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URNA ELETRÔNIA: uns
tantos políticos bem intencionados e alguns moços espertos
tentaram mexer no que está quieto e dá
certo | |
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O Congresso aprovou na semana
passada um projeto polêmico. Terminada a eleição do ano passado, o
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) avaliou todos os procedimentos, produziu
um volumoso relatório sobre o que funcionou e não funcionou e sugeriu aos
parlamentares, pois o assunto é da alçada deles, que aposentassem a idéia
de as urnas eletrônicas terem, obrigatoriamente, de exibir ao eleitor o
registro em papel do voto dado na máquina eletrônica.
A experiência a partir do uso parcial desse mecanismo mostrou, nas
eleições de 2002, para presidente, governador, senador, deputados
estaduais, federais e distritais, que o registro do voto em papel serviu
para... nada. Ou melhor: atendia apenas a mentes como a do ex-governador
Leonel Brizola (PDT-RJ), que transformou a defesa do registro em papel em
uma espécie de cruzada do fim dos tempos democráticos. O ex-governador e
uns quantos lobistas de empresas que fabricam módulos impressos de votos
em papel gostam de dramatizar as possibilidades de fraude eleitoral e, não
raro, são pegos dizendo que os hackers podem invadir as urnas
eletrônicas.
Não podem. A urna eletrônica não funciona em rede com nada. É um
aparelho esperto e burro ao mesmo tempo. Liga-se uma urna eletrônica a uma
tomada tal qual um aparelho eletrodoméstico. Exatamente como se liga um
liquidificador na tomada da cozinha. A diferença é que o liquidificador é
usado para bater suco ou a fazer papinha do bebê, e a urna serve para
armazenar e contabilizar votos. Essa maravilha esperta é apenas uma
máquina burra de somar. O único jeito de engravidá-la com algo além do seu
voto – quando ela funciona – é adulterando o disquete que é aberto e
carregado na hora em que começa a votação. A operação é checada e
executada na frente de todos os fiscais de partidos e candidatos.
Quando a urna não funciona, ou por falta de energia, ou porque sofreu
alguma pane e fica mecanicamente travada, não há como insistir. O jeito é
passar para o voto de papel, o preferido do doutor Brizola. A urna é do
tipo binário: funciona ou não funciona. Se funcionou, coletou os votos e
os totalizou, retira-se o disquete e faz-se o BU (Boletim de Urna) –
pronto, está aí o papel que o senhor tanto queria, doutor Brizola! Os
dados do disquete são transmitidos para a central de processamento de
todos os votos, nos TREs, que os repassa ao TSE.
Alguém pode interferir na transmissão? Pode. E para quê? Se o disquete
recolheu os votos, estão registrados e casam com o BU e o mapa da zona
eleitoral, que diabo pode ser feito de interferência na transmissão que
pode ser desmentido pelo disquete e pelo BU? Pelo menos à prova de fraude
burra ela é!
Assim sendo, e porque o tal do registro experimental, em 2002, serviu
apenas para nada, o Congresso acabou com a inutilidade. Para falar a
verdade, nas eleições passadas, o módulo de registro do voto em papel,
acoplado à urna eletrônica, teve uma única serventia: anular milhares de
votos. Havia um procedimento ligeiramente diferente do voto em urna
eletrônica e sem impressora, o que levou a um índice de votos nulos e
brancos muito maior do que nas urnas com registro de papel. Em muitas
zonas eleitorais, os rolos de papel para imprimir o voto também travaram.
As urnas experimentais de 2002 revelaram-se um pesadelo e uma
desnecessidade.
Em nome da lisura do processo democrático, justifica-se que a sociedade
queira mais e mais aperfeiçoamentos na urna eletrônica. A segurança da
urna, se é que ela pode ser muito mais segura, molda a cara de confiança
com que o eleitor vota e molda o valor de um sufrágio que é pilar da
democracia representativa. Mas nada disso é parte constitutiva da idéia de
ter uma impressora ao lado da urna eletrônica para registrar um voto que
ninguém pode carregar no bolso.
E chegamos à pergunta: nesse caso, por que tanta grita cercando a
aprovação do fim do registro do voto impresso? Simples: porque foi armado
um monumental lobby para a compra de impressoras de votos, uma comprinha
de cerca de R$ 400 milhões para equipar as urnas eletrônicas existentes. E
porque havia também a idéia de embutir no projeto a obrigação de que um
órgão certificador de softwares, ligado à Casa Civil, ficasse encarregado
de certificar o soft de cada uma das urnas a serviço da eleição.
Um órgão ligado à Casa Civil? Como assim?! Na reeleição de Lula, as
urnas poderiam vir a ser certificadas pela Casa Civil, por um órgão
certificador que existe desde o governo FHC e nunca ninguém se lembrou de
levar a certificação para lá.
E quanto custaria essa certificação?
Ninguém fez as contas, mas, nos corredores do Congresso, falava-se de uma
soma da ordem de bilhão. Foi-se a inutilidade da impressora e foram-se os
lobbies espúrios. E mataram-se algumas falsas ingenuidades compradas por
jornalistas nem tão ingênuos assim.