Gripe suína: "Vamos todos morrer" (Lições de 1976)<http://scienceblogs.com.br/100nexos/2009/05/gripe_suina_vamos_todos_morrer.php>
Assista ao vídeo<http://scienceblogs.com.br/100nexos/2009/05/gripe_suina_vamos_todos_morrer.php><http://scienceblogs.com.br/100nexos/medicina/> *Atenção*: foi confirmado que um recruta do exército americano de apenas 19 anos, *David Lewis*, faleceu menos de 24 horas depois de sentir-se cansado e fraco. Pior, ele não se sentia gravemente doente - não achou necessário procurar os médicos ou deixar de participar de um exercício. A rapidez com que padeceu é assustadora, e a causa da morte foi confirmada como a *gripe suína*. Outros membros da tropa também foram contaminados e adoeceram. *Detalhe*: Isso ocorreu em *fevereiro de 1976*, há mais de trinta anos, quando irrompeu um surto de gripe suína nos EUA. O episódio é extremamente relevante nesta iminência da pandemia de gripe A(H1N1), e o tenebroso comercial que você confere acima é bem real, parte de uma das primeiras incursões de governos na televisão para a conscientização de um problema urgente de saúde pública. Hoje vemos claramente, um tanto questionável. Mas propagandas de terror não foram o pior que ocorreu então. Como é o tema da própria propaganda televisiva, em 1976 o então presidente americano *Gerald Ford* determinou a vacinação em massa de toda a população como forma de conter a doença, temendo que "o vírus de 1918 houvesse retornado". É uma decisão discutida até hoje, porque ao final, *a única morte devido à gripe suína no surto de 1976 foi a do recruta Lewis*. Por outro lado, *pelo menos 25 pessoas faleceram por complicações causadas pela própria vacina*. Apenas 200 pessoas foram infectadas, sendo Lewis a única vítima fatal, mas dos 40 milhões de americanos vacinados (o programa foi interrompido), 25 faleceram devido a uma síndrome provocada pela vacina. Dito simplesmente, a vacina matou mais do que a doença. Leia mais na Folha: *EUA viveram surto de gripe suína em 1976; vacina gerou mortes*<http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u558040.shtml> . Antes de jurar nunca tomar uma vacina ou evitar todas as recomendações do governo, no entanto, tome alguns minutos para conhecer ou lembrar um pouco melhor o que ocorreu há trinta anos e como isso é relevante hoje. De volta ao futuro Voltemos a 2009. Nos próximos meses, há fortes indicações que a pandemia de gripe suína estará estabelecida, e vacinas devem ser disponibilizadas. A OMS fará recomendações e governos discutirão quais, se e como aplicá-las em grande escala em seus países, o que ainda deve depender de quão grave realmente é o vírus com que nos deparamos. E, com certeza, ouviremos falar muito mais sobre o episódio de 1976. Considerando como hoje mesmo vacinas de segurança e eficácia estabelecidas ainda são evitadas por pessoas que acreditam que seriam apenas conspirações malignas da indústria farmacêutica, a polêmica atual de usar ou não máscaras ou viajar ou não é apenas um anúncio do que está por vir. Ou melhor, se repetir. Mesmo em 1976 o programa de vacinação americano, até então sem precedentes e até hoje um dos maiores já promovidos, foi assolado por muitos problemas e discussões. Não pretendo me antecipar muito à discussão que deve vir; ela deve ser muito positiva e contará com dados mais completos dos que dispomos agora, bem como será promovida por figuras bem mais qualificadas que o autor que escreve aqui. Mas desde já dispomos de alguns dados, e este autor pode oferecer algum comentário que talvez seja útil. Antes de mais nada, nesta que já é uma pandemia mais do que anunciada já houve mais de uma morte confirmada. No momento em que escrevo, 3 de maio, segundo a OMS <http://www.who.int/csr/disease/swineflu/en/index.html> já teríamos 17 mortes entre +600 infectados confirmados em todo o mundo. Isto é, há pouca dúvida de que a situação hoje é comprovadamente mais grave e preocupante do que o surto de 1976 nos EUA. E então, a questão que pode valer milhões de vidas (ou não): a decisão de vacinar toda a população americana foi um erro? Em retrospecto, é evidente que foi, mas aqui está o que penso ser a lição mais importante de todas. No contexto da situação, embora até hoje a questão seja discutida, pode-se argumentar que apesar de ultimamente errada, a decisão fora acertada. Confuso? Bem, acompanhe o pronunciamento feito pelo presidente Ford na época: "Fui aconselhado de que há uma possibilidade muito real de que, a menos que tomemos medidas contrárias efetivas, poderá haver uma epidemia desta perigosa doença no próximo outono e inverno aqui nos Estados