O RISCO GENRO



Alguém já ouviu um marxista ou ex-marxista falar dos crimes do stalinismo? Ou mesmo um petista? Duvido. Quando se referem aos colossais massacres de Stalin, falam em "desvios do comunismo". Isto é, a doutrina era boa, houve apenas um pequeno desvio. Se esse desvio custou 20 milhões de cadáveres, bom, não se faz omelete sem quebrar os ovos. Verdade que o marxismo só produziu ovos quebrados e nada de omelete. "Não estamos falamos de números, falamos de desvios". Quem gostava muito de falar dos desvios era o atual presidente do PT, Tarso Genro. Que, certa vez, em um artigo para o caderno MAIS!, da Folha de São Paulo, em um momento de extraordinária coragem intelectual, comentou a "ventura do stalinismo". Este é o homem que pretende salvar o PT do naufrágio iminente. Pescando em águas turvas, prepara sua candidatura à Presidência da República. Nunca se sabe quem fará o papel de Kerenski no Brasil. Será Lula?

A linhagem marxista do PT está presente na própria linguagem dos petistas. Os crimes eleitorais e financeiros do partido se acumulam a olhos vistos, à medida que as CPIs avançam em suas investigações. Formação de quadrilha, tráfico de influência, compra de deputados, evasão de divisas, sonegação fiscal, lavagem de dinheiro, assassinato. Alguém ouviu algum petista falar em crimes do PT? Nenhum. O máximo que os petistas balbuciam é "erros do PT". Até mesmo o homem mais ético da nação não ousa pronunciar a palavrinha. Crime é coisa de criminosos. Ora, petista algum é criminoso. Logo, erros. Que mais não seja, crime pode dar cadeia. Erro exige, no máximo, desculpas. Mais um pouco e as lideranças petistas sobreviventes estarão qualificando como erro deplorável o assassinato de Celso Daniel.

Vivemos dias de eufemismos. Caixa 2 virou "recursos não contabilizados". Caftina - que a imprensa toda grafou cafetina - é "promotora de eventos". Doleiro é "alocador de recursos no mercado financeiro". Líder comunista, depois da cartilha do Nilmário, virou líder socialista. Esta nova formulação é a súmula de uma longa campanha feita pela imprensa a partir do momento em que a palavra comunista deixou de ser título para virar palavrão. Os países comunistas se associaram na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Estava dado o mote para associar comunismo a socialismo. Como na Europa livre existiam as democracias socialistas, a imprensa assumiu a palavra socialismo para designar tanto os sistemas do Leste como do Oeste. Assim sendo, Olof Palme, Felipe González ou François Mitterrand eram socialistas ao mesmo título que Brejnev, Ceaucescu ou Envers Hodja. Com este sofisma, ficava claro - pelo menos para o Terceiro Mundo desinformado - que o mundo todo rumava ao socialismo.

O cineasta argentino Garcia Videla, que está produzindo no México um filme sobre Trotsky, é mais prudente que Tarso Genro. Jamais ousaria falar em ventura stalinista: "Deve-se evitar que o comunismo e o marxismo se identifiquem com o stalinismo, ou seja, com uma crueldade absoluta e uma destruição total dos princípios humanistas do socialismo". Observe o leitor a falácia do argumento. Primeiro, dissocia stalinismo de comunismo e marxismo, como se Stalin não fosse o grande líder dos comunistas e marxistas do século passado. Segundo, na mesma frase pula para os "princípios humanistas do socialismo", naturalmente identificados com o comunismo e o marxismo. As grandes mentiras morrem sempre devagar.

O último eufemismo a ser empunhado pelos petistas é republicano. As reformas do governo petista não são mais de esquerda. Parece que esta palavra - da mesma forma que suas congêneres, comunismo e socialismo - está sumindo pelo ralo. Salvo engano meu, a nova grife foi enunciada pela primeira vez pelo mago das palavras, Tarso Genro, quando ministro da Educação, anunciou como "democrático e republicano" o projeto de reforma universitária proposto por seu ministério. O governo parece ter gostado do adjetivo e hoje não passa dia sem que algum áulico do Planalto não encha a boca com a palavrinha.

Mas ela parece não ter muito futuro pela frente. Começa associada ao mais colossal esquema de corrupção já denunciado nos países ocidentais. Salvo nos regimes socialistas soviéticos, onde o PC exercia poderes absolutos e a corrupção era norma, não tenho lembrança de uma rede assim abrangente. Na atual Rússia, por exemplo, a corrupção não surpreende ninguém, afinal não faz parte do sistema. É o próprio sistema. E para lá estávamos seguindo, não fosse a denúncia de Roberto Jefferson. Nunca uma nação deveu tanto a um canalha.

Lula, por sua vez, tenta comparar-se aos nomes que um dia ocuparam a Suprema Magistratura da nação. Comparou-se primeiro a Getúlio Vargas e depois a Juscelino Kubitschek. Desastradas comparações. Se tivesse um dia se debruçado sobre algum livro de História do Brasil, saberia que Getúlio derrotou os comunistas na Intentona de 35, quando Stalin enviou seus agentes assessorando Prestes, o assassino de Elza Fernandes, para fazer deste país mais uma republiqueta soviética. Lula, por sua vez, preencheu seu ministério com bolcheviques históricos, criminosos de longa folha corrida, transfigurados em heróis pelo trabalho de desinformação do PT.

