes de a idéia se tornar popular. Os pesquisadores
colaboravam entre si e compartilhavam os programas produzidos com quem
pedisse. Ali não entravam aplicativos proprietários.

Acostumado a esse modo de vida, Stallman começou a perceber os
contrastes entre aquele ambiente e os lugares que adotavam softwares
repletos de restrições. "Víamos como outras pessoas ficavam perdidas
quando tinham um problema no sistema", conta. "Elas não podiam
mudá-lo. Nós podíamos. Elas eram indefesas. Nós éramos livres." Em
1981, o sonho acabou. O computador usado no laboratório tornou-se
obsoleto – assim como os programas – e os pesquisadores se desuniram
por causa de um projeto.

O programador não sabia o que fazer. "Contemplei a idéia de suicídio,
embora provavelmente não fosse capaz disso", diz. "Então imaginei que
havia uma maneira de contra-atacar, de tentar construir uma nova
comunidade. Foi por isso que dei início ao movimento do software
livre." Ele começou a escrever um sistema operacional, o GNU, e foi
conquistando seguidores. Criou a Free Software Foundation e a GPL,
licença que deve ser usada pelos programas livres. Anos mais tarde, o
GNU se fundiria ao Linux, desenvolvido por Linus Torvalds.

A partir desse momento, a comunidade idealizada por Stallman ganhou
uma enxurrada de adeptos. "Houve um grande incremento de popularidade,
mas isso também nos feriu", destaca. "Várias dessas pessoas nunca
tinham ouvido falar de software livre. Elas amavam o sistema, mas por
razões técnicas. Começamos a ter um monte de trabalho apenas para
informá-los sobre os ideais de liberdade." Preocupavam-se apenas com o
Linux e ignoravam o GNU, que também integrava o sistema. Por isso, até
hoje Stallman tem de reforçar que o termo correto é GNU/Linux em suas
palestras pelo mundo.

A falta de uma preocupação ideológica, aliás, é vista por ele como o
calcanhar-de-aquiles das iniciativas governamentais em defesa do
software livre no Brasil. "O governo brasileiro está fazendo boas
coisas, mas deveria fazer mais", acredita. "Visitei um telecentro no
Rio e ninguém fazia nada para ensinar o público sobre o GNU/Linux ou a
liberdade. Não estão considerando a questão em termos éticos e
sociais. Foram ensinados a pensar sobre os programas de forma prática
e, por inércia, continuam a fazer isso."

Para ele, esses ideais não podem ser deixados de lado porque podem
influenciar a vida das futuras gerações. "Quando os programas não são
livres, o conhecimento que existe em cada aplicativo se torna secreto
para a maior parte da humanidade. Tornando-os livres, você amplia o
conhecimento do homem", ressalta Stallman. "Mas podemos ir muito além
disso. Quanto mais aspectos da vida em sociedade estiverem ligados aos
computadores, a única maneira de manter essas atividades livres e
democráticas é executá-las com softwares livres."




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