Um espectro ronda o PDT: um espectro petucano Gilberto Felisberto Vasconcellos (*)
Um espectro ronda o PDT: o espectro petucano. Depois que Leonel Brizola nos deixou em 2004, ingenuidade supor que acabaram os ataques e as perfídias contra o trabalhismo brizolista. Claro. Existe inegável diferença entre o que se passa agora e quando ele estava aqui conosco. Em seu combate à exploração imperialista do povo e do país, o PDT teve a vantagem de contar com um excepcional pensador e formulador da política, o que evidentemente apaziguava a nós todos militantes à medida que ele fornecia a interpretação dos acontecimentos e indigitava os caminhos que o partido deveria seguir; mas agora temos de tocar o barco sozinhos e inspirados pelo seu exemplo. Isso coloca duas questões: 1) O imperativa de assimilar a prática e pensamento brizolistas, ou seja, estudar o ideário trabalhista que remonta à revolução de 30 para, a partir daí, analisar a realidade do país e nela intervir; 2) Como lidar com o risco de surgirem personagens e tendências que se afastam do pensamento brizolista. A primeira questão é manter a memória ativa com o objetivo de evitar o oportunismo. A esquerda que a direita não gosta se chamava Darcy Ribeiro. A direita é direita porque deturpa e se apossa da história alheia. A marca da inautenticidade, de quem no fundo nunca curtiu Leonel Brizola, desvirtua o trabalhismo. O partido que se cuide: é enorme o perigo de uma petucanização do brizolismo no PDT. O perigo existe porque a ideologia dominante das multinacionais se difunde por todos os lugares, inclusive nos lugares em que ela supostamente não deveria estar. A ideologia petucana é dominante porque detém o poder de infiltrar, de persuadir, de cooptar muito mais do que a gente imagina. O que devemos sempre perguntar é sobre a essência do pensamento brizolista, que é o único antídoto político verdadeiramente contra a hegemonia neoliberal petucana. Leonel Brizola preferia a palavra colonial, ao invés de caracterizar o modelo econômico como sendo um regime neoliberal. É que o cerne do discurso brizolista é o conceito de espoliação imperialista. Estamos submetidos a um processo colonial de superexploração do trabalho e das riquezas naturais do país. Esse é o enigma Brasil de que falava Leonel Brizola interessado em decifrar que tipo particular de colônia nós nos convertemos nas últimas décadas. A soberania nacional determina o destino do trabalhador. É isso o trabalhismo getuliano de Leonel Brizola desde 1945. Nasce lá no Rio Grande com perfil antiimperialista e culmina neste lúcido achado conceitual: as perdas internacionais. Uma das conseqüências das rapinâncias espoliativas das mega- empresas e das nações hegemônicas, é a fraqueza no comportamento político. O líder sem convicção ideológica. A falta de consistência intelectual. A tibieza na vontade. A dubiedade do caráter. O verso de Camões acerca da forte gente que vira um trapo dirigida por um caráter fraco dizia respeito ao Lula enredado diante do sistema financeiro internacional. É isso a diferença entre o petucanismo e o trabalhismo de Leonel Brizola. A meta educacional dos Cieps consiste em demolir a feitoria multinacional que nos condena à miséria. O mesmo princípio foi materializado pelo governador nas escolas no Rio Grande do Sul, mas o problema maior para o brizolismo, são os entraves e os obstáculos à pátria livre. Os vampiros capitalistas estrangeiros impedem a educação da gurizada brasileira. O objetivo de Leonel Brizola era chegar ao poder para cortar as amarras espoliativas coloniais. Fartura popular versus as perdas internacionais. Essa era a alegria dos trópicos anunciada por Darcy Ribeiro. O PDT se destaca, dentre todos os outros partidos, por ser o único que possui uma visão antropológica. Graças à antropologia dialética de Darcy Ribeiro ilumina pelo conhecimento dos índios sobre a natureza. A energia das plantas verdes. A base vegetal do processo civilizatório. A infra-estrutura tecnológica dos trópicos. Os intelectuais colonizados odeiam a euforia do socialismo moderno de Darcy Ribeiro com índio, branco, negro e mestiço. Os Cieps são fecundados por um antropólogo das civilizações. O PDT tem de ser o pensamento político de Leonel Brizola, a expressão mental mais elaborada do nacionalismo getuliano antiimperialista. A verdade é que não há nada mais anti-Brizola do que colocar o aspecto realístico-pragmático acima do critério ideológico. Que seja lembrada a chapa Brizola e Darcy. Em termos de ousadia libertária, não há paralelo em toda a história das eleições no mundo inteiro. O Brasil precisa de um candidato negão, assim Leonel Brizola homenageava a Alceu Colares. Neste 2006 o trabalhismo nacionalista se encontrará com a energia vegetal da Biomassa da Carta 7 de Darcy e recentemente no Caderno 3, organizado por Arnaldo Mourthé. O Brasil inteiro está de olho no candidato a presidente da República que o PDT vai escolher depois da morte de Leonel Brizola. Um momento decisivo para o partido: ou um candidato brizolista e nacionalista autêntico, ou um simulacro com embalagem midiática para gáudio da direita. É inegável a existência de uma pressão para diluir o brizolismo depois da morte de Leonel Brizola, não apenas fora como dentro do PDT. Essa pressão se configura, antes de qualquer coisa, no aspecto ideológico e intelectual, quando, por exemplo, se minimiza a intervenção colonial e imperialista nos rumos da história do Brasil, ou senão quando se transige com o caráter deletério e nocivo do capital estrangeiro para o desenvolvimento do país. Convém insistir na seguinte verdade histórica: o trabalhismo é nacionalista ou não é trabalhismo. Os militantes do PDT sabemos que Leonel Brizola sublinhou várias vezes a necessidade de se organizar o partido, mas essa dimensão organizativa não deveria de modo algum sufocar a paixão política e o ânimo doutrinário. Desde a década de 30 a direita se empenhou em estigmatizar Getúlio Vargas de anti-intelectual, o que continuou com Jango e Brizola por eles não terem defendido teses acadêmicas na USP, em Harvard ou na Sourbone. Luis da Câmara Cascudo costuma citar a frase de um filósofo espanhol: o morto ouve melhor. Aos falsos brizolistas incrustados no PDT, atenção: Brizola está na escuta e com porrete na mão! * Jornalista, escritor e professor Gilberto Felisberto Vasconcellos é autor, entre outros, dos livros O Príncipe da Moeda e Jangada do Sul. 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