Juscelino, como Lula, nasceu pobre. Mas deu-se ao trabalho de estudar e formou-se em Medicina, ao contrário do Supremo Apedeuta, diplomado em demagogia barata nas escolas do sindicalismo. Em verdade, tem algo em comum com Lula. Foi em seu governo que os comunistas, a começar por Niemeyer, começaram a tomar pé em Brasília. Lula evita, por um mecanismo psicológico perfeitamente compreensível, o único paralelo pertinente: sua biografia está, hoje, intimamente ligada à de Fernando Collor de Mello. Hélio Bicudo, um dos vultos históricos do PT, acaba de declarar que Lula "é mestre em esconder a sujeira debaixo do tapete. Sempre agiu dessa forma". Se sempre agiu assim, Bicudo sabia disto desde sempre. Por que só conta agora, quando o Líder Máximo de seu partido está naufragando? Tivesse nos contado antes, nos teria poupado este desastre nacional.

Falei em Kerenski. Para ilustração dos mais jovens, Aleksandr Kerenski foi o chefe do Governo Provisório, instalado em julho de 1917 na Rússia, que precedeu a tomada definitiva do poder por Lênin e Trotsky, em novembro do mesmo ano. Quando evoca-se Kerenski, quer-se sinalizar a instalação próximo de uma ditadura comunista. A bem da verdade - e discordando de muitos articulistas deste jornal - não consigo ver esta ameaça pela frente. O Brasil de hoje não admitiria médicos ou professores universitários ganhando 15 dólares por mês, nem médicas ou engenheiras tendo de vender o próprio corpo para arredondar as contas de fim de mês.

Ditadura aos moldes soviéticos, não acredito. Mas as ditaduras têm muitas faces. Quem está pintando como candidato a tiranete é o atual presidente do PT, cuja primeira proposta ao tomar posse do cargo foi a de que todos os ministros a ele prestassem contas de seus atos. Seria o caso de perguntar-se para que serve então o presidente da República. Tarso Genro tem ambições presidenciais e está aplainando o campo para sua candidatura. Pelo que saibamos, jamais repudiou a "ventura stalinista". Há quem tema, em caso de impeachment, um governo de Severino. Ora, Severino é um simplório "coroné" nordestino, sem preparo algum para gerir o que quer que seja, muito menos uma ditadura.

Não é o caso de Tarso, o último stalinista impenitente a tentar estancar a sangria de um partido que nasceu totalitário e ora agoniza num mar de lama. Como neste país basta um marqueteiro de talento para fazer um presidente, o risco existe.

- Enviado por Janer @ 12:12 AM

Sexta-feira, Agosto 19, 2005


INTOLERÂNCIA NO ORKUT:
PROIBIDO CRITICAR VERISSIMO
Elson:
For Dummies 19/8/2005 11:49
Vocês resolveram transformar essa comunidade num palanque político. Vocês e essa obsessão contra o PT. Ótimo, reclamem, pintem a cara, vão às ruas, fora Lulla. Mas não aqui. Vocês estão na comunidade errada. Essa comunidade NÃO É sobre política. Essa comunidade NÃO É sobre o PT. E essa comunidade NÃO É sobre o Lula. Vocês estão na comunidade errada. O Janer recebeu uma lista de comunidades totalmente dedicadas à adoração ao PT, e fingiu que não viu. Aqui não é palanque. Vocês estão na comunidade errada. Desculpem, mas mais "for dummies" que isso eu não consigo. O próximo passo é eu desenhar pra vocês entenderem. Enfim, Janer, George e Paulo: o próximo post de vocês bosteando sobre política vocês vão ser expulsos. Considerem-se avisados.

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Janer

Vai ser muito engraçado 19/8/2005 14:17
Falar de Verissimo, um dos grandes responsáveis pela ascensão do Sumo Analfabeto ao poder, sem falar do PT, é como falar do Vaticano sem mencionar o papa. Esta ameaça de expulsão só demonstra que este fórum é um ninho de petistas enrustidos. Este método é absolutamente petista. Quem discorda vai pra rua, como o Tarso Venceslau, a Heloísa Helena e o Babá.Aliás, é uma atitude típica do Verissimo, que já mandou pra rua da Zero Hora um jornalista que fez críticas a seu pai. Tudo muito coerente. Receberei a expulsão como um título de nobreza. Será a primeira manifestação de intolerância no Orkut. Só acho que o fórum vai virar um samba do crioulo doido. Nele permanecerão contestações a um interlocutor fantasma. Vai ser muito engraçado.


- Enviado por Janer @ 5:52 PM

Segunda-feira, Agosto 15, 2005


VÁ EM FRENTE, COMPANHEIRO!
Desde há muito sustento que boa parte dos ilustres líderes da História são pobres diabos que apenas se sustentam em ficções grandiosas ou pretensamente grandiosas. A ficção do nazismo fez de um pintor frustrado um dos mais poderosos senhores da guerra do século passado, que em uma dezena de anos mudou a geografia da Europa e ameaçou o planeta todo. Chamava-se Adolf Schikelgruber Hitler e, para infelicidade da Europa, faltou quem lhe jogasse um ovo podre quando jovem ativista. Este ovo providencial talvez poupasse a humanidade da Segunda Guerra. Mas nunca foi jogado. Schikelgruber foi, sem dúvida alguma, o homem mais amado em vida neste planeta. Apesar de ter matado milhões de seres humanos, sua verve fascinou toda uma nação. A se ver o olhar extasiado com que os alemães o contemplavam, sua derrota e seu suicídio terá provocado mares de lágrimas. .

Joseph Vissarionovitch Djugatchivili, medíocre ex-seminarista georgiano, mais conhecido por Stalin, deu continuidade aos massacres de Lênin, o que contabilizou, no total, 20 milhões de mortos. Escorado pelos sublimes ideais do socialismo, sua morte gerou um mar de lágrimas não só na União Soviética como no mundo todo. Isso sem falar dos que nela não acreditavam, afinal um deus não pode morrer. Sua morte provocou lágrimas tanto em Moscou como Porto Alegre, tanto em Paris como Berlim. Como dizia Jean Rostand, "quem mata um é assassino, quem mata milhões é conquistador e quem mata todos é Deus". O culto ao grande assassino era tal que foi reverenciado como o Paizinho dos Povos.

