Há um bom tempo já... :(
 
A voz do dono e o dono da voz
Ricardo Noblat

18/03/2003 22h21

Se você só lê jornais editados em Brasília, está mal informado a respeito da
encrenca em que se meteu o governador Joaquim Roriz. E que poderá lhe custar
o mandato. Porque os jornais daqui omitem informações a respeito - e quando
não, reduzem sua gravidade. Tem sido assim desde o começo deste ano.

No último sábado, por exemplo, a revista "Época" circulou com ampla
reportagem sobre cheques do Instituto Candango de Solidariedade que foram
parar nas mãos de um doleiro às vésperas do segundo turno da eleição.
Suspeita-se que o dinheiro pagou despesas de última hora da campanha de
Roriz.

No domingo, o jornal "O Globo" reproduziu a reportagem da "Época". O jornal
"Folha de São Paulo" publicou com destaque no mesmo dia generosa notícia
sobre o mesmo assunto. O "Correio Braziliense" limitou-se a dar uma notinha
de umas 10 linhas. O "Jornal de Brasília" e "A Tribuna do Brasil" nem
notinha deram.

O "Jornal do Brasil" correu atrás do prejuízo e ocupou com a história quase
toda sua segunda página da edição de segunda-feira. É fato que a capa do
caderno do jornal dedicado a Brasília estampou alentada reportagem sobre a
vice de Roriz, Maria de Lourdes Abadia, louvada por trabalhar em média nove
horas por dia.

Mas, o que fazer? Que fazer se a principal fonte da reportagem foi o
porta-voz oficial do governo? Pelo menos o "Jornal do Brasil" deu a notícia
sobre Roriz que os jornais brasilienses ignoraram novamente na edição da
segunda-feira. E tornaram a ignorar na edição de terça-feira. Ignorarão até
quando puderem.

Isso é muito triste. E feio. Em matéria de liberdade de imprensa, Brasília
retrocedeu.
Até quando o "Correio Braziliense" foi um jornal chapa branca, alinhado com
o governo local e com o federal de quebra, o "Jornal de Brasília" fazia o
modelo de jornal mais combativo, menos sujeito aos humores dos poderosos.
Foi assim quando o dirigiram os jornalistas Luiz Gutemberg e André Gustavo
Stumpf.

O "Correio Braziliense" mudou de postura a partir de fevereiro de 1994. E aí
foi a vez, alguns anos depois, de o "Jornal de Brasília" tornar-se o
porta-voz do governo local com o retorno de Roriz ao poder. No final do ano
passado, o "Correio" deu uma forte guinada à direita e reaproximou-se de
quem já fora tão próximo.

Temos, pois, quando se trata de política local, que a população tão exigente
e politizada da capital da República se sujeita hoje a escutar uma única
voz. E temos ainda que o que essa voz emite é naturalmente o que interessa a
seu dono. Rara vez o que não interessa ao dono da voz é dito pela voz do
dono.

Não sei se nada disso pode ter algo a ver com uma nota cifrada publicada em
meados de janeiro último pelo jornalista Paulo Pestana, editor-chefe do
"Jornal de Brasília". Cito de memória o que ele registrou ao pé da carta aos
leitores que publica aos domingos: "Preço da liberdade de imprensa em
Brasília: R$ 18 milhões".

O que Pestana quis dizer com isso?
O Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal deveria perguntar a ele. Ou
qualquer pessoa interessada em decifrar o mistério.

Quanto ao futuro de Roriz... bem, desconfio que ele renunciará ao mandato
para não ser cassado. Nas vizinhanças do Poder Judiciário e em conversas
informais, juízes e advogados não discutem mais se Roriz ficará onde está.
Discutem se Geraldo Magela assumirá o cargo ou se haverá nova eleição no
Distrito Federal.

Responder a