Oi Carlos,
 
Obrigada por compartilhar a matéria do Sérgio Amadeu. Tenho um profundo respeito ao trabalho dele e por tudo que ele fez e vem fazendo em prol do movimento brasileiro de inclusão digital. Considero um profissional sério e muito estudioso e brilhante no que faz.
 
Quando morei em São Paulo e fiz a minha pesquisa de mestrado na PUC SP no projeto Telecentro São Paulo no bairro do Jardim Antártica, zona norte eu pude perceber um fato muito interessante: o projeto Telecentro disseminou a cultura do software livre nas comunidades carentes. Pode parecer besteira, mas se você perguntar para um morador de favela em São Paulo ou um líder comunitário sobre inclusão digital, ele vai dizer que quer inclusão digital com software livre. É só fazer uma entrevista com moradores do bairro, que foi o que fiz que logo pude perceber isso. Era muito interessante ver as comunidades se mobilizarem para ter um Telecentro em seu bairro através do orçamento participativo.
 
É evidente que o projeto Telecentro tem uma série de qualidades e que inclusive surgiram alguns programadores talentosos que não teriam desenvolvido este potencial se o centro de inclusão digital não tivesse optado pelo código aberto. Porém, eu que trabalho com formação de instrutores para inclusão digital lido com um problema sério no dia a dia, que é o de lidar com  o baixo nível de escolaridade dos instrutores que atuam na ponta nos centros de inclusão digital. Muitos têm um perfil técnico, segundo grau ou estão cursando o superior e são do próprio bairro, tal como ocorre de uma certa forma no projeto Telecentro. Contudo, ser do bairro não necessariamente significa saber trabalhar as questões do bairro e fazer um bom trabalho comunitário num centro de inclusão digital e trabalhar os temas geradores da comunidade sob a ótica de Paulo Freire, por exemplo.
 
No Telecentro Padre Joseph Allan Black, onde eu fiz a minha pesquisa, havia um grande número de crianças e pré-adolescentes analfabetos que iam ao Telecentro com uma demanda para utilizar o computador para aprender a ler e a escrever. E isso não era trabalhado pelos educadores do local porque eles não tinham formação em alfabetização. Eu lidei com esta problemática, pois eu não sou alfabetizadora. A solução que encontrei foi a de trabalhar em conjunto com as professoras do reforço escolar de alfabetização da escola do bairro onde estudavam estas crianças. Eram jovens que estavam na quarta série e nem sabiam escrever todo o seu nome completo. Mas era interessantíssima a forma como as crianças analfabetas utilizam os computadores no Telecentro seguindo os ícones. Em seis meses de utilização do Telecentro associado as aulas de reforço na escola, as crianças deram saltos na aquisição da habilidade de leitura e escrita, pois a criança passa a ter mais contato com a cultura do mundo letrado e da Internet no Telecentro. 
 
Como uma pessoa que sempre trabalhou na formação destes instrutores, lido com a dificuldade que é a de dar formação na parte pedagógica e comunitária, pois a maioria tem o perfil mais técnico (o que não deixa de ser ruim). Porém, quando a pessoa não tem formação em educação temos que fazer um trabalho de base mais sólido para lidar com esta brecha. As vezes o instrutor será capaz de ensinar ao jovem a utilizar o Open Office e Internet por exemplo. O jovem pode até aprender a ferramenta, como editor de texto, mas vai ter dificuldade de se comunicar direito usando as tecnologias digitais, em decorrência dos seus graves problemas de escrita da língua portuguesa. Eu acho que a liberdade do conhecimento ela também tem muito a ver com o domínio da lingua materna associado com o domínio das tecnologias digitais (Fluência tecnológica). Foi o que eu me deparei na minha experiência no Telecentro Padre Joseph Allan Black, pois o jovem tinha acesso a informação dos sites na Internet, ele até navegava com dificuldades, mas não conseguia atribuir significado ou entender um texto de um site por exemplo e transformar este conteúdo em conhecimento para a sua vida e para a vida da comunidade. 
 