No Brasil, cujas ambições não são desmedidas, um pequeno ditador mereceu as lágrimas de sul a norte do país, Getúlio Vargas. Lágrimas sobraram até para um êmulo menor do caudilho, Leonel Brizola. Enfim, todo homem público tem suas hostes de crentes, e o rio de lágrimas gerado por sua morte sempre transborda além das margens dos familiares e dos mais próximos. Nesta última e lacrimosa semana, sobraram lágrimas até mesmo para o líder comunista Miguel Arrais, mais um dos que lutaram para transformar o país em uma imensa Cuba meridional. (Ou alguém pretende que o Partido Socialista Brasileiro - PSB - postulasse algum tipo de social-democracia?). Que seus familiares o chorem, entende-se. O que não se entende é que líderes de todos os partidos, alguns deles presidenciáveis, assumissem o papel de carpideiras ante o cadáver do velho bolche. Transfigurador, o poder da morte. A imprensa toda, em um eufemismo unânime, transformou o comunista em "líder socialista". Os coleguinhas de jornais parecem ter assumido a cartilha politicamente correta do Nilmário, na qual a palavra comunista virou palavrão.

Mais difícil é entender por quem e por que choram a cântaros os marmanjos do PT no Congresso, ao tomar conhecimento do que todo mundo - menos eles - conheciam. O PT é sujo desde suas origens. Surge no Brasil como santuário para os derrotados do século. E surge como mentira, a partir do próprio nome. Substituiu a palavra proletário - tão cara às doutrinas assassinas que lhe serviram de base - por trabalhador. Ora, esta palavra tem uma conotação de trabalho braçal, mas quem apostou mesmo no PT foram os trabalhadores intelectuais, os acadêmicos e universitários, as comunidades eclesiais de base, o funcionalismo público e uma classe média penitente, eivada de mauvaise conscience em virtude de seu parco bem-estar. O único operário que restou para bandeira do PT foi Lula.

Operário mas não muito. Aposentou-se malandramente aos 42 anos, através do obsceno instituto da aposentadoria especial para anistiados políticos, que premiou todos os comunistas e similares que conspiraram contra a própria pátria. Passou cerca de duas décadas sem trabalhar, remunerado como apparatchik do PT, único partido do país a remunerar militantes profissionais. Claro que, investido de tão nobres funções, Lula não poderia viver como um reles operário. Comprou então, em circunstâncias jamais esclarecidas, uma cobertura em São Bernardo do Campo. A imprensa denunciou o fato, mas foi leniente. Em um país onde é normal locupletar-se com dinheiro público, cobertura a mais cobertura a menos não constitui jaça na trajetória de um líder de esquerda. O que seria um impedimento a qualquer candidatura, foi transformado em um pecadilho perfeitamente perdoável.

A campanha de Lula rumo à Presidência começa com um assassinato, o do prefeito Celso Daniel. A imprensa denunciou o fato, mas o PT conseguiu caracterizar o crime como comum, e não político. Em um país onde o crime comum é normal, mais cadáver menos cadáver não iria afetar a ascensão do homem mais ético do país. Verdade que na esteira de Celso Daniel vieram mais seis cadáveres. Mas que são sete cadáveres quando está em jogo um projeto de salvação nacional? Detalhes históricos, nada mais que detalhes.

Com o ego inflado por sua condição de estrela de um partido burguês, oriundo de uma intelectuália marxistóide burguesa, Lula não se deu sequer ao luxo de educar-se. Sedento de poder, dispensou até mesmo uma experiência administrativa mínima nalguma prefeitura, para ao menos entender uma folha de pagamento. Passou diretamente do ócio remunerado e do analfabetismo funcional à suprema magistratura da Nação. Ora, macieira não dá pêssego. Que poderia esperar-se de um malandro sem escrúpulos, que passou a vida toda papagueando palavras que sequer entendia e só ambicionava o poder, senão uma versão branca de Idi Amin Dada, o bronco e ridículo ditador ugandês dos anos 70? Brasil pode não ser África, mas chegamos lá. Em pleno século XXI, com pretensões de nação moderna, o Brasil passou a ser presidido pela figura exótica do Supremo Apedeuta. Lula subiu ao poder montado em uma ficção, a obsoleta ficção marxista de que cabe ao proletariado redimir a humanidade. Poderosas, as ficções.

Por quem choram as tardias madalenas no Congresso? Pela morte política de Lula não há de ser, afinal o arbítrio e a arrogância do homem mais ético do país gerou ressentimentos e divisões irremediáveis no partido. Pela morte de um sonho, tampouco. O sonho já morrera em 89, com a queda do Muro. Que mais não fosse, recebeu atestado de óbito dois anos mais tarde, com a dissolução da União Soviética. O PT, herdeiro da tradição bolchevique, não tinha muito futuro pela frente. (Observe-se a sutileza de elefante em uma loja de cristais dos petistas: sua facção predominante adotou o nome de Campo Majoritário. Majoritário é a tradução ao português de bolchevique. Os mencheviques foram para o PSOL). Era apenas a sobrevida do sonho, somente o tempo que levaram as ondas concêntricas da queda do Muro para chegar a este Brasil, tão distanciado física e culturalmente dos centros de decisão do planeta.

Se os petistas sonharam algum dia em ressuscitar a utopia soviética na América Latina, eram crianças ingênuas que ainda criam no dogma marxista de que a História rumava ao comunismo, dogma que a própria História mandou para sua lata de lixo nos estertores do século passado. Por que choram as madalenas? A meu ver, por uma única razão: sabiam que suas lágrimas seriam televisionadas e que a transmissão das CPIs tem ibopes de novelas. Terá algum petista chorado sozinho, frente ao espelho, na privacidade de seu lar? Terá chorado o choro de verdade, aquele que ocorre na intimidade e no silêncio? Duvido. Lágrimas sem televisão não redimem nem rendem votos.

