Veja a
carta que um juiz colocou no jornal de 23/01/2004
Carta do
Juiz Ruy Coppola publicada no Estadão.
Mensagem
ao presidente!
Estimado
presidente, assisti na televisão, anteontem, o trecho de seu discurso criticando
o Poder Judiciário e dizendo que V. Exa. e seu amigo Márcio, ministro da
Justiça, há muito tempo são favoráveis ao controle externo do Poder Judiciário,
não para "meter a mão na decisão do juiz", mas para abrir a "caixa-preta" do
Poder. Vi também V.Exa. falar sobre "duas Justiças" e sobre a influência do
dinheiro nas decisões da Justiça. Fiquei abismado, caro presidente, não com a
falta de conhecimento de V.Exa., já que coisa diversa não poderia esperar (só
pelo fato de que o nobre presidente é leigo), mas com o fato de que o nobre
presidente ainda não se tenha dado conta de que não é mais candidato. Não
precisa mais falar como se em palanque estivesse; não precisa mais fazer cara de
inconformado, alterando o tom da voz para influir no ânimo da platéia. Afinal,
não é sempre que se faz discurso na porta da Volks. Não precisa mais chorar. O
eminente presidente precisa apenas mandar, o que não fez até agora. Não existem
duas Justiças, como V. Exa. falou. Existe uma só. Que é cega, mas não surda e
costuma escutar as besteiras que muitos falam sobre ela. Basta ao presidente
mandar seu amigo Márcio tomar medidas concretas e efetivas contra o crime
organizado. Mandar seus demais ministros exercer os cargos para os quais foram
nomeados.Mandar seus líderes partidários fazer menos conchavos e começar a
legislar em favor da sociedade. Afinal, V. Exa. foi eleito para isso. Logo
depois, sr. presidente, no mesmo canal de televisão, assisti a uma reportagem
dando conta de que, em Pernambuco (sua terra natal), crianças que haviam
abandonado o lixão, por receberem R$ 25,00 do Bolsa-Escola, tinham voltado para
aquela vida (??) insólita, simplesmente porque desde janeiro seu governo não re
passou o dinheiro destinado ao Bolsa-Escola. E a Benedita, sr. presidente? Disse
ela que ficou sabendo dos fatos apenas no dia da reportagem. Como se pode ver,
sr. presidente, vou tentar lembrá-lo de algumas coisas simples. Nós, do Poder
Judiciário, não temos caixa-preta. Temos leis inconsistentes e brandas (que seu
amigo Márcio sempre utilizou para inocentar pessoas acusadas de crimes do
colarinho-branco). Temos de conviver com a Fazenda Pública (e o sr.presidente é
responsável por ela, caso não saiba), sendo nossa maior cliente e litigante, na
maioria dos casos, de má-fé. Temos os precatórios que não são pagos. Temos
acidentados que não recebem benefícios em dia (o INSS é de sua
responsabilidade,
sr.presidente).Não temos medo algum de qualquer controle externo, sr.
presidente. Temos medo, sim, de que pessoas menos avisadas, como V. Exa. mostrou
ser, confundam controle externo com atividade jurisdicional (pergunte ao seu
amigo Márcio, ele explica o que é). De qualquer forma, não é bom falar de corda
em casa de enforcado. Evidente que V. Exa. usou da expressão "caixa-preta" não
no sentido pejorativo do termo. Juízes não tomam vinho de R$ 4 mil a garrafa.
Juízes não são agradados com vinhos portugueses raros quando vão a restaurantes.
Juízes, quando fazem churrasco, não mandam vir churrasqueiro de outro Estado.
Mulheres de juízes não possuem condições financeiras para importar cabeleireiros
de outras unidades da Federação, apenas para fazer uma "escova". Cachorros
de
juízes
não andam de carro oficial. Caixa-preta por caixa-preta (no sentido meramente
figurativo), sr. presidente, a do Poder Executivo é bem maior do que a nossa.
Meus respeitos a V. Exa. e recomendaões ao seu amigo Márcio. P.S.: D lembranças
a "Michelle". (Michelle é cachorrinha do Presidente que passeia em carro
oficial)
Ruy
Coppola , juiz do 2.º Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, São
Paulo
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