Um artigo interessante
FSP 16/10
" O homem da Bear Sterns cantou a
pedra
ELIO GASPARI
O pensamento único está sempre condenado a ficar burro. O pensamento burro
está condenado a cair na superstição e o pensamento supersticioso está condenado
a ser desmascarado. E assim vai contada em poucas palavras a história da
sabedoria da ekipekonômica do tucanato.
Arruinaram o país e olham para a
choldra com um ar superior, sugerindo que ou ela não sabe votar, ou o candidato
que ela parece estar prestes a escolher ainda não entendeu como funcionam "os
mercados". Um consolo para Lula: os sábios dos "mercados" ainda não disseram
dele metade do que já disseram de José Serra.
A alta dos juros para 21% ao
ano foi apresentada como algo inevitável, quase benfazejo. Quem tem dinheiro
ganha sem trabalhar. Quem não tem pelo menos deve aplaudir, do contrário passa
por duro e burro. Esses juros lunares vão derrubar a economia, aumentar o
desemprego e, sem dúvida, comprometerão o primeiro semestre de gestão econômica
do próximo governo. Mesmo assim, não havia nada melhor à mão. Mesmo admitindo
que essa turma esteja certa, a sua maneira de pensar não é a única.
Aqui vão
algumas opiniões de David Malpass, economista-chefe da casa Bear Sterns, de Nova
York. (Conta a lenda que, no tempo do dólar de R$ 1,20, foi a Bear Sterns quem
colocou, de brincadeira, uma Bentley com chofer a serviço de uma personalidade
brasileira a quem desejava agradar.)
Em junho passado, quando se festejava o
empréstimo-salvador do FMI, Malpass advertia, num artigo no "Wall Street
Journal": "É difícil entender como um programa econômico assentado numa taxa de
juros de 18% possa funcionar".
Quando os sábios da ekipekonômica começavam a
por em circulação a teoria do "risco Lula", Malpass denunciava sua falsidade.
Dizia que se dava o contrário: anos seguidos de juros altos e moeda fraca
geraram um "problema de crescimento" que explicava a popularidade do candidato.
Lembrava que a renda per capita dos brasileiros estava em US$ 3.100, contra US$
3.200 em 1990.
Para Malpass, o Brasil só sai da crise se crescer. Sem
crescer, não sai. Quando "os mercados" festejavam os US$ 10 bilhões do FMI, ele
dizia que "juros altos, a incerteza cambial e o peso da dívida servirão apenas
para manter as baixas taxas de crescimento, não importa quem venha a ser eleito.
O crescimento débil agravará o problema da divida, criando um círculo vicioso".
Ele previa uma rachadura no estratagema para depois da eleição. Aconteceu antes.
Chegou-se a outubro com o real valendo menos e os juros valendo mais.
Isso
com os dois candidatos a presidente dizendo que vão aumentar as exportações,
respeitando os acordos com o FMI. Malpass lembra que o Brasil terá que disputar
mercados e investimentos com China, México, Coréia e Taiwan, países com moedas
estáveis, juros baixos, dívida controlada e "livres da má orientação econômica
do FMI".
Malpass terminou seu artigo com um parágrafo que deveria ser
incorporado à versão 1.0.2 da "Carta ao Povo Brasileiro" de Lula:
"Os Estados
Unidos se orgulham de ter um dólar forte e estável, juros baixos e carga
tributária declinante. Esses conceitos são vitais para criação de um clima
atraente aos investimentos e ao crescimento econômico. Diante da estrutura da
dívida brasileira e da urgência de sua crise, eles são particularmente adequados
para o país. Com o FMI injetando dinheiro no Brasil para demonstrar o seu apoio,
o que se deveria encorajar era estabilidade cambial e crescimento, não
austeridade".