Em meio a isso, o homem mais ético do país faz um paralelo que não deixa de suscitar esperanças. Compara-se a Getúlio Vargas. Vá em frente, companheiro! Até o fim. Seria a única maneira de escapar com certa elegância a um julgamento de seus contemporâneos. Poderia acabar seus dias com a aura de mártir, e não com a pecha de oportunista que já lhe adere à pele. Enganaria os pósteros por mais alguns anos, mas não mais que isso. Enganaria até que as águas do lago da História baixassem e os homens do futuro pudessem ver com isenção este triste período da vida política do Brasil.

Mas essa esperança não consigo alimentar. Suicídio é gesto de homens que têm fibra e nunca perderam a vergonha. O que não é o caso de nosso inglório personagem.

- Enviado por Janer @ 5:23 PM

Terça-feira, Agosto 09, 2005


SONHO DE MARX RENASCE



No século XIX, um fantasma rondava a Europa. Era um fantasma etéreo, teórico e vago, e de início só denotava o ódio de um alemão ao conceito de Europa. Ocorre que o fantasma, brandindo o cetro das utopias, catalizou os ressentidos do mundo todo e tomou corpo, dominando um terço do planeta. Como geralmente ocorre com fantasmas, está sumindo do imaginário das gentes. Não sem antes fazer cem milhões de mortos. Fantasmas, ainda que feitos de pura névoa, podem ser letais.

Milhões de fantasmas rondam a Europa do século XXI. Não são mais aqueles fantasmas antigos, ectoplasmáticos, sem consistência física. Mas fantasmas de carne e osso, mais osso do que carne. Estão cercando o velho continente por todos os lados, não se importam em morrer na tentativa de aportar em suas praias, e se multiplicam como cogumelos após a chuva. São os pobres diabos da África, Índia, China, América Latina, massacrados pela fome, pela miséria, salários infames, por guerras tribais, genocídios e ditaduras, impelidos pelo humano desejo de encontrar um lugar ao sol. São seres diferenciados de seus compariotas. Têm a coragem de largar tudo, família, filhos, eventuais posses e arriscam a vida em barcaças caindo aos pedaços, containeres sem ventilação, tentando atravessar rios, mares e desertos.

Não poucos morrem. Entre os que não morrem, boa parte vai para cárceres temporários para depois serem deportados. Uma minoria privilegiada encontra alguma fórmula de permanecer no país desejado e depois de muitas peripécias, encontram - ou não encontram - seu lugar ao sol. Por muitas décadas, foi conveniente aos europeus receber estes "deserdados da terra", para usarmos uma expressão tão cara às esquerdas. Todas as nações exigem milhares de trabalhadores braçais, e quem pode dar-se ao luxo de um trabalho intelectual é que não vai aceitar o braçal. Países como Suécia, Inglaterra, Alemanha, França estimularam efusivamente a vinda de mão-de-obra do Terceiro Mundo. Era barata e não muito exigente. Os migrantes buscavam uma só coisa: trabalho. Uma relação simbiótica se estabelecia então entre o Ocidente desenvolvido e o Terceiro Mundo faminto. Os ocidentais pagavam barato pela execução de trabalhos que lhes repugnava executar e os famintos recebiam salários de sonho, se comparados aos vinténs - ou aos nenhuns vinténs - que recebiam em seus países de origem. E os governos ocidentais cuidavam de controlar o fluxo migratório, para não provocar desequilíbrio no mercado de trabalho.

Assim foi, pelo menos até meados do século passado. Ao mesmo tempo em que a miséria decorrente do descontrole da natalidade se expandia no Terceiro Mundo, notícias das maravilhas do Ocidente inundavam o universo dos famintos. Não víamos, nos anos 60 ou 70, manchetes sobre migrantes morrendo em pateras no Estreito de Gibraltar nem naufragando em barcaças caindo aos pedaços no Mediterrâneo, nem morrendo sufocados em furgões tentando entrar na Europa. Hoje, é manchete quase todo mês. Uma imprensa que foi dominada pelos marxistas o século todo, criou uma singular mentalidade, a de que todos os "damnés de la terre" - como disse Frantz Fanon - têm direito à Europa ou aos Estados Unidos. E que europeus e americanos têm o sagrado dever de dar casa, roupa, comida, salário, educação, saúde e bom futuro a essa multidão de infelizes, cujos governos, em geral corruptos e ditatoriais, se negam a dar. Curioso observar que, para o mundo socialista - que se jactava de ser solidário com todos os povos do mundo - para lá ninguém queria migrar.

Criou-se então um novo tipo de migrante. Se o migrante dos anos 60 ou 70 vinha em busca de trabalho, o atual migrante chega exigindo seus direitos. Mais ainda: exige o direito de ficar no país escolhido sem cumprir as mínimas exigências legais para nele ficar. Surgiu um novo tipo de personagem na imprensa internacional, os sem-papéis. Ignorando os sistemas jurídicos dos países em que aportam, insistem em neles permanecer, ao arrepio das leis locais. Curiosamente, estas legiões de pessoas em situação ilegal, logo encontraram grupos de apoio nos países que invadem. São em geral católicos e viúvas do marxismo, abrigados sob a nobre designação de defensores dos Direitos Humanos. Defendem abertamente a ilegalidade e posam como humanistas ao defendê-la. Este desvairio teve sua expressão máxima no último Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre (Brasil), quando um de seus organizadores, Luiz Bassegio - ligado à Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) - pregou a migração livre no mundo todo.

