Segue abaixo, e-mail recebido pelo Correio das Revista Caros Amigos

 A correspondência abaixo tem dados sobre a profissão de repórter que deviam
ser do conhecimento de todo mundo, mas a própria imprensa trata de
ocultá-los, principalmente quando o assunto envolve a Rede Globo. Vejam o
que aconteceu no caso Tim Lopes (os dois e-mails foram escritos pelo
jornalista Osvaldo Maneschy; o primeiro para a jornalista Daniela Schubnel e
o segundo para o jornalista Cezar Mota):


E-mail escrito no dia 5 de junho (quarta)

Grande Daniela Schubnel, quando li a noticia ontem no DIA, quando folheava o
jornal atrás da sua matéria de anteontem no TSE, aí em Brasília, também
gelei. Sou amigo do Tim há muitos anos, somos contemporâneos de JB, e sempre
tive profunda admiração pelo seu trabalho e pelo seu caráter. Acho que Tim é
o repórter mais perto do povo, do povão, que conheço. Um lutador contra
injustiças e sacanagens, dessas que topamos a todo momento em nossa
profissão que nos obriga a conviver com todo tipo de gente. Gente séria,
gente vigarista, gente do bem, gente do mal. Querendo saber mais do Tim,
ontem à tarde, liguei para Cristina Guimarães, também da TV Globo, que está
afastada da estação por causa da mesma matéria que levou Tim, e ela, a
ganharem o Premio Esso do ano passado: "A Feira das Drogas". Pois fiquei
estarrecido. A ultima vez que estive pessoalmente com Cristina foi no
aeroporto Santos Dumont no embarque de uma dessas várias viagens que tenho
feito a Brasília, a pedido do Brizola, por conta do voto eletrônico. Nos
encontramos no café, em frente ao balcão da Varig. Não via pessoalmente
Cristina desde que a matéria que ela produziu para o "Jornal Nacional", com
o Luiz Carlos Azenha, sobre fraude em urnas eletrônicas - ficou pronta e não
foi ao ar por veto do Evandro Carlos de Andrade. Uma matéria feita a partir
da descoberta de "flash cards" de urnas eletrônicas em Teresópolis. Cristina
me ligou, porque sabia que eu estava enfiado nisso e perguntou se conhecia
alguém que podia fazer uma análise técnica dos flash cards enviados aa TV
Globo. Corri atrás, levei o Amilcar Brunazo Filho e o Benjamin Azevedo,
engenheiros especializados em informática, até a TV Globo. Cristina e Azenha
fizeram as entrevistas, fiquei feliz porque o assunto finalmente chegaria em
grande estilo à opinião pública via JN. Pois não foi daquela vez. Perguntei
no balcão do café do Santos Dumont como estavam as coisas, feliz em revê-la
naquele momento em que estava partindo para acompanhar em Brasília a perícia
nas urnas eletrônicas usadas em Camaçari, na Bahia. Foi quando soube de viva
voz pela própria Cristina Guimarães que, depois de 12 anos na emissora,
estava fora. E numa pior danada, sem trabalhar, se escondendo, vivendo da
ajuda dos amigos e da família. Isso aconteceu agora, no final de março, se
não me engano. Ela explicou a razão disso tudo. Fora ameaçada várias vezes
pelos traficantes da Rocinha por causa da matéria "Feira de Drogas", os
caras descobriram até o número de seu celular e a direção da casa não tomara
nenhuma providência para garantir a sua vida. Depois de reclamar muito, a
única coisa que aconteceu foi tirarem ela do seu dia-a-dia normal, produção
do JN, e a deslocarem para fazer escuta. E mais nada. Ela se sentiu atingida
profissionalmente e pessoalmente. Esperava mais da casa.
Por isso ela caíra fora e entrara com uma ação trabalhista contra a Globo,
onde esteve por 12 anos. Fiquei abismado com a coisa, conversamos mais
alguma coisa enquanto havia tempo e não perguntei qual o avião que ela
estava pegando nem pra onde. Ela me deu força para continuar na luta da urna
eletrônica, falou de sua indignação pela matéria do voto eletrônico ter sido
vetada - fomos em frente, cada um para o seu lado.