Enfim, é um abismo imenso e fica aí um grande desafio e problema a ser resolvido pelas equipes de coordenação pedagógica que fazem a formação destes instrutores de centros de inclusão digital.  Este problema do analfabetismo infantil dos Telecentro Padre Joseph Allan Black eu relato na minha dissertação de mestrado que se encontra em http://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1026 e num breve artigo que está em http://www.lidec.futuro.usp.br/artigo1.php .
Superar este fosso vem sendo um baita desafio para mim enquanto educadora.
 
Um abraço,
Ana Maria Moraes.
Site pessoal: http://br.geocities.com/bibliotecamicromundos
 

Carlos Pereira <[EMAIL PROTECTED]> escreveu:
em
http://carosamigos.terra.com.br/


O software livre e a luta pelo compartilhamento do conhecimento humano
por Bruno Terribas

Sérgio Amadeu da Silveira atualmente coordena a ONG Rede Livre de
Compartilhamento da Cultura Digital, que forma e capacita jovens para
darem suporte aos cidadãos que queiram usar software livre ou de
código aberto. Nesta entrevista ele explica que o usuário residencial
não costuma usar software livre, nem pagar pela licença do software
proprietário. O usuário residencial costuma, isso sim, usar uma cópia
pirata do software proprietário – mas mesmo assim fica tecnicamente
dependente da multinacional proprietária. Também nega Sérgio Amadeu
que o domínio do software livre capacite menos para empregos do que o
do software proprietário. Doutor em ciência política pela Universidade
de São Paulo, Amadeu implantou e coordenou o Governo Eletrônico da
Prefeitura Municipal de São Paulo, de 2001 até janeiro de 2003,
período em que formulou e executou o plano de inclusão digital por
meio de telecentros nas áreas mais carentes do município. Durante o
governo Lula, foi diretor-presidente do Instituto Nacional de
Tecnologia da Informação (ITI) do início de 2003 até agosto de 2005,
além de coordenador do Comitê Técnico de Implementação de Software
Livre no governo federal. É professor do curso de pós-graduação na
Faculdade Cásper Líbero.

Qual tem sido seu principal projeto atualmente?
O projeto em que nós, da Rede Livre, estamos mais empenhados agora é
formar um conjunto de jovens para dar suporte em software livre para
cidadãos, usuários que a gente chama de residenciais, com objetivo de
disseminar o uso de softwares livres pelas pessoas no seu dia-a-dia,
porque a maior parte dos usuários residenciais é atendida pela chamada
rede " pirata ". Quando surge algum problema no computador, eles
chamam um técnico para consertar a máquina, configurar o computador e,
ao mesmo tempo, instalar um conjunto de softwares " piratas " – não
autorizados –, e essa pirataria, por incrível que pareça, é
extremamente funcional para a manutenção do software proprietário. Ao
usar um software não autorizado, de que você não tem licença para
utilizar, está na verdade continuando a usar um software do monopólio
de sistemas operacionais. Você continua a ser uma pessoa que usa
aqueles formatos proprietários de arquivo, dentro do chamado
ecossistema do software proprietário. A pirataria é extremamente
funcional em manter uma base de usuários.

As empresas vêm exigindo cada vez mais conhecimentos de softwares
específicos, na maioria das vezes proprietários.
Em geral, o próprio cara que está fazendo a entrevista com o candidato
ao emprego não sabe exatamente que existem alternativas. Em vez de
falar editor de texto, ele fala o nome do produto da Microsoft. Se
você aprendeu a usar o Open Office – o conjunto de softwares livres
que a gente tem para editor de texto, planilha de cálculo e fazer
apresentações –, tem muito mais facilidade de usar não só aquele
software, mas também os softwares proprietários. Porque em geral as
pessoas que aprendem informática a partir de soluções livres costumam
aprender dentro de uma diversidade de opções ; enquanto as que lidam
com as soluções proprietárias aprendem as funcionalidades de um
determinado software e não são adestradas para manejar outros
softwares.