Para Bassegio, as pessoas de todo o mundo poderiam migrar para onde quisessem e ter os mesmos direitos. "O neoliberalismo exige dos pobres a retirada de qualquer tipo de empecilho para o livre fluxo de capitais. Mas impõe barreiras terríveis para a migração de pessoas". O neo-utópico esqueceu que capitais não precisam ser alimentados, vestidos, tratados medicamente, dispensam residência e não ocupam território. Os capitais, quando se reproduzem, só trazem benefícios aos países por onde passam.

O que está longe de ser o caso dos migrantes que, conscientes de que o baixo ventre é uma poderosa arma de fixação de território, se reproduzem como coelhos. Com taxas de natalidade próximas de um filho por casal, a população autóctone de cada país europeu reduz-se à metade a cada geração. Os muçulmanos sabem disso e cada árabe que reproduz de cinco a dez filhos é uma poderosa quinta-coluna infiltrada em solo europeu. Se a adaga, a alfanje e a lança se revelaram impotentes para conquistar a Europa em séculos passados, o ventre e a defesa das diversidades culturais estão se revelando armas imbatíveis para a reconquista do continente.

Além do mais, os capitais não trazem nas costas crendices religiosas obsoletas que, em nome do tal de respeito às diferenças culturais, entram em conflito direto com as legislações locais. Aceita pelas nações a proposta de Basssegio, a África toda se mudaria, do dia para a noite, para a Europa. Isso sem falar das populações mais pobres da Índia, China, Leste europeu e mesmo América Latina. A Europa toda, que ainda tenta controlar a imigração, está lutando hoje contra costumes bárbaros que os africanos, negros ou árabes, portam em suas mochilas: o crime de honra, a infibulação e ablação do clitóris, o rosto escondido por véus, a submissão da mulher ao macho. Imagine o leitor o nível de barbárie a que retornaria a Europa, se cada imigrante nela pudesse ingressar, sem passaporte nem visto de entrada, e com suas práticas criminosas a tiracolo.

Esta idéia de uma tolerância universal inclusive a práticas tidas como criminosas pelos sistemas de direito de cada país nada tem de novo. No século XVI, chamava-se irenismo, definido então como uma atitude pacificadora entre os cristãos de diversas confissões. No século XVII, Leibniz foi um de seus grandes defensores. Mas se a Europa, que nasce sob o signo da cruz, conseguiu entender-se e unir-se, qualquer entendimento é inviável com os sistemas teocráticos erigidos sob o signo do crescente.

A Europa está assediada por migrantes de todos azimutes. Mas a ameaça maior são as legiões árabes. Cidadãos oriundos de sociedades teocráticas, não conseguem conceber uma sociedade regida senão por preceitos divinos. Bons fiéis de Alá, não aceitam deixar o entulho islâmico em casa e querem impô-lo ao novo lar. Trazem nas costas práticas que as leis locais proíbe? As leis dos infiéis não importam. Só importa o Islã.

Com os recentes atentados em Londres e ameaças a Roma e demais capitais européias, criou-se uma nova mentalidade: a Europa será destruída pelo terror. Ora, terror mata, provoca barulho e sofrimentos, cria um clima de medo, mas terror não consegue destruir um Estado organizado. Bin Laden fez desmoronar duas torres em Nova York. E daí? Os Estados Unidos continuam existindo, os novaiorquinos retomaram seu trem de vida. Quanto a bin Laden, provavelmente já está morto. Mas não interesse de ninguém, nem dos americanos, nem dos árabes, em anunciar sua morte. Seu fantasma rende mais para ambos os lados que sua morte.

O que afundará a Europa será a lei do baixo ventre, a natalidade como arma. Se Marx um dia sonhou com uma Europa socialista, este sonho morreu. O que está para realizar-se é o sonho manifesto no ódio de Marx à Europa, na primeira frase do Manifesto, a destruição de uma cultura.

Você ainda não conhece a Europa? Vá antes que seja tarde.

- Enviado por Janer @ 10:50 AM

Segunda-feira, Agosto 01, 2005


DITADURA DO PT ABORTA


Tenho 58 anos. Ouço prantos de viúvas por onde quer que me vire. São as viúvas do PT, que vêem os ícones de seu partido atolados até o pescoço no lamaçal do mensalão. Algumas viúvas são de minha idade, outras mais velhas e a grande maioria mais novas. Que um jovem, em seus dezoito anos, tenha votado no PT nas últimas eleições, entendo. "Com quem faremos a revolução? - perguntava-se um personagem de Robert Arlt, em Os Lança-Chamas. "Com os jovens - respondia - são estúpidos e entusiastas".

Que jovens tenham votado no PT, é natural. Nada conhecem de história, não leram os livros que deveriam ter lido, principalmente porque estes livros foram devidamente recusados pelos editores brasileiros. Um jovem de 18 anos não conhece a árvore genealógica do PT. Para ele 64 é data de um passado distante, 35 pertence à pré-história e 17 deve ter ocorrido logo após o Big Bang. Mas que um cidadão de minha idade, um pouco menos ou pouco mais velho que eu, tenha um dia depositado confiança num partido constituído por marxistas, comunistas soviéticos ou maoístas, trotskistas, polpotistas ou castristas, isso sem falar nos cultores de Envers Hodja ou Nicolae Ceaucescu, é vergonha que pede aos céus punição.

O partido dito dos trabalhadores já demonstra sua arrogância no próprio nome. Só seus membros são trabalhadores. Os membros dos demais partidos, por exclusão, serão burgueses, capitalistas, imperialistas, exploradores do povo, enfim, tudo menos trabalhadores. Ninguém parece ter notado que, embalando o neném recém-nascido em 1980, estavam seus progenitores: intelectuais uspianos e da PUC, a ala esquerda da Igreja Católica, os sedizentes teólogos da libertação e mais uma malta de teóricos urbanos que de operário só queriam distância. Lula, ao ver um cavalo encilhado passando frente a seu rancho, nele montou sem hesitar um segundo.