Ontem, Schubnel, lendo o que acontecera ao Tim, liguei de novo para
Cristina. Porque me lembrei que ela, na nossa conversa rápida no aeroporto,
tocara no nome do Tim. Que a matéria "Feira das Drogas" fora feita por Tim e
por ela. Ela me contou ontem detalhes das matérias. A primeira delas, foi
Tim que fez, no Complexo do Alemão, em Bonsucesso. Tim esteve lá com uma
micro-câmera, gravou a venda de drogas, editou a matéria, ela foi ao ar no
dia 6 de agosto do ano passado. Tim saiu de férias, saiu de circulação por
uns tempos. A chefe da redação perguntou se ela - Cristina - sabia onde
rolava mais feiras de drogas. Ela disse que sim, então foi escalada para
fazer a próxima cobertura sobre o assunto. Matéria que foi produzida por
ela, Cristina, nos dias 9, 10 e 11 de agosto - durante três visitas que fez
à feira das drogas da Mangueira e três visitas à feira das drogas da
Rocinha. A matéria foi ao ar no JN, em rede nacional, dia 13 de agosto. Um
detalhe: Cristina me contou ontem que não gostaram (os chefes imediatos, que
continuam lá e não escrevo o nome para não expô-los, como Cristina está) das
imagens feitas na Rocinha e mandaram ela fazer de novo. Ela teve que voltar
a feira das drogas para - com a micro-câmera - capturar novas imagens,
sentada na garupa de um motoqueiro - que também continuaram, como Tim,
trabalhando normalmente na emissora, mesmo depois de começarem as ameaças
dos traficantes. Quem é do mar não enjoa. Cristina foi novamente lá, cumpriu
a ordem. Ontem ela comentou comigo, com certeza avaliando tudo o que
aconteceu desde então, mais experiente do que já é: "ser jornalista é uma
coisa, se expor à morte é outra". O superior imediato que a mandou de novo
para a feira da Rocinha, quando a matéria estava sendo feita, foi o mesmo
que pediu a ela para não entrar "nessa onda" quando ela, Cristina, começou a
se sentir ameaçada, especialmente depois que, em outubro, seqüestraram um
colega da TV, o Beto do núcleo do "Esporte Espetacular", a 20 metros da
porta da emissora, na rua Von Martius. Os traficantes, da Rocinha, pegaram o
Beto - como poderiam pegar qualquer outro funcionário da emissora - porque
queriam saber quem fizera a matéria "Feira de Drogas" na Rocinha. Vários
"colegas" deles, filmados, foram identificados pela polícia e presos depois
da matéria ir ao ar. O Beto não sabia de nada, ficou dois dias nas mãos dos
traficantes, eles o liberaram porque se convenceram de que ele não sabia de
nada. Mas continuaram na cola. Cristina ficou sabendo por um "pejoteiro" da
emissora que sua cabeça, a cabeça de quem fez as imagens na Rocinha, estava
a prêmio na favela por 20 mil reais. Ela ficou preocupadíssima com a sua
segurança pessoal. Cristina disse ontem que o que mais a indignou foi o fato
de saber do seqüestro do Beto pela "Folha de São Paulo", porque na emissora
ninguém disse nada a ela. O seqüestro foi no dia 20 de outubro (ela
continuou trabalhando normalmente na emissora depois que voltou de uma
pequena cirurgia feita logo após a matéria ter ido ao ar em agosto), a
"Folha" publicou a matéria sobre o seqüestro no dia 27. Quando começaram as
ameaças pelo seu celular, ela resolveu fazer alguma coisa drástica, já que a
única providência da estação fora colocá-la para trabalhar na escuta.
