ATENÇÃO: O que se segue está escrito num tom incisivo e moralista, além
de refletir uma agenda específica do autor com a qual muitos já devem
estar aborrecidos.

Joao Marcos <botoc...@gmail.com> escreveu:

>>> (brevíssimo artigo de divulgação, por Peter Lynch)
>>> http://www.irishtimes.com/news/science/the-shaky-foundations-of-mathematics-1.2877075
>
> [...]
>
> Precisamos certamente de mais artigos breves e inúteis como este.
> Divulgação científica é importante, [...]

Discordo plenamente.  O artigo é um desastre.  Repleto dos disparates,
hipérboles e sensasionalismos comuns em artigos de divulgação dos
teoremas de Gödel.

É altamente duvidoso que artigos desse tipo contribuam para a divulgação
de qualquer conteúdo que se possa chamar adequadamente de "científico".
Mas creio que contribua consideravelmente para o tipo de misticismo
barato e abuso dos teoremas de Gödel relatados nas obras de Torkel
Franzén e Sokal & Bricmont, dentre outros.

Porém, *mais importante ainda*, rejeito a premissa que ciência deva ser
divulgada (no sentido que o artigo de Peter Lynch pode ser chamado de
"divulgação científica").

*** começo da pregação ***

Em primeiro lugar, artigos de divulgação que circulam na imprensa comum
estão mais preocupados com frases de efeito e deslumbramento
pseudocientífico do que com precisão e correção, o que, do ponto de
vista científico, causa mais prejuízo do que benefício.  As razões para
isso são variadas, mas certamente incluem o fato de que é impossível
transmitir para o não especialista qualquer conteúdo científico
considerável em dez parágrafos de texto.  Excessão concedida à colunas
de recreação matemática, mas talvez estas não sejam, propriamente
falando, artigos de divulgação científica.

Em segundo lugar, a *veneração pela ciência* na maior parte das
sociedades ocidentais já está acima da linha do ridículo.  E isso é
prejudicial para a ciência.  Portanto, "divilgar ciência" como meio de
alavancar o seu status no meio da sociedade, ou aprimorar a sua imagem
perante a população em geral, me parece contraproducente.  *Ensinar*
ciência, contudo, me parede mais proveitoso.

Me admira a prepotência da comunidade científica de manter (por
conivência ou esmorecimento) uma situação na qual a Mariazinha da
Esquina tenha que dispensar considerável esforço e dinheiro para obter
conteúdo verdadeiramente científico (na forma de artigos e livros
didáticos) enquanto a alimenta com curiosidades pseudointelectuais na
roupagem de "divulgação científica": afinal a verdadeira ciência
pertence aos cientistas, é produzida por cientistas e só consegue ser
compreendida por cientistas; não há demanda por ciência em meio a
população em geral, somente demanda por aplicação, ou, melhor ainda, por
produtos de consumo; ciência e tecnologia é coisa de gente grande, deixe
por conta dos especialistas.

Ninguém é obrigado a se interessar por ciência e certamente *não* há
nenhum valor em estimular esse interesse artificialmente, mas as pessoas
que eu conheci que se interessam sinceramente por algum tema científico
mostravam-se frustadas pela ausência de informações relevantes em peças
de divulgação científica.  Só ficam satisfeitos aqueles que estão menos
interessados em ciência do que em parecer espertos.

Divulgação científica *não* é importante.  Ensino e livre acesso à
material didático e produção científica é essencial.

*** fim da pregação ***

Saudações,

-- 
Hermógenes Oliveira

"If you make people think they're thinking, they'll love you; but if you
 really make them think, they'll hate you." Donald Robert Perry Marquis

-- 
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