O marxismo transformara o operário em um salvador da humanidade, um Cristo proletário, e Moscou era a Nova Jerusalém. Os intelectuais celerados que conceberam o PT souberam explorar durante o século passado todo esta mística e conseguiram encontrar um operário para entronizar como Messias, Luís Ignácio Lula da Silva. Filho de uma cópula espúria entre padres e acadêmicos, o metalúrgico dava legitimidade ao Partido dos Operários. Se quisermos situar os fatores de subdesenvolvimento mental do Brasil, vamos encontrá-los na Igreja Católica e na universidade.

Antes mesmo de o PT existir, eu escrevia contra o PT. Explico. Durante os anos 70, em minhas crônicas diárias na extinta Folha da Manhã, de Porto Alegre, eu escrevia sobre companheiros de geração que hoje são ilustres próceres do partido governante. Pelo menos dois atuais ministros foram meus colegas de faculdade. (Sobre Tarso Hertz Genro - do qual publiquei seus primeiros poemas no Diário de Notícias - o que escrevi contra daria uma pequena antologia). Eram em geral marxistas, maoístas, trotskistas e não foi surpresa reencontrá-los no PT, que só nasce em 1980. Quando vi o tipo de gente que o novo partido reunia, só pude deduzir que eram os velhos bolcheviques e compagnons de route com outro rótulo. O socialismo soviético já começava a esboroar-se no mundo todo, mas renascia neste país incrível com nome novo.

Em uma das crônicas que escrevi na época, dizia ter lido um texto de Tarso e não ter entendido. Que, no entanto, lia Platão e conseguia entender tudo. Devia ser, deduzi então, porque Platão era Platão e Tarso era Genro. Semana passada, um político conferiu razão à minha crônica de três décadas atrás. "Ganha um mensalão quem entender um texto de Tarso Genro", - disse este senhor cujo nome me escapa. Tarso, doublé de judeu e maoísta, pelo que eu saiba jamais negou seu maoísmo. Este advogado resvaladiço, que esconde atrás de frases dúbias sua vocação totalitária, surge agora como esperança de um PT autêntico, como se autênticos petistas não fossem salafrários como Zé Dirceu, Genoíno, Delúbio et caterva. A imprensa toda parece ter esquecido que Tarso era o vice de Olívio Dutra, quando este era prefeito de Porto Alegre. Dutra foi eleito governador financiado pelo jogo do bicho. Ou jogo do bicho não contamina companheiros de partido e antigos vices de chapa?

Ora, naqueles anos, alguém de minha idade, só podia ser comunista por duas motivações: falta de informação ou desejo de poder. Falta de informação os teóricos petistas não tinham. Eram em geral universitários, viajavam e liam muito e uma das modas da época eram os círculos de leitura de Marx. O must da idade era ler Marx no original, para bem interpretrar o "Velho". Mas a affaire Kravchenko - que pusera uma pá de cal na política soviética - ocorrera em 49. E depois de 49 não mais era permissível a um intelectual bem informado ser marxista. Logo, os revolucionários tupiniquins tinham perfeita consciência do que se passava no mundo socialista. Mas confiavam na ignorância generalizada do brasileiro médio para conquistar o poder, empunhando uma doutrina totalitária que ainda tinha - para o grande público desinformado - laivos de humanismo.

A aposta deu certo. Desde há muito afirmo que os grandes derrotados na Revolução de 64 foram os militares. Impediram a emergência de uma republiqueta socialista no Brasil e hoje passam por vilões. Os velhos bolches são tratados - e aposentados - como heróis. Conseguiram inclusive criar um novo tipo de herói, insólito na História, o herói regiamente subsidiado pelos cofres públicos. Herói inclusive retroativo: as gordas aposentadorias retroagiram décadas. Os velhos bolches aprenderam que, em um país das dimensões territoriais do Brasil, a conquista pela armas era inviável. Adotaram então uma estratégia mais sutil, a do Partido Revolucionário Mexicano, que instituiu uma ditadura travestida de democracia, cujo instrumento não era o fuzil, mas o dinheiro.

A ditadura do PRI teve a mesma duração da ditadura soviética, sete décadas. O PT estava implantando serenamente a sua, sem que a maioria inculta que constituí este país percebesse. Foi quando surgiu um estraga-prazeres que, ao embolsar míseros três mil reais, jogou a responsabilidade toda da corrupção no colo de um deputado corrupto. O deputado, ao que tudo indica, detestava a solidão. E partilhou sua corrupção com o Congresso todo. A corrente depende de seu elo mais fraco, como diria Mao Tse Tung, o guru do atual presidente do PT. E o belo projeto de ditadura do PT, que Zé Dirceu já estimava modestamente em doze anos, veio por águas abaixo.

Que um jovem, nas últimas eleições, tenha se enganado com o PT, entende-se - repito. Que cidadãos de 60 ou 70 anos tenham apoiado esse rebotalho do pior que o século XIX produziu, é mais difícil de entender-se. Ou eram canalhas que tinham perfeita consciência do que faziam e desta ação esperavam privilégios ou dividendos. Ou analfabetos em termos de História, como o presidente que elegeram.

Não há terceira hipótese.

- Enviado por Janer @ 10:14 PM

Quinta-feira, Julho 28, 2005


QUANDO MALA É DIZ-QUE-DIZ-QUE



"Estamos vivendo uma crise política. É um tal de diz-que-diz-que, eu não sei como vocês estão se sentindo. Eu me sinto indignado" - disse o Supremeo Apedeuta da Nação em discurso em Bagé. E repetiu: "Me sinto indignado".