Resolveu sumir, para preservar a sua vida e no dia 14 de novembro entrou com
uma ação trabalhista contra a Globo. Antes, procurou a Polícia e contou a
sua historia para basear a ação que entrou contra a emissora. Os motoqueiros
que a levaram a Mangueira e a Rocinha, também prestaram depoimento na
polícia no final de outubro de 2001. Hoje Cristina está longe do que mais
gosta - fazer televisão. Continua em paradeiro não sabido para não dar
bobeira, vivendo da ajuda dos amigos e da família. Segundo me disse ontem,
enquanto a sua ação se arrasta na Justiça a passos de cágado, como sempre
acontece. Cristina trabalhou 12 anos na Globo, seis deles de carteira
assinada. No "Fantástico", na Copa de 92, no Globo Repórter - sempre como
prestadora de serviço. E desde que foi para o Jornal Nacional, há seis anos,
estava com carteira assinada. Antes, trabalhou na Edna Savaget, alem de ter
trabalhado na Manchete e na Rede Bandeirantes. Cristina tem 18 anos de
profissão e além de jornalista, já produziu e dirigiu mais de 300
comerciais. Estou falando tudo isso para você, Schubnel, e para vocês todos,
colegas, porque a Cristina hoje está sem trabalho, sem dinheiro, longe dos
amigos e da família - precisando se virar para sobreviver. Tim - o nosso
destemido Tim - seguiu outra direção. Por isso, no domingo passado ele
estava dentro da favela da Vila Cruzeiro, na Zona da Leopoldina, na labuta.
Fazendo o que gosta de fazer - jornalismo. E hoje, quarta-feira, dia 5 de
junho, ninguém sabe dele. Tim desapareceu e a TV Globo está achando que o
pior pode ter acontecido. Prefiro acreditar que ele está bem, vivo, que o
sangue encontrado na tal gruta no alto do morro, não é dele. Não sou de
rezar, mas também estou pedindo pelo Tim - um grande sujeito, um grande
amigo, um grande jornalista. Quero que ele esteja vivo e bem. Mas acho que
só lamentar também não adianta. Nós, jornalistas, temos que fazer mais do
que nos lamentar. Cada um de nós. Temos que fazer mais pelo Tim e pela
Cristina Guimarães do que nos lamentar.

E-mail escrito no dia 8 de junho (sábado)

Cezar, ontem eu contei essa história da Cristina Guimarães que escrevi no
e-mail, ao vivo e a cores, nas escadarias da Cinelândia, numa manifestação
puxada pelo Sindicato dos Jornalistas do Rio, em solidariedade ao Tim -
"Onde está o Tim?". Estavam lá uns 200 ou 250 jornalistas, cheguei um pouco
atrasado, tipo meio dia e trinta, estava marcado para meio-dia, e logo em
seguida falou o Schoreder, o atual chefão geral da Globo que está no lugar
do Evandro Carlos de Andrade. Ele fez um discurso água-com-açúcar do tipo "o
momento é de união", precisamos nos juntar pelo Tim Lopes, etc etc. Lah na
Globo, desde terça (dia 4 de junho), todo mundo sabe que Tim está morto e
seu corpo foi queimado no "microondas" dos traficantes. Os traficas
desfilaram o Tim no morro no domingo à noite (dia 2 de junho) antes de o
espancarem muito - depois que o descobriram com uma micro-câmera dentro da
pochete. E o mataram com crueldade, como fazem sempre. Todo mundo no Alemão,
no domingo, ficou sabendo que os 'homis' tinham pego um repórter da Globo e
matado o cara. Eles não esconderam da comunidade que o cara era um repórter,
e da Globo, e a equipe de plantão na redação, de domingo para a segunda, não
fez absolutamente nada - mesmo depois do motorista do Tim comunicar que ele
não tinha saído do morro, na hora combinada, no domingo. Tipo avisar
imediatamente a polícia, dar uma nota no "Fantástico", sei lá.
Simples bom senso. Parece que os plantonistas nem ligaram para a cúpula no
domingo para que esta, por sua vez, acordasse Secretário, Governador,
Presidente da república, o escambau a quatro. Uma senhora ineficiência,
total. Pelo que soube, a Globo só comunicou à policia que o Tim havia sumido
dentro do morro no final da manhã de segunda-feira. E soh à tarde.
Um descaso com a vida do Tim, na minha suspeita opinião de brizolista.