Como isso se dá na prática?
Quando eu estava em São Paulo, na gestão da Marta Suplicy, havia uma
idéia segundo a qual os chamados governos eletrônicos, os que colocam
serviços, informações na Internet – on-line – para que possam ser na
verdade úteis para o conjunto da sociedade, têm que chegar aos
estratos mais pobres, porque senão quem é da elite e tem computador em
casa é melhor atendido do que quem mais precisa e está na periferia.
Só que na periferia não tinha computadores, as pessoas não têm renda
para manter uma conexão. Nós montamos uma rede de telecentros na
periferia, onde as pessoas tinham acesso gratuito à Internet. Elas
aprendiam em cima de soluções livres GNU /Linux, aprendiam Open
Office, navegador Mozilla, e tivemos um sucesso tremendo. Muitos
jovens aprenderam a usar esses softwares livres nos telecentros –
exatamente por esse software ser livre e vir com o código-fonte – e
alguns deles, que tinham talento, passaram a colaborar com o
desenvolvimento desses softwares e deixaram a condição de usuários
para entrar na de programador.

O software livre seria então uma questão filosófica e até libertária?
Sem dúvida. O bloqueio do conhecimento interessa a poucos, que querem
manter os fluxos de riqueza. A idéia de que o conhecimento é livre é a
base do software livre. O modelo usado para fazer o software livre
passou a ser usado para fazer uma enciclopédia, a Wikipedia, que é
hoje certamente a maior do mundo e se inspirou na idéia de
compartilhamento de códigos do software livre. E não é um movimento só
técnico. É social, cultural, e coloca a idéia de que o conhecimento
tem que ser livre. O problema é que, numa sociedade onde os bens
imateriais, os bens simbólicos, as informações adquirem importância
econômica gigantesca, nunca foi tão fácil compartilhar conhecimento. E
nunca foi tão difícil superar as barreiras impostas pelos grupos
econômicos que querem manter o mundo na divisão obtida na velha
economia industrial. Pretende-se impedir que as pessoas, que os povos
se desenvolvam. A humanidade estava produzindo cada vez mais obras
culturais e o número de obras que entra para bens públicos estava
diminuindo, porque o que está acontecendo hoje é uma pressão enorme
para endurecer a legislação, para estender os prazos da lei de
copyright, tentar ampliar e patentear tudo o que for possível.

Qual foi a importância de implantar o software livre na prefeitura de
São Paulo?
O software livre permite conhecer o que você está usando, reduzir
custo, porque não se baseia no pagamento de licenças. As vantagens são
totais. Qual era nossa dificuldade? Era montar uma equipe de suporte,
porque seriam vários telecentros. Montamos, com um técnico que
conhecia bem software livre, Linux principalmente, e ele passou a
treinar as outras pessoas e também chamamos pessoas que sabiam. O
custo de suporte acabou sendo muito pequeno, era uma equipe nossa, e o
que deixamos de gastar com licenças foi uma coisa enorme. E chegamos a
ter 500.000 usuários. Hoje, todo esse pessoal está contratado,
trabalhando para grandes empresas. Porque tem uma demanda enorme para
software livre. E a possibilidade de profissionalização é muito maior
no software livre do que no mundo do software proprietário.

Bruno Terribas é estudante de jornalismo.



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Prof. Carlos José de Almeida Pereira - CARLÃO
Computação - Univ. Estadual de Santa Cruz (www.uesc.br)
Ilhéus - Bahia - Brasil

"Quem agora conhece a antiga linguagem da Lua?
Quem agora fala com a Deusa ? ...
Só as pedras agora se recordam do que a Lua nos disse há muito tempo,
e o que nós aprendemos com as árvores, e as vozes das ervas e dos
cheiros das flores... "
(Tony Kelly, "Pagan Musings" 1970)

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