Ressalte-se a intelgência dos argumentos, embora não concorde com o mérito

Conforme

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SÚMULA VINCULANTE 

Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP, Diretor-Presidente do IELF – Instituto de Ensino Jurídico (www.ielf.com.br) e autor do curso de DP pela internet (www.iusnet.com.br).  

      Acha-se em debate nesta semana no Senado Federal a Reforma do Judiciário. Mais precisamente, devem os Senadores votar o relatório final do Sen. Bernardo Cabral (relator do projeto). Muitos são os temas polêmicos. Mas dentre eles tem notoriedade incontestável a questão da súmula vinculante.  

      Durante o exame dos destaques às emendas de Plenário oferecidas à reforma do Judiciário, o instrumento da súmula vinculante, que obriga as instâncias inferiores a seguirem as decisões dos tribunais superiores, foi alvo de elogios e críticas dos membros da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).  

      Os senadores Francelino Pereira (PFL-MG) e Amir Lando (PMDB-RO) defenderam esse mecanismo como meio de dar celeridade à Justiça, apoiando, assim, o entendimento sobre o assunto contido no parecer do senador Bernardo Cabral (PFL-AM).  

      A CCJ acabou mantendo a decisão de Cabral de rejeitar emenda do senador José Fogaça (PPS-RS), que propunha a súmula impeditiva de recurso, destinada a permitir a revisão da decisão alcançada pela súmula vinculante. Os senadores José Eduardo Dutra (PT-SE) e Roberto Freire (PPS-PE) apoiaram essa emenda por entender que a proposta seguia o caminho da “evolução do Direito”. 

      Até o momento, a Reforma só admite Súmula Vinculante a ser emitida pelo STF. Outros Tribunais Superiores (como STJ) querem também dispor do mesmo mecanismo.  

      A inconstitucionalidade da súmula vinculante é evidente (cf. Gomes, L. Flávio, A dimensão da magistratura no Estado de Direito, São Paulo, RT, 1997, p. 202 e ss.). Toda interpretação, dada por um Tribunal a uma lei ordinária, por mais sábia que seja, jamais pode vincular os juízes das instâncias inferiores, que devem julgar com absoluta e total independência. A súmula vinculante viola a independência jurídica do juiz, isto é, sua independência interna (dentro da e frente à própria instituição a que pertence).  

      Ninguém pode impor ao juiz qualquer orientação sobre qual deve ser a interpretação mais correta. Aliás, é muito comum que um texto legal, pela sua literalidade confusa, permita mais de uma interpretação. De todas, deve prevalecer a que mais se coaduna com os princípios constitucionais (sobretudo o da razoabilidade). Mas o juiz sempre tem a liberdade de escolha, dentre todas as interpretações possíveis.  

      O instituto da súmula vinculante pertence à velha (e ultrapassada) metodologia do Direito, que era visto como um sistema jurídico coeso, compacto e seguro. Esse modelo de Direito (e de metodologia), típico de Estados autoritários, não levava em conta duas coisas: (a) a pluralidade de pensamento dentro do Estado de Direito; (b) a justiça do caso concreto. Preocupava mais a beleza do palácio do Direito (sua lógica interna), que a justiça do caso concreto. 

      A nova metodologia do Direito está voltada para o caso concreto. Estão perdendo valor as generalizações, o silogismo, os juízos dedutivos etc. O Direito neste princípio de milênio já não tem preocupação com a padronização (burocrática) da programação jurídica ou da sua aplicação, senão a justiça de cada caso.  Importa mais não a programação da norma, senão o âmbito de incidência concreta dela. 

      A súmula vinculante é instrumento do Direito do segundo milênio. Não serve para guiar a Justiça do terceiro milênio. Institutos da era analógica não são úteis para a Justiça da era digital. É um atraso e grave retrocesso. Faz parte de uma ética tendencialmente autoritária, de uma sociedade militarizada, hierarquizada. A justiça de cada caso concreto não se obtém com métodos de cima para baixo. O contrário é que é o verdadeiro. O saber sistemático (generalizador) está dando lugar para o saber problemático (cada caso é um caso). Por isso é que devemos nos posicionar contra ela.

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