Data: 09/08/2004 |
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A imprensa do projeto petista de poder
- Editorial |
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Depois de ter ameaçado revogar o visto de
um jornalista norte-americano só porque publicou no New York Times uma
reportagem desfavorável ao presidente Lula, o governo petista voltou a
reagir de forma antidemocrática ao que classifica como "futricas" da
imprensa, ou seja, as denúncias contra membros do governo, como José
Dirceu no caso Waldomiro e, agora, Henrique Meirelles. Desta vez, a
pretexto de "zelar pela fiel observância dos princípios da ética", propõe
a criação de um Conselho Federal de Jornalismo (CFJ), atribuindo-lhe a
prerrogativa de "orientar, disciplinar e fiscalizar" o exercício da
profissão de jornalista e a atividade jornalística no País.
Elaborado com discrição pelo Ministério do Trabalho e pela Casa
Civil, o que já é uma atitude suspeita, dada a importância dessa matéria
para a plenitude do regime democrático, o projeto enviado ao Congresso é
marcado pelo seu viés centralizador e burocratizante. Entre as
competências que esse Conselho terá, todas apresentadas de modo
preocupantemente vago, uma é "definir as condições para a inscrição,
cancelamento e suspensão da inscrição dos jornalistas, bem como revisão
dos registros existentes" e "deliberar" sobre os pedidos apresentados
pelos jornalistas (art. 2.º, inciso XVI e art. 3.º, inciso 7). Na prática,
isso significa que o CFJ definirá quem estará habilitado a exercer a
profissão.
Outras competências são as de editar um "Código de
Ética", estabelecer procedimentos disciplinares e "supervisionar a
fiscalização" da atividade jornalística (art. 2.º, incisos III, IV e V),
podendo punir as condutas que julgar inadequadas com sanções que vão de
uma simples advertência à "censura" e até à cassação do registro
profissional (art. 7.º). E, como o Conselho também terá a incumbência de
emitir a carteira de trabalho para quem quiser atuar nos meios de
comunicação, na prática ele poderá deter o controle absoluto de uma
atividade em cuja essência estão as liberdades de expressão e de
informação asseguradas pela Constituição no capítulo relativo aos direitos
fundamentais.
É justamente esse o maior perigo do projeto. Só a
ditadura militar ousou tanto na tentativa de intimidar jornalistas e calar
a imprensa. A diferença está na forma utilizada. Enquanto os generais
recorriam à truculência, o governo do PT optou pela sutileza retórica,
valendo-se de um projeto que confunde deliberadamente a auto-regulação de
profissionais liberais, da qual a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é o
exemplo mais conhecido, com a tutela de profissionais assalariados.
Além disso, ao recorrer a um sem-número de lugares-comuns,
abusando do conceito de ética sem em momento algum defini-lo, o projeto dá
ao CFJ o poder de fazer o que quiser, em nome da "valorização" do
jornalismo. A própria exposição de motivos assinada pelo ministro do
Trabalho, Ricardo Berzoini, evidencia esse risco. "A sociedade tem o
direito à informação prestada com qualidade, correção e precisão, baseada
em apuração ética dos fatos", diz o texto.
Diante de tanta
vagueza, como classificar as reportagens sobre os achaques do ex-braço
direito do ministro José Dirceu, Waldomiro Diniz, e sobre os expedientes
aos quais o sr. Delúbio Soares recorre para reforçar o caixa do PT? Na
lógica moralista e punitiva dessa exposição de motivos, esse noticiário
seria "ético" ou "antiético"?
Ainda em matéria de ética, o projeto
também peca por carecer daquilo que quer cobrar da imprensa livre. Em
princípio, o CNJ seria um órgão representativo dos jornalistas e por eles
dirigido. Mas, enquanto jornais, revistas, rádios e tevês privadas vêm
diminuindo o tamanho de suas redações, por razões de sobrevivência
econômica, o governo reinaugurou a Rádio Nacional e vem ampliando o quadro
da Radiobrás e planejando uma TV Pública internacional. Em que medida
essas duas situações opostas não podem desequilibrar a representatividade
do tal Conselho? Até que ponto um órgão dominado por jornalistas do setor
público e a serviço de um partido político não teria, na atribuição de
"disciplinar" o jornalismo, pretexto para interferir nas empresas privadas
de comunicação?
Por tudo isso, e mais a ominosa "coincidência" de
ter sido divulgado no mesmo dia em que veio à luz o projeto do
Audiovisual, o melhor a se fazer com esse projeto do governo, de viés
stalinista, com seus jornais sem redações e sua imprensa alimentada pelas
sinopses aprovadas pelos ditadores de plantão, é jogá-lo no lixo,
impedindo assim mais um perigoso avanço do Projeto de Poder do PT.
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Fonte: O Estado de S. Paulo |
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