Dá para compreender que só no final da tarde de segunda é que as pessoas da
maior empresa jornalística do país - nesses dias de tempo real, comunicação
instantânea, e-mail, fax, telefone celular e o cacete a quatro - tenham
oficialmente sabido que Tim estava sumido no morro? E logo qual, Vila
Cruzeiro, que faz parte do Complexo do Alemão - onde Tim, em agosto, fizera
a matéria "Feira das Drogas". Tim nunca deveria ter subido lá
para a matéria do baile funk! Bom, mas a gente conhece o Tim, sabe que por
uma boa matéria ele topa qualquer coisa. Até expor a sua vida do jeito que
expôs, indo na toca do lobo, nessa matéria do baile funk, três vezes. Na
quarta, os caras o pegaram, segundo a "Tribuna da Imprensa", em matéria
anteontem de primeira página, devido a uma denúncia de um PM informante do
tráfico do 16º BPM. Soube que a matéria é quente e verdadeira. Até porque o
chefe de reportagem da "Tribuna",Cezar, é o nosso amigo Antonio José
Libório, o Tomzé da faculdade, que hoje também é - como eu - conselheiro da
ABI. Um cara sério e competente, que não ia botar essa informação de graça,
na primeira página do jornal, se não tivesse certeza de que ela é
verdadeira. Mas jornal algum aqui do Rio, fora a Tribuna, a deu.
Aliás, voltando a inhanha ontem da Cinelândia, o Ali Kamel disse que cabe a
nós, jornalistas, saber exatamente o que aconteceu lá no Alemão - para
localizar o Tim. E disse que a Globo não vai "descansar" enquanto o tráfico
não for varrido e desafiou o tráfico a promover, neste final de semana,
outro baile funk. Muito corajoso - com a pele dos outros. Soube por um amigo
da Globo - que um chefete lá, por conta desses tiros que a bandidagem anda
dando em delegacia aqui no Rio, propôs que uma equipe ficasse de plantão
dentro de uma delegacia para gravar os bandidos atirando na delegacia. E que
os bagrinhos ficaram revoltados porque, já que tinham que gravar, tinham que
ficar na linha de fogo dos caras também!!!! Óbvio!!! E empombaram lá dentro,
fazendo o "iluminado" desistir da "brilhante" idéia.... Numa guerra, botar
os outros na linha de tiro, é mole...
Bom, com essa demora toda da Globo correr atrás da polícia no episódio Tim,
deu mais do que tempo para os safados matarem Tim. Na terça de manhã, li no
DIA que o Tim tinha desaparecido no Alemão, matéria que o JB também
publicou. É bom a gente dar uma checada nisto, porque me parece que eles
quiseram esconder a notícia no primeiro momento - tanto é que só
escancararam o assunto, ou melhor, noticiaram, acho que na terça à noite -
quando não havia mais o que esconder porque o Dia, o JB, etc já tinham
escancarado o desaparecimento.
Lá na Cinelândia, falou também o Cezar Seabra, com quem sempre tive uma
excelente relação pessoal, para dizer em nome dele, imagino, que o momento
era de união, de concórdia, etc etc. Pô, se 200 ou 250 jornalistas, pê da
vida com o que aconteceu, não é momento da gente falar, qual vai ser? Logo
depois o Ali Kamel, hoje um dos graúdos da Globo, pediu a palavra. E
contestou o que eu tinha dito sobre Cristina. Disse que a história da
Cristina Guimarães não era como eu relatara, que a direção da emissora
soubera das ameaças a ela através do comunicado do juiz trabalhista, que ele
nem ninguém na emissora sabia que ela estava sendo ameaçada (portanto, uma
mau caráter por ter recorrido primeiro à justiça, entendi) e que o papel
dela, na matéria "Feira das Drogas" fora pequeno e secundário. Portanto, a
desqualificou. Cara, cheguei a passar mal de indignação. E só não o
interrompi por educação. Ninguém contestou o que ele disse, ficou por isso
mesmo, a manifestação terminou com alguns rezando. Bom, amigo, é isto aí.
Espero que os coleguinhas presentes tenham "filmado" tudo e reportem tudo
direitinho. E avaliem com quem está a razão. Cristina ou Kamel.



Hever Costa Rocha
N.O.C
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