Eduardo Henrique Leitner said: > olá, gostaria de saber se existe uma definição exata de determinante de > uma matriz... > > é que eu já vi 3 definições distintas e gostaria de saber se todas sao > aceitas como definições mesmo, ou apenas uma delas é a certa e as outras > sao teoremas a partir dessa, ou é ainda uma outra além dessa 3... > [...]
As três estão certas. Eu vou confundir as coisas mais um pouco e introduzir um quarta (!) definição de determinante na história: Def.: O determinante de uma matriz é a única transformação multilinear alternada das colunas dessa matriz tal que det(I) = 1. Eu vou agora explicar o que significa essa definição. O determinante é multilinear ---------------------------- Isso quer dizer que se uma matriz A possui colunas [a_1+b_1, a_2, ..., a_n], então det[a_1+b_1, a_2, ..., a_n] = det[a_1, a_2, ..., a_n] + det[b_1, a_2, ..., a_n]. e analogamente para as outras colunas. Além disso, det[c*a_1, a_2, ..., a_n] = c*det[a_1, a_2, ..., a_n] e analogamente para as outras colunas. O determinante é alternado -------------------------- Isso quer dizer que, ao trocar duas colunas quaisquer da matriz, o seu determinante muda de sinal. Em outras palavras, det[a_1, ..., a_i, ..., a_j, ..., a_n] = -det[a_1, ..., a_j, ..., a_i, ..., a_n] para todos os i e j, 1 <= i < j <= n. det(I) = 1 ---------- Seja I a matriz identidade, i.e. I = [e_1 e_2 ... e_n], onde e_i é o vetor que tem zeros em todas as posições, exceto a i-ésima posição, onde ele tem um 1. Então det(I) = 1, por definição. ============================================================ Isso é muito legal, mas como eu faço para, realmente, calcular um determinante? Considere a matriz A = [a b; c d] (isto é, a matriz 2x2 que tem os elementos a e b na primeira linha e c e d na segunda linha). Quanto vale det(A)? D = det[a b; c d] = det[a b; 0 d] + det[0 b; c d] pela multinearidade na primeira coluna. Aplicando a multilinearidade nas segundas colunas das duas matrizes, temos que det[a b; 0 d] = det[a 0; 0 d] + det[a b; 0 0] det[0 b; c d] = det[0 0; c d] + det[0 b; c 0]. Logo D = det[a 0; 0 d] + det[a b; 0 0] + det[0 0; c d] + det[0 b; c 0]. Usando novamente a multinearidade em cada uma das colunas, removemos as variáveis de dentro da matriz. O que resta é D = ad*det[1 0; 0 1] + ab*det[1 1; 0 0] + cd*det[0 0; 1 1] + bc*det[0 1; 1 0]. A primeira matriz é a identidade, logo seu determinante é um. A última matriz, ao trocarmos a primeira e a segunda colunas, torna-se a identidade, logo ela tem determinante -1 (pois invertemos o sinal do determinante ao trocar as duas colunas). Logo D = ad - bc + ab*det[1 1; 0 0] + cd*det[0 0; 1 1]. Mas quanto vale det[1 1; 0 0]? Ora, se trocarmos as duas colunas deste determinante, ele deve mudar de sinal. Mas, com essa operação, a matriz sobre a qual operamos não muda, logo det[1 1; 0 0] = -det[1 1; 0 0] <=> det[1 1; 0 0] = 0. Analogamente, det[0 0; 1 1] = 0. Finalmente, det[a b; c d] = ad - bc. Note que podemos generalizar o que acabamos que fazer: se uma matriz tem duas colunas iguais então seu determinante é zero, pois permutá-las muda o sinal deste mas, ao mesmo tempo, não o altera. E se quisermos um determinante 3x3? Mesma coisa, exceto que agora teremos 9 matrizes só de zeros e uns. Três delas terão determinante zero; todas as outras terão determinante +-1. Eu não farei essa conta, mas vale a pena conferir que essa conta dá o mesmo que a regra de Sarrus. ============================================================ Agora eu vou começar a responder a sua pergunta: provarei que a definição do Iezzi equivale à minha. Considere a matriz A = [a_1 a_2 ... a_n], onde a_i é o i-ésimo vetor coluna de A e seja ainda a_1 = (x_1, x_2, ..., x_n). Pela multilinearidade do determinante, det A = x_1*det[e_1 a_2 ... a_n] + x_2*det[e_2 a_2 ... a_n] + ... + x_n*det[e_n a_2 ... a_n]. Agora eu precisarei dos dois seguintes lemas: Lema 1: Se a matriz A tem duas colunas, uma múltipla da outra, então det A = 0. Prova: Se A = [a_1 ... a_i ... c*a_i ... a_n], então det A = c * det[a_1 ... a_i ... a_i ... a_n] = c * 0 = 0. Lema 2: det[a_1 ... a_i ... (a_j - k*a_i) ... a_n] = det[a_1 ... a_i ... a_j ... a_n]. Prova: Pela multinearidade na j-ésima coluna, det[a_1 ... a_i ... (a_j - k*a_i) ... a_n] = det[a_1 ... a_i ... a_j ... a_n] + det[a_1 ... a_i ... -k*a_i ... a_n] = det[a_1 ... a_i ... a_j ... a_n]. Em particular estes dois lemas implicam que podemos zerar a i-ésima coordenada de todas as colunas exceto a primeira de [e_i a_2 ... a_n] sem alterar o determinante -- basta tomar a matriz B_i = [e_i a_2-a_i2*e_i ... a_n-a_in*e_i]. Seja então B_i = [e_i b_1 ... b_(n-1)]. Troque agora a primeira coluna com a segunda, a segunda com a terceira e assim sucessivamente, até trocar a (i-1)-ésima coluna com a i-ésima coluna. Nessa história, a coluna e_i andou até a i-ésima posição, preservando a ordem relativa das outras colunas. Seja C_i essa nova matriz. Como efetuamos i-1 trocas de colunas, det C_i = (-1)^(i-1) * det B_i. Mas o jeitão da matriz C_i é este aqui (use uma fonte de largura fixa): 1 j n | | | V V V 1-> [* * ... * 0 * ... *] [* * ... * 0 * ... *] [. . . . . . . .] [. . . . . . . .] [. . . . . . . .] [* * ... * 0 * ... *] j-> [0 0 ... 0 1 0 ... 0] [* * ... * 0 * ... *] [. . . . . . . .] [. . . . . . . .] [. . . . . . . .] n-> [* * ... * 0 * ... *] Esqueça agora que a j-ésima linha e a j-ésima coluna existem e faça a decomposição que eu fiz para o determinante 2x2 (e esbocei para o 3x3) para as outras n-1 colunas, *sem mexer na j-ésima coluna*. Como nenhuma das colunas possui j-ésima coordenada não nula, nenhuma das n-1 colunas terminará com um vetor e_j. Finalmente, permute as colunas para que a matriz termine como a identidade (possivelmente com mudanças de sinal). Note agora que quando as n-1 colunas estiverem posiciondas para que elas formem a identidade, desconsiderando a j-ésima linha e a j-ésima coluna, elas continuam formando a identidade mesmo se mantivermos a j-ésima linha e a j-ésima coluna. Logo as matrizes que dariam um se estivéssemos calculando det[b_1 b_2 ... b_(n-1)] continuam dando o mesmo valor. Logo det C_i = det[b_1 b_2 ... b_(n-1)]. Logo det B_i = (-1)^(i+1) * det[b_1 b_2 ... b_(n-1)] (pois (-1)^(i-1)=(-1)^(i+1)), logo det A = x_1*(-1)^(1+1)*det[b_11 b_12 ... b_1n] + ... + x_n*(-1)^(n+1)*det[b_n1 b_n2 ... b_nn], onde b_ij é a (j+1)-ésima coluna de A, com a i-ésima coordenada suprimida. Mas isso é a soma dos produtos dos elementos da primeira coluna multiplicados pelos seus respectivos cofatores. ============================================================ Agora para a segunda definição: Note que para calcular det A, A