Malas cheias de reais e dólares voam pelo Brasil - e certamente para muito além do Brasil -, os cheques da corrupção se cruzam na contabilidade dos bancos, as provas do mensalão se acumulam, e o indigitado, digo, indignado presidente fala em diz-que-diz-ques. Sente-se indignado, mas fez tudo o que podia para impedir a CPI do mensalão. Como a pressão da imprensa e da opinião pública se impuseram, teve de engolir a CPI de cabo a rabo e agora inclusive se jacta de tê-la desejado.

Poderosos, esses diz-que-diz-ques. Já derrubaram a Eminência Parda de seu governo, mais uma dezena de ministros, isso sem falar nos altos próceres do sedizente Partido dos Trabalhadores. "Eu não faço julgamento precipitado" - continuou Lula -. "Eu, da mesma forma que sou contra a pena de morte, sou contra a condenação a priori de qualquer pessoa".

Mas bastaram quatro palavrinhas de Roberto Jefferson - sem prova alguma de nada - para mandar passear o ministro mais forte de seu gabinete. Perdoai-o, Senhor, ele não tem a mínima noção do que diz.

- Enviado por Janer @ 11:14 AM

Domingo, Julho 24, 2005


VOTO COMPRADO VALE?
"El que vendrá, bueno te hará" - diz um sinistro provérbio espanhol. Quantos leitores ainda lembram da affaire Collor? E do PC Farias - convenientemente assassinado como convenientemente assassinado foi Celso Daniel? O que muitos esquecem é que PC Farias jamais enfiou a mão no bolso de contribuintes. Extorquia dinheiro de empresários. Até aí, estamos no ramo da economia informal. Se o dono de meu boteco me vende uma cerveja a 50 reais e eu os pago, se não pagar com dinheiro público não houve corrupção. Houve babaquice de minha parte ou a esperança de alguma vantagem escusa. É uma transação entre um bobo e um espertalhão, ou entre dois espertalhões cada um julgando que desse negócio irá auferir alguma vantagem. Um empresário - ou um cliente de bar - pode aceitar ou recusar uma extorsão. O contribuinte não pode. Sua grana é extorquida na fonte.

O governo petista esnobou as negociações no campo privado e enfiou fundo a mão no bolso do contribuinte, sem pudor algum ou piedade. Roubou bilhões do Erário. Ora, quem alimenta o Erário é o contribuinte. Mas quem tem as chaves do cofre é o governo. A cada dia que passa, ouço em mesas de bar, leio em cartas aos jornais, manifestações de saudades dos dias de Collor. O assassinato de PC Farias foi o ponto final de um processo de corrupção. Era preciso calar quem sabia demais. O assassinato de Celso Daniel foi o chute inicial de um projeto de roubalheira. Era preciso calar quem se dispunha a atrapalhar o jogo. É bom ainda lembrar que, na esteira da morte de Celso Daniel, já foram assassinadas seis outras pessoas com alguma vinculação com o crime. Se o governo de Collor terminou com um assassinato, o de Lula começou com sete. E ninguém parece ver isto.

Há duas semanas, uma novela paulistana quase roubou o Ibope das produções do Planalto. Foi a intervenção da Polícia Federal na Daslu, a mais suntuosa loja de supérfluos do país e talvez da América Latina. Shopping preferido de onze entre dez novos ricos paulistanos, que se julgam muito sofisticados pagando cinco ou sete mil reais por trapos comprados a 15 dólares. Vestes com grifes européias, provavelmente confeccionadas por chineses ou vietnamitas em regime de semi-escravidão, pois esta é a mão-de-obra que desde há décadas constitui o suporte da moda européia.

Eliane Tranchesi, proprietária da Daslu, foi acusada de sonegação fiscal e importação fraudulenta. Que sofra as conseqüências legais destes crimes seria o normal em um país decente. Mas enquanto a empresária e seus sócios eram levados para a prisão em uma operação quase bélica, o contrabando, a pirataria e a evasão de divisas correm soltos na Santa Ifigênia ou na 25 de Março, imensas feiras de contravenção a céu aberto. É como se, para combater a desigualdade social, fosse permissível aos pobres transgredir a lei e se proibisse os ricos de fazer o mesmo. Duas ou três vezes por ano, para mostrar serviço, a polícia faz uma razzia nestas ruas, invade duas centenas de apartamentos utilizados como depósito de contrabando e apreende quarenta ou cinqüenta caminhões de muamba. Dia seguinte, o contrabando e a pirataria voltam à rotina. A apreensão de quarenta caminhões de mercadorias não faz sequer mossa no mercado.

Contrabandear, piratear, sonegar podem constituir crimes para os legisladores. Mas para o povo e mesmo para as elites, já passou a constituir uma espécie de direito adquirido. Que me perdoem os tributaristas, mas esta mentalidade não deixa de ter sólidos fundamentos. Por que não sonegar? Para alimentar malas de dinheiros empunhadas por deputados e altos funcionários do governo, no melhor estilo das máfias italiana ou americana? Nos dias em que vivemos, eu diria que sonegar é obrigação cívica. Pelo menos faz mermar o botim destinado a nossos nobres representantes no Congresso e seus sequazes.

"Quando a gente começa a mentir, não pára mais" - disse o presidente da República, em admirável confissão de autoconhecimento. Como diria Agripino Grieco, é a chispa da ferradura quando bate na calçada. Lula começou sua carreira mentindo. Pois o PT, desde o berço, sempre foi uma grande mentira. No fundo, um lobo bolchevique travestido de cordeirinho social-democrata. Lula elegeu-se presidente mentindo, a tal ponto que eleitores e até mesmo os inocentes cordeirinhos sociais-democratas cobram hoje suas mentiras.