Unidos. Deixe-me declarar claramente neste momento: *Ninguém sabe exatamente quão séria esta ameaça pode ser. Ainda assim, não podemos apostar com a saúde de nossa nação*. Desta forma, anuncio hoje as seguintes ações ... a produção de vacina suficiente para inocular todo homem, mulher e criança nos Estados Unidos..." Se o governo iria errar, erraria pelo excesso de precaução. Como depois se constatou, de fato a vacinação fora desnecessária e a medida um erro, mas foi a "*ação errada pelos motivos certos*". Trinta anos depois é fácil condenar a decisão de Gerald Ford e as agências governamentais que o aconselharam, mas apenas porque *tendemos a superestimar nossa capacidade de adivinhar algo depois que este algo já ocorreu*<http://scienceblogs.com.br/100nexos/2009/03/mas_isso_eu_ja_sabia.php> . Mesmo considerando 25 mortes, fato é que 40 milhões de pessoas foram vacinadas na campanha de 1976. É mais provável morrer atingido por um raio, e muito mais provável morrer por uma gripe comum do que por causa de uma vacina, mesmo uma vacina como a aplicada então. As vacinas antigripais de hoje são ainda mais seguras. No momento, nos vemos na mesma situação onde "ninguém sabe quão séria esta [ *nova*] ameaça pode ser". E, como em 1976, poucos devem discordar que "não podemos apostar com a saúde de nossa nação". Embora isto não seja motivo para abraçar qualquer medida drástica, como exterminar porcos, e se decidir movido pelo pânico *nunca* deve ser positivo em *nenhuma* situação, torçamos e tomemos ações para que daqui a trinta anos possamos olhar para trás e dizer que se erramos, erramos pelo excesso de precaução, pela sorte de lidar com um vírus menos perigoso do que o temido. Mais uma pandemia O outro cenário de erro ao lidar com o surgimento de uma nova pandemia é um que de certa forma já ocorreu. Como *William Brandon* da Universidade da Carolina do Norte nota<http://politicsandthelifesciences.org/Contents/Contents-2001-3/PLS2001-3-085.pdf>(PDF), poucos anos depois do "fiasco" da vacinação de 1976 uma nova questão de saúde pública foi descoberta. Em 1981 o Centro de Controle de Doenças dos EUA publicava o primeiro estudo liago ao que depois seria conhecido como * AIDS*. "Se o episódio da gripe suína foi um caso de exagero face a uma doença infecciosa, a AIDS tem sido um registro lamentável de parálise ideológica e má-vontade federal em agir efetivamente", conclui Brandon. A AIDS, é preciso notar, já é uma pandemia há décadas. Assim como a malária, tuberculose e cólera, desde tempos antigos. Falar constantemente da pandemia de gripe de 1918 e esquecer das pandemias muito atuais não faz muito sentido. O paralelo com a AIDS é talvez mais relevante por ser esta uma pandemia que emergiu recentemente, de como as vítimas parecem se concentrar em populações carentes e como os remédios efetivos no tratamento da doença têm um custo considerável. Também serve como referência: a AIDS não aniquilou a humanidade apesar de ainda não existir uma vacina, muito menos cura, e tratamentos mais eficazes terem levado mais de uma década para serem desenvolvidos. É sob quase todos os aspectos muito mais assustadora do que as previsões mais apocalípticas sobre a gripe suína. Há razão para histeria por causa da AIDS? Ressaltando, nunca houve nem nunca deve haver razão para histeria, em nenhuma situação. Sempre há sim motivo para cautela com relação à saúde pública. O medo se espalha mais rápido que o vírus, devemos fazer com que a informação também. Informação que leve do simples medo à devida cautela. - - - *Leia mais* - O que você precisa saber sobre a gripe suína<http://scienceblogs.com.br/rainha/2009/04/o_que_voce_precisa_saber_sobre.php>; - EUA viveram surto de gripe suína em 1976; vacina gerou mortes<http://scienceblogs.com.br/rainha/2009/04/o_que_voce_precisa_saber_sobre.php> - Vírus, ciências e homens<http://http//www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-59702003000200016&script=sci_arttext&tlng=pt>- Resenha que inclui um breve comentário sobre o episódio de 1976; - 1976: Fear of a great plague <http://www.capitalcentury.com/1976.html>; - In the Age of Bioterrorism, an Affair to Remember: The Silver Anniversary of the Swine Flu Epidemic That Never Was<http://politicsandthelifesciences.org/Contents/Contents-2001-3/PLS2001-3-085.pdf>(PDF). Mantenha-se informado *no portal do Ministério da Saúde*<http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/area.cfm?id_area=1534>e acompanhe *a cobertura feita pelo ScienceBlogs Brasil* <http://scienceblogs.com.br/>. [As partes desta mensagem que não continham texto foram removidas]