uma matriz de ordem nxn, expandimos esta matriz em n^n outras matrizes. Mas só aquelas que não repetem nenhum vetor-coluna são não-nulas, e existem n! delas, associadas às permutações das colunas de [e_1 e_2 ... e_n]. Considere agora uma dessas permutações. Cada troca de colunas é uma inversão da permutação das colunas. Se for necessário um número par de inversões, essa matriz contribui com uma parcela positiva no determinante; caso contrário, contribui com uma parcela negativa. Logo está demonstrada a equivalência com a definição do Hugo. ============================================================ Lema: Se A é triangular então det A = a_11*a_22*...*a_nn. Prova: Segue trivialmente através da aplicação repetida do Teorema de Laplace na primeira coluna (no fundo foi isso que eu demonstrei na definição do Iezzi). Note que para provar que se A e B são semelhantes então det A = det B, basta demonstrar que det AB = det A * det B, pois então A = P*B*P^-1 => det A = det P*B*P^(-1) = det P*det B*det P(-1) = det B*det(P*P(-1)) = det B*det I = B. Note agora que se C = AB então c_ij = a_i1*b_1j + a_i2*b_2j + ... + a_in*b_nj. Então, aplicando a multilinearidade na primeira coluna de C, temos que det C = b_11*det[a_1' c_2 ... c_n] + b_21*det[a_2' c_2 ... c_n] + ... + b_n1*det[a_n' c_2 ... c_n] onde a_i' é a i-ésima *linha* de A e c_i é a i-ésima coluna de C. Aplique novamente a multinearidade na segunda, na terceira, ..., na n-ésima coluna, nesta ordem. Apenas as matrizes nas quais todos os a_i' são distintos podem ter determinantes não-nulos. Permute as colunas dessas matrizes até que todas se tornem iguais a [a_1' a_2' ... a_n']. Note que o sinal que os termos não-nulos terão adquirido correspondendem justamente à paridade da permutação original das colunas, que corresponde à permutação dos b_ij, quando os b_ij são considerados em ordem crescente. Logo, colocando det[a_1' a_2' ... a_n'] em evidência, o que sobra é o determinante de B, dessa vez considerado sobre o ponto de vista de permutações. Logo sabemos que det C = det B * det[a_1' a_2' ... a_n']. Basta, portanto, demonstrar o seguinte lema: Lema: det A = det A', onde A' é a transposta de A. Prova: Note que se P = [e_s(1) e_s(2) ... e_s(n)], onde s: {1, ..., n} -> {1, ..., n} é uma permutação, então trocar a i-ésima e a j-ésima colunas de P equivale a trocar a s(i)-ésima e a s(j)-ésima linhas de P, logo o determinante de P' = [e_t(1) e_t(2) ... e_t(n)], onde t é a permutação inversa de s, é igual ao de P. Logo s tem a mesma paridade de t. Logo ao transpormos a matriz, o determinante não se altera (olhe para o determinante sobre o ponto de vista de permutações). ============================================================ Ufa! Se você quiser saber mais sobre álgebra linear e/ou determinantes, uma boa referência é o livro "Álgebra Linear" do Elon (publicado pela SBM). Uma abordagem mais elementar, mas também muito boa, é feita no "A Matemática do Ensino Médio -- Volume 3", do Elon, Paulo Cezar, Morgado e José Paulo Carneiro. []s, -- Fábio "ctg \pi" Dias Moreira ========================================================================= Instruções para entrar na lista, sair da lista e usar a lista em http://www.mat.puc-rio.br/~nicolau/olimp/obm-l.html =========================================================================