Evidentemente, não pode mais parar de mentir. Sua última fanfarronada é a de um ego maior que o próprio Brasil: "Entre os 180 milhões de brasileiros, não há homem ou mulher que tenha moral para me dar lições de ética" - jactou-se Lula na última sexta-feira. Como garante de sua suposta ética, dá o aval de seus progenitores: "Sou filho de pai e mãe analfabetos". E continua seguindo fielmente a tradição - temos de acrescentar. "O único legado que me deixaram é andar de cabeça erguida. Não vai ser a elite brasileira que vai me fazer baixar a cabeça".

Estranha lógica. Como se ter pai e mãe analfabetos fosse título ou motivo de orgulho, ou atestado de honestidade. Como se pudesse ostentar ética um presidente cujo filho recebe de mãos beijadas cinco milhões de reais de uma empresa de telefonia, só porque é filho do dito pai. (Aliás, o Fabinho também pode orgulhar-se de ser bem sucedido, apesar de ter um pai analfabeto). Como se pudesse arrotar ética um presidente que combina uma entrevista de mentirinha em Paris, para afirmar: "o que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente". Ou seja, corrupção faz parte da vida.

Sempre que encurralado, Lula empunha como um mantra sua condição de nordestino nascido na pobreza. Pobre, mas voa alto quando sonha. Uma vez eleito, tratou imediatamente de consumar uma birra inarredável: comprar, para seus turismos inúteis, um avião digno de um sultão do Brunei, ao custo de 56,7 milhões de dólares. E para não macular seu caráter sem jaça, fez o que nem o sultão do Brunei faria: pagou-o antecipadamente.

Ironicamente, entre os 180 milhões de brasileiros, o homem com moral para dar-lhe lições de ética estava ali a seu lado, no Planalto mesmo. Era Roberto Jefferson, deputado venal e réu confesso de um colossal esquema de corrupção. Quando cabe a um deputado venal e réu confesso dar aulas de moralidade ao país, as reservas éticas da nação há muito estão no vermelho.

Quem fará Lula baixar a cabeça não será a tal de elite brasileira - como se deter o poder supremo do país não caracterizasse elite - pois esta elite está nadando em felicidade com os juros mais altos do mundo e os mirabolantes lucros das entidades financeiras. Quem fará o Supremo Apedeuta baixar a cabeça será seu próprio partido. As esquerdas, ao perceber que pelas armas não dominariam o país, apelaram a método mais sutil e eficaz: projetaram tomar o poder pela corrupção. É método mais ameno, já testado e aprovado no México pelo PRI, que não exige o árduo e complicado manejo de armas, nem o desconforto da selva ou da clandestinidade. Nem produz guerrilheiros de três tapas, como José Genoíno: um para falar e dois para calar a boca.

O PT foi com demasiada sede ao pote e chegou até mesmo a usurpar da oposição o dever de fazer oposição. Quem hoje faz oposição ao governo é o próprio partido do governo. À oposição, basta esperar de braços cruzados o desvendamento do saque voraz aos cofres públicos. Não foi nenhum político de oposição que ordenou "Sai rápido daí, Zé!". Foi Roberto Jefferson, presidente de partido aliado do PT. Sua ordem não admitiu tergiversações. Não passaram 48 horas e o Zé se esvanecia como fumaça ao vento. Bastaram quatro palavrinhas para demitir a Eminência Parda do governo. É óbvio que atrás das quatro palavrinhas havia uma mensagem cifrada, cujo sentido, a nós, pobres mortais, não foi dado entender. Só o presidente e seu todo-poderoso ministro o captaram. E o captaram rapidinho.

Políticos começam a balbuciar timidamente a palavra impeachment, mas sem muito entusiasmo. Melhor ver um Lula rastejando em 2006 que jogá-lo agora ao ostracismo. Fala-se em cassar dez ou quinze deputados. Em verdade, deveria ser destituído o Congresso todo. Quando Roberto Jefferson declarou, alto e bom som, que nenhum dos deputados ou senadores presentes declarava corretamente seus gastos de campanhas - "inclusive eu", apressou-se a acrescentar - fez-se um silêncio sepulcral no plenário. Para reforçar sua denúncia, Jefferson apalpou uma maleta, onde estavam as declarações dos gastos eleitorais de cada deputado. Um silêncio divino perpassou o recinto do Congresso Nacional. Foi como se um anjo tivesse passado pelas galerias do sofisticado lupanar.

Como o silêncio também foi garantido aos operosos operadores da corrupção. O Supremo Tribunal Federal, liderado pelo sempre coerente Nelson Jobim (o Meritíssimo sempre está com o poder, esteja o poder com quem estiver) autorizou os depoentes a mentir sem risco nenhum de prisão. O que Lula e o PT não conseguiram - sabotar a CPI - o STF autorizou. Que se pode esperar de uma investigação, quando os investigados levam no bolso um habeas corpus que os autoriza a calar, sonegar informações e mesmo mentir? Habeas turpitudinis, melhor diríamos.

Começam agora a fazer sentido certos movimentos estranhos em Brasília. Por quatro vezes, os congressistas rejeitaram a taxação dos aposentados e pensionistas, por considerá-la afrontosa a princípios jurídicos como o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Mas a carne é fraca. Na quinta vez, o Congresso não resistiu e inclusive obteve do mandalete gaúcho instalado no STF a autorização definitiva para implantar a taxação da velharada indefesa.

Considera-se que pelo menos uma centena de deputados foram comprados. É um punhado considerável de prostitutas, capaz de virar qualquer votação. Pergunta que nenhum jornal ainda fez: voto comprado vale? Venalidade pode criar legislação? Pode derrubar cláusulas pétreas e extinguir direitos adquiridos? Se cassados estes deputados, não seria o caso de cassar também seus votos passados?

Esta é a pergunta que deve ser feita, a meu ver, aos ministros das supremas cortes. Se é que, humanos sendo, ainda não se renderam às tentações do mensalão.
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