O limite esgotou há muito tempo. 

Carlos Antônio.

Repassando:

LIMITE DE TOLERÂNCIA
(Luciano Pires)

Anos atrás participei do lançamento de um produto para o mercado de autopeças. 
Era um conjunto satélite-planetária para os caminhões Mercedes Benz, composto 
por engrenagens sofisticadas que funcionam dentro do eixo diferencial. Não 
demorou para começarmos a receber reclamações de campo. Nosso conjunto era 
"duro". Os mecânicos montavam e ele não girava com a mão, ficando travado. 
Fomos sondar com os engenheiros da fábrica e veio a explicação: limite de 
tolerância. 
Toda engrenagem sai da linha de produção dentro de limites máximos e mínimos de 
dimensões. É coisa de fração de milímetros. Essa variação é chamada de 
"tolerância". Qualquer peça dentro do limite de tolerância é considerada 
"normal". Acontece que, quando você acopla duas engrenagens produzidas nas 
dimensões máximas do limite da tolerância, o conjunto fica muito apertado. Fica 
"duro". O oposto também é verdadeiro, com o conjunto ficando "mole". No 
entanto, dimensionalmente está tudo correto. 
O lance da tragédia da TAM me parece igual: as peças individuais estavam dentro 
dos limites de tolerância. O reversor desativado estava no limite da 
tolerância, a pista curta estava no limite da tolerância, a falta de ranhuras 
estava no limite da tolerância, a chuva estava no limite da tolerância, a 
quantidade de passageiros dentro do avião estava no limite da tolerância, a 
área de escape estava no limite da tolerância. Resultado da mistura dos limites 
de tolerância: tragédia. 
No entanto, os técnicos continuam dizendo que tudo estava dentro do "normal". 
Aquela história de que o "livro da Airbus diz que o reversor pode ficar inativo 
por até dez dias", é inesquecível.
Dizem que também foi assim com o fatídico buraco do Metrô, também em São Paulo: 
tudo certinho, dentro dos limites de tolerância. Desabou. 
Nestes nossos dias de tecnologia quântica combinada com gerenciamento capenga, 
parece que jamais conseguimos ter a visão do todo. Cumprimos o que "o livro" 
diz, fazendo nossa parte, satisfeitos por estar dentro da normalidade. No 
limite da tolerância... 
Igualzinho ao gerente de finanças que corta todas as despesas "supérfluas", 
mesmo que destrua reputações, processos e relacionamentos. O resultado é um 
desastre, mas o papel dele foi cumprido à risca... Igualzinho ao arquiteto que 
projeta um banheiro sem janelas. O resultado é um horror, mas o banheiro ficou 
lindo! Igualzinho ao advogado burocrata que cria dezenas de procedimentos e 
pareceres, liquidando com a capacidade de ação. O resultado para quem quer 
fazer acontecer é terrível, mas o advogado cumpriu a função dele direitinho. 
Igualzinho ao executivo que serve barrinhas de cereais no serviço de bordo. O 
serviço é horrível, mas a redução de custos é ótima. Igualzinho ao juiz que 
manda soltar o criminoso, cumprindo sua função de seguir à risca uma legislação 
torta. Igualzinho a autoridade que cria normas impedindo que os maus alunos 
sejam reprovados. O resultado é desastroso para a sociedade, mas ela cumpriu 
seu dever: nunca antes neste país tivemos um nível tão alto de aprovação 
escolar...
E você deve conhecer mais dezenas de exemplos da aplicação do "limite de 
tolerância", não é? Pois sabe o que é mais louco? É que a maioria absoluta dos 
que agem no "limite da tolerância" é composta de gente honesta, esforçada, bem 
intencionada até. Gente que é premiada por exercer suas funções direitinho, 
reduzindo os custos até os limites que o livro determina. 
Enquanto nossos medíocres dirigentes, executivos e catedráticos olharem apenas 
para os componentes, sem olhar para o sistema, sem entender as relações de 
causa e efeito entre os limites de tolerância, teremos isso que está aí: tudo 
certinho, resultando em tragédias. 
Tá na hora de questionar esses limites. Se não o limite de tolerância da 
tecnologia, ao menos o da nossa paciência.






Este artigo é de autoria de Luciano Pires (www.lucianopires.com